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Senhores do JB
Sobre
o texto de Arthur J. Poerner, publicado na edição de 14/02/2003 do Caderno
B, encaminho a V.Sas. a seguinte reflexão: Na época de ouro das escolas
de samba, até a explosão do "fenômeno" Beija-Flor, nos anos
70, a hegemonia entre elas dividiu-se entre Mangueira, Portela, Império
Serrano e Salgueiro. Até ali, até mesmo entre os componentes das escolas
menores, a preferência dos sambistas se dividiam entre as quatro.
Surgida
em 1953 da fusão de tradicionais agremiações do famoso morro tijucano,
existentes desde a década de 1930, a Acadêmicos do Salgueiro (da qual
tive a honra de fazer parte, de 1963 a 1989) destacou-se pela
ousadia, pela cratividade e principalmente pelo excelente repertório
musical, talvez o melhor entre todos. Nos anos 30, quando se falava de
grandes redutos de samba, falava-se obrigatoriamente no Salgueiro, que
o pioneiro e legendário cronista Vagalume chamou de "o bamba dos
bambas".E Noel Rosa, o poeta da Vila, sabia disso, pois foi
principalmente lá, com Canuto, Buruca e Antenor Gargalhada, que ele
aprendeu e aprimorou, o seu samba "nas regras da arte", com
filosofia e "sem segunda parte", raiz do partido-alto de hoje.
Foi
também do Salgueiro que saiu a idéia da primeira associação aglutinadora
das escolas, sob a liderança de Flávio de Paula Costa, fundador
da UES.
E
o que se constata no texto de Poerner é que, entre os finalistas do festival
Fábrica do Samba, talentos portelenses, mangueirenses e imperianos
disseram presentes, enquanto que os do morro legendário e da escola inovadora
nem deram as caras. Observe-se que Portela, Mangueira e Império
tem sido bastante divulgadas através dos conjuntos musicais de suas velhas-guardas.
E cadê a do Salgueiro? Cadê o repertório de Noel Rosa de Oliveira (co-autor
de grandes sucessos, inclusive radiofônicos, como "Rosa Maria",
"Tudo foi ilusão")? Cadê Zuzuca ("Vem chegando a madrugada")?
Cadê Abelardo Silva ("O neguinho gostou da filha da madame")?
Cadê Gracia ("Subi mais de 1800 colinas")?
Observe-se,
ainda, que, quando o Ministério da Cultura, no ano passado, entregou medalhas
de mérito ao samba carioca, o Salgueiro também não foi lembrado. Então,
eu me pergunto? O quê estará havendo? A frondosa árvore chamada Salgueiro
secou? E só existe na avenida, com aquelas mulheres bonitas, aqueles jovens
malhados nas academias e aqueles famosos artistas da tevê? Acho que
está na hora de a turma do Salgueiro -- componentes, dirigentes e simpatizantes
-- mostrar seu valor, fora da avenida também. Porque, certamente,
os espíritos ancestrais como os de Manoel Macaco, Seu Paulino, Seu
Neca da Baiana, Calça Larga, Dona Maria Romana, Dona Ana Bororó etc. não
vão estar nada felizes na festa dos 50 anos que a Academia comemora neste
carnaval.
Abraços
Nei Lopes.
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