G.R.E.S. Acadêmicos da Rocinha
Felicidade não tem preço

 

O Enredo no Samba: Estrutura discursiva

          Com o enredo “Felicidade não tem preço”, a Acadêmicos da Rocinha quer mostrar a importância do dinheiro na vida das pessoas. Mesmo vivendo num mundo materialista, a agremiação defenderá a tese de que é possível ser feliz com pouco ou com o suficiente, que só depende de nós mesmos.
          Os autores do samba, seguindo a excelente e clara explanação da sinopse, optaram por mostrar, em forma de um sonho, o que pode o dinheiro fazer com a cabeça das pessoas e que ele pode ser usado contra ou a nosso favor. No final deste sonho, o narrador em 1a. pessoa, vendo tanta desigualdade social, volta à realidade, acorda e constata a verdade defendida pela escola: “dinheiro não compra a felicidade”.

O Samba no Enredo: Estrutura lingüística

          O samba tem como condutor do enredo um narrador em 1a. pessoa do singular, recurso bastante eficaz que tem como função discursiva inserir o desfilante e o espectador no tema abordado, pois ao cantarem o samba, as pessoas passam a ser narradores, contanto e vivendo os fatos descritos.
          Embora o samba tenha sido construído a partir do ponto de vista dos desprovidos financeiramente, para dar ênfase ao tema abordado, os compositores evitaram descrever os sentimentos destes personagens, até porque o samba-enredo é um texto de exaltação que repele imagens desagradáveis evocadas através de palavras e expressões com teor negativo.
          
A seleção vocabular remete à dicotomia do tema: a vida sem ou com dinheiro, em que podemos listar:

Sem dinheiro   Com dinheiro
(teor negativo)   (teor positivo)
sonhei   pote de ouro
pobreza   tesouro
pindaíba   grã-fino
chorar   ganhar
desigualdade   posso pagar
    vou comprar (o amor)
    desejo
    investir
    dono do mundo
    ciranda (financeira)
    riqueza

          Para defender a tese do enredo, os autores seguiram uma linha de raciocínio bastante apropriada, apontada pela dicotomia acima, da qual podemos destacar: a) mesmo que chore e passe por privações e dificuldades, os desprovidos possuem um amor verdadeiro, enquanto os abastados precisam comprá-lo. b) os desvalidos são mais sinceros e leais, enquanto os endinheirados vivem num mundo de falsidade e de hipocrisia.  c) enquanto o pobre sabe viver e gozar a vida da melhor forma possível com o pouco que tem, o rico, com sua arrogância, se acha o dono do mundo e paga por seus desejos, dando-se uma falsa alegria.
          Em relação à estrutura rítmica, percebemos que os versos são compostos por rimas internas (no interior dos versos) e externas (sons semelhantes no final dos versos) que auxiliam na memorização do samba, comprovado nos seguintes exemplos:

Rimas Internas:   “Sonho de menino, virei um grã-fino   “Oh! Felicidade me diz o teu preço
Eu sei que mereço e posso pagar”
    “Mas a realidade da desigualdade    
       
Rimas Externas: “Eu sonhei com um pote de ouro
Meu lindo tesouro
  Eu quero é viver, a vida gozar!
Saber ser feliz e aproveitar

          Enfim, um samba alegre, bem cadenciado, que consegue cumprir sua função perfeitamente de transmitir a apropriada reflexão contida no enredo de forma bem-humorada e que atende às idéias do carnavalesco para o desenvolvimento do enredo em desfile.

Julio Cesar Farias
Julio é professor, escritor, pesquisador da linguagem na cultura popular, colaborador do Centro de Memórias do Carnaval da LIESA e membro do conselho Consultivo do Instituto do Carnaval da Universidade Estácio de Sá.

 

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