Vida longa para Moreira da Silva e Candonga!

 

          1 – Qualquer ser humano que faça 93 anos de idade merece a nossa admiração. E, se o ser humano for Moreira da Silva, um magnífico exemplo do melhor carioquismo e um excelente cantor em plena atividade, merece, além de admiração, as nossas mais efusivas homenagens.
          No entanto, os 93 anos de Moreira da Silva só não passaram despercebidos pelos veículos de comunicação porque uma casa noturna de São Conrado, a Ritmo, promoveu uma apresentação do cantor no dia do seu aniversário. Os jornais limitaram-se a dar notas sobre o espetáculo. Se alguma emissora de TV tratou do assunto, não foi a TV Globo, por sinal, presidida por um nonagenário.
          Mas Moreira da Silva fez o seu show na Ritmo, na presença de um público que superlotou a casa, e recebeu as manifestações de carinho de que é merecedor. Se, por um lado, a voz perdeu um pouco da antiga potência, a lucidez é impressionante. Ele continua um craque no palco, com repertório muito bem escolhido e soltando as (boas) piadas na hora certa.
          Que Deus o conserve, grande Kid Morengueira!

          2 – Em 1985, fui um dos candidatos a candidato a prefeito do Rio de Janeiro na disputa interna do meu partido de então. Foi nessa condição que, entrevistado por Danuza Leão, em seu programa de TV, falamos da necessidade de combater certos privilégios vigentes na época. “Você pretende acabar com os privilégios?”, perguntou-me Danuza.
          - Pretendo – respondi, acrescentando – menos com uni deles. Candonga continuará com o direito de estacionar seu automóvel ao lado da bateria no desfile das escolas de samba.
          Vocês conhecem o Candonga? É daqueles personagens que justificam a piada de que todos são iguais perante a lei, mas alguns são mais iguais do que outros. Uma de suas atividades, nos tempos da ditadura, era proteger os participantes das reuniões do pessoal da oposição. Medindo mais de metro e oitenta e pesando cerca de 150 quilos, não precisava fazer nenhuma ameaça para ser respeitado.
          Candonga, na verdade, é um belo personagem de nossa cidade, Consumidor de chope capaz de competir com Albino Pinheiro, pode ser encontrado em qualquer bar da cidade rodeado de amigos, em papos intermináveis. É uma figura querida por todos, pela sua alegria de viver. Entre as pessoas que conheço – sem modéstia, não são poucas – não há ninguém mais generoso do que ele. Nos quatro dias de Carnaval, com o seu carro estacionado ao lado das baterias; a sua generosidade se manifesta escandalosamente. Ele enche o porta-malas de cerveja e gelo e possa as noites servindo a gente das escolas de samba, jornalistas, funcionários da Riotur etc., como se fosse o anfitrião da festa. Para quem não quer cerveja, oferece doses de uma batida a que dá o nome de cravo escarlate, de fórmula secreta mas de indisfarçável sabor de cravo. Há quem diga que se trata de uma fórmula afrodisíaca. O que posso assegurar é que, lá pelas 4, 5 da manhã quando o sono começa a bater; o cravo escarlate do Candonga desperta qualquer um.
          Faz tudo isso, há muitos anos, sem cobrar um tostão. No último Carnaval, porém, foi divulgada a falsa informação de que Candonga vendia a tal batida. A notícia chegava a identificar como “incautos” os consumidores do cravo escarlate. Encontrei Candonga todo choroso, por causa da tal publicação, e achei que, apesar do tempo passado, ele merecia os esclarecimentos que, agora, ofereço ao leitor. Candonga não poderia atravessar a Quaresma inteira sem o desagravo que lhe faço neste momento.

Sérgio Cabral
(Publicado na coluna Gente do Rio - Veja Rio 12 de Abril de 1995)

 

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