Sambado

 

          É assim mesmo. Inventei outro dia. Samba sábado é “sambado” e tem diversos significados, derivados das palavras originais.
          Nasceu agora, já em 2012, depois de vários segundos sábados do mês, quando faço jornada dupla de fotógrafa no Palácio do Samba, a quadra da Estação Primeira de Mangueira.
          Começa com a feijoada, escolhida como a melhor das oferecidas nas quadras cariocas. Ela reúne os segmentos da escola, representantes de outras agremiações e turistas, normalmente com a apresentação de um grupo da casa e um convidado. Costumo ficar por lá de uma e meia até seis, sete horas.
          Volto para a quadra para o ensaio, por volta da meia noite e permaneço até o final, já que costumo voltar de carona com amigos que conheci num táxi dirigido por um passista engenheiro elétrico. É um luxo, não é?
          E dá-lhe samba! “Mangueira seu cenário é uma beleza, que a natureza criou...” O melhor é quando os diretores começam a se posicionar e abrir a roda que se formará, comandada elegantemente pelo Presidente de Honra, o lendário mestre-sala Delegado, com sua batuta e seu apito. A fila organiza-se por segmentos: baluartes, baianas, feminino, passistas...
          No meio dessa alegria, ao som da bateria Surdo Um, os tenores interpretam sambas antigos da escola, entoados  por todos os presentes. Em seus olhos posso ver os momentos que eles trazem de volta para cada componente que passa diante das lentes da câmera fotográfica.
          Quando começa a ser cantado o samba enredo do ano um dos diretores cerimoniosamente retira o pavilhão da escola de seu suporte e o entrega à Marcela Alves, a porta bandeira, e Raphael Rodrigues, o mestre sala.
          Cabe a eles apresentar o símbolo máximo verde e rosa, primeiro ao mestre que o entregou ao casal, depois a Delegado, aos visitantes e ao público. É um momento único que tenho o privilégio de tentar registrar a cada ensaio. Digo tentar, por que não é fácil. Tudo  é muito rápido, no ritmo acelerado do samba e sempre fico na dúvida: se procuro seguir o casal que evolui em seu bailado pela quadra ou me deixo levar pelas expressões de quem assiste ao ritual. Elas são únicas. Traduzem uma emoção que só quem já esteve presente nesse momento, numa quadra de escola de samba, sabe qual é.
          A palavra SAMBADO só surgiu mais tarde, quando a essa programação, já intensa,  se juntaram os ensaios técnicos, na Sapucaí. Esse ano, o evento ocorreu em janeiro, quando SAMBADEI  pela primeira vez e vai acontecer, de novo, em fevereiro.
          Os ensaios técnicos na Sapucaí complementaram a idéia de SAMBADAR. Agregam a diversidade que faltava à programação, até então, todinha mangueirense. Imaginem que, entre a feijoada e o ensaio na quadra, encaixou-se a apresentação de duas ou três escolas do Grupo Especial, nos ensaios técnicos da Marques de Sapucaí.
          Querem saber? Quase morri de SAMBADO na sua primeira edição, em janeiro. E, para agüentar a segunda, no final de semana que antecede o carnaval, estou me preparando fisicamente. Como as rainhas de bateria ou  passistas que se preparam para o desfile carnavalesco, faço ginástica, caminho e até melhorei minha alimentação. SAMBADAR  é saúde!
          Mas não é só isso. Sambado é cultura, registro, alegria, generosidade, organização, música, ritmo (outro dia, me disseram que eu danço pra fotografar!), olhares, trejeitos, atração, oportunidade e, acima de tudo, força de vontade e saudade.
          Por que o trabalho só começa no SAMBADO. Editar o que capturei é a pedreira da felicidade, o trabalho de lapidar o olhar e afinar o sentimento revendo, a cada fotograma, a história do SAMBADO que ficou para (em) mim.

Valéria del Cueto
Valéria del Cueto é jornalista, cineasta e gestora de carnaval.
(Publicado originalmente no site SEM FIM [http://delcueto.multiply.com])
Esta crônica faz parte da série e “Ponta do Leme”

 

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