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O Enredo no Samba: Estrutura discursiva
O texto da sinopse atual centra-se
na exposição minuciosa da história do Pará, diferenciando-se da temática do antigo enredo da Unidos de São Carlos, que enfocava detalhadamente, como assim faz o samba, todos os elementos do Círio de Nazaré.
A mudança do foco narrativo do enredo, mesmo sendo uma releitura, tem por objetivo a louvação não só da festa religiosa, mas de todo o Estado do Pará, onde ela acontece. Tal fato é compreensível se se comparar a estrutura do carnaval daquela época com a de agora, em que ao se falar o tempo inteiro do Círio incorreria em redundância plástica, devido ao grande número de alas e de alegorias apresentadas hoje no desfile.
Embora no texto do enredo atual o Círio de Nazaré seja mais um item característico do Pará, a agremiação preferiu, com muito bom gosto, levar para a Avenida o antológico samba-enredo em homenagem à festa religiosa do Círio de Nazaré.
Este belíssimo samba-enredo de 1975, divide-se em duas partes, a saber: a primeira mostra a manifestação religiosa do Círio, constituída pela procissão de romeiros conduzindo a imagem da Virgem de Nazaré em uma berlinda, da Catedral até sua Basílica; a segunda parte mostra o arraial, descrevendo tudo o que acontecia durante o Círio, como o comércio local e a diversão de milhares de pessoas ali reunidas para festejar.
Convém esclarecer que a Escola tem ciência das mudanças ocorridas nessa manifestação religiosa e cultural, a qual será atualizada em seu desfile.
O Samba no Enredo: Estrutura lingüística
Considerando o samba-enredo como um texto épico pós-moderno, o samba em questão apresenta duas características provenientes da epopéia clássica: a proposição, isto é, a apresentação antecipada do tema e a invocação à divindade.
Proposição |
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Invocação |
“No mês de outubro |
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“Oh! Virgem Santa |
Em Belém do Pará |
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Olhai por nós |
São dias de alegria
e muita fé |
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Olhai por nós |
Começa com extensa
romaria matinal |
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Oh! Virgem Santa |
O Círio de Nazaré” |
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Pois precisamos de
paz” |
Ainda que predomine a descrição, o samba contém os elementos fundamentais da informação para situar os fatos da narrativa:
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Quem? o romeiro, pregoeiros, moças e senhoras do lugar, as crianças, o vendeiro.
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Quando? no mês de outubro.
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Onde? em Belém do Pará.
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Como? começa com extensa romaria matinal.
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Por quê? pedindo à Dona em oração / para lhe ajudar, pois precisamos de paz.
A utilização desses elementos da notícia auxiliam o fluxo narrativo/descritivo da festa religiosa, pois organizam as informações, formando imagens que são facilmente visualizadas na mente do leitor/ouvinte.
O vocabulário segue o eixo semântico típico da festividade religiosa (fé, romaria, procissão, Santa, berlinda, romeiro, oração) e particularidades do Círio e da culinária da região (barraquinhas, três vestidos, circo dos horrores, Berro-Boi, vendeiro de iguarias, pato no tucupi, muçuã, tacacá, maniçoba, tucumã, açaí, aluá).
Os compositores preferiram o uso intensivo de termos preposicionados, como as locuções adjetivas, visando antes a constituição rítmica dos versos, reforçando e detalhando também a idéia contida nas frases:
“No mês de outubro” |
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“Moças e senhoras do lugar” |
“Em Belém do Pará” |
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“Tem o circo dos horrores” |
“São dias de alegria e muita fé” |
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“E o vendeiro de iguarias a pronunciar" |
“O Círio de Nazaré” |
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“Do Estado do Pará” |
O emprego de verbos no presente serve para atemporalizar as características do Círio, imprimindo a idéia de algo que se repete todos os anos, sem alteração na forma do festejo, embora saibamos das mudanças ocorridas no evento:
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“São dias de alegria e muita fé”
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“Começa com extensa romaria matinal”
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“Três vestidos
fazem pra se apresentar”
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“Tem o circo dos horrores”
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“As crianças se
divertem”
O infinitivo preposicionado possui a mesma função:
A presentificação dos fatos tem por finalidade a identificação do público com o que está sendo apresentado no desfile, como se tais fatos acontecessem no momento do espectador, convidando-o a participar.
Bibliografia:
- “Enredos – Rio
Carnaval 2004” , da LIESA.
- Sinopse do Enredo da Unidos de São Carlos de 1975, LIESA
- “Carnaval – Seis
Milênios de História”, Hiram Araújo.
- “Para Tudo Não Se Acabar Na Quarta-Feira – A Linguagem do Samba-Enredo” – Julio Cesar Farias
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