A Proposta - II

 

            Venho através desta condensar algumas das questões surgidas após duas semanas de exposição da proposta alternativa classificatória de julgamento dos desfiles das Escolas de Samba. Como é uma proposta nova, sai bem atrás da atualmente em vigor numa pretensa corrida, pois que o novo, é claro, sempre assusta. A própria elaboração deste texto complementar comprova, contudo, o quanto é útil e salutar o debate de idéias. Mas que ninguém se iluda, sempre chega o momento em que ele, cessando ou não, dá um tempo para o momento em que as pessoas tomam posições, afinal, como já dizia Dante, "Os lugares mais quentes no inferno estão reservados para aqueles que, em época de grande crise moral, se mantiveram na neutralidade". Por outro lado, "Se uma idéia põe uma pulga atrás da orelha em mais de uma pessoa, merece ao menos ser debatida", este, de minha autoria. Foi com grande satisfação que vi a idéia da proposta classificatória ser debatida em tão pouco tempo por pessoas que, com certeza, vivem muito mais de perto o mundo do samba do que eu. Só tenho palavras de agradecimento para todos os que participaram e dizer que estou muito feliz.
            Favorecimento e subjetividade: Perguntado se o método classificatório não permitiria favorecimentos e não seria muito subjetivo, diria que não creio que vá existir um método de julgamento que elimine-os. Os favorecimentos podem acontecer, então creio que a questão é qual método de julgamento pode inibi-los ou, pelo menos, vigiá-los? O método classificatório tem alguns aspectos a seu favor, no meu entender, por exemplo, você desconfiaria mais de uma nota dez, que pode muito bem passar despercebida no meio de tantas outras notas dez, ou de uma primeira colocação? E se um jurado colocar uma escola na décima quarta colocação enquanto seus colegas a colocam nas primeiras? Será um pouco estranho, não? Pois esta averiguação da "competência" dos jurados através das comparações das notas torna-se estatisticamente insignificante se aplicado no método atual justamente devido ao festival de notas altas e iguais permitido.
            Na verdade, minto. Existe uma forma de tornar totalmente objetivo o julgamento. É estabelecer para cada quesito normas do tipo tempo mínimo e máximo de desfile. O problema é que em pouco tempo todas cumpririam as normas e todas ganhariam notas "dez" em todos os quesitos. Onde ficaria a sadia disputa? Por isso não queiram ver a subjetividade como algo a ser eliminado.
            A subjetividade existe e, podem ter certeza, é responsável pelo nosso espetacular carnaval. Ela deve é ser controlada através de um mecanismo comparativo, e não só através das notas dos outros jurados como indicado acima, mas também através da opinião pública, particularmente, daqueles que fazem parte do mundo do samba.
            Distância muito grande entre as notas: Aqui, na verdade, não existe polêmica, há apenas a necessidade de explicar melhor a proposta. Disseram-me que a LIESA e a Associação já estudaram propostas semelhantes ou iguais e as renegaram porque "13 pontos" entre duas Escolas do mesmo grupo era uma distância muito grande, o que acabaria prejudicando as "pequenas Escolas". Em primeiro lugar, o método classificatório visa justamente impedir que as Escolas pequenas continuem sendo prejudicadas na medida em que, mesmo quando elas arrebentam e claramente se destacam sendo as melhores em alguns quesitos, pouca ou quase nenhuma vantagem tiram deste fato porque as "grandes Escolas" também recebem dez se apenas fazem o "feijão com arroz" e praticamente ninguém questiona. 
            Em segundo lugar, a pontuação crescente do método classificatório é apenas um mecanismo matemático para facilitar e tornar mais emocionante a apuração. Ele é rigorosamente igual ao método de notas se tão somente for proibido que o jurado dê notas iguais para as Escolas e que a diferença entre elas seja a mesma. No caso atual, o jurado poderia dar para as Escolas as notas 8.7, 8.8, 8.9, ... , 9.8, 9.9, 10.  Como pode ser visto, uma distância de 13 "degraus", e não 13 pontos, entre a última e a primeira colocada. Mas, se desejarem, de 1,3 pontos. E estas medidas para o método atual? Quais seriam? 3,0 pontos (7,0 até 10) e 30 degraus (7.0, 7.1, ... , 9.9, 10) !!!  O método classificatório diminui, e não aumenta, a distância possível entre a menor e a maior nota.
            Notas imediatas: Algumas pessoas ofereceram como alternativa a possibilidade dos jurados darem imediatamente após os desfiles de cada Escola as respectivas notas dos quesitos. Filosoficamente esta proposta é totalmente contrária a do método classificatório, e no meu entender aumenta muita a componente subjetiva uma vez que tenta eliminar qualquer parâmetro comparativo para a nota a ser dada pelo jurado, digo tenta porque na prática é impossível eliminá-lo da cabeça do jurado a partir da segunda Escola a desfilar, de maneira que seria preciso que cada jurado só desse nota para uma Escola, o que, cá pra nós, tornaria ainda mais subjetiva a análise, e apresenta todos os outros vícios que indicamos presente no método atual, principalmente a possibilidade de todas, ou pelo menos todas as grandes, ganharem dez ou notas altas. Aqui também poderia, no limite, ficar eliminada a sadia disputa, bem como ficar camuflados  possíveis favorecimentos.

 

Alexandre Mendonça Rocha (Passarinho)
(é carioca,salgueirense, nasceu em 1976 e acompanha os desfiles desde os 9 anos)

 

Debate
Artigos