Categorização das vozes dos intérpretes de samba-enredo do Rio de Janeiro - Grupo Especial entre 2001 e 2005

 

Resumo:

          O presente estudo procurou descrever as opções vocais do intérprete de samba-enredo por meio de uma análise perceptivo-auditiva de gravações comerciais dos sambas de um período de cinco anos; Categorizamos parâmetros vocais deste profissional que estabelece uma comunicação entre a escola e o público, sendo a porta voz do tema sobre o qual o desfile se desenvolve, os puxadores (intérpretes de samba-enredo) do grupo especial das escolas de samba do Rio de Janeiro.  Foram analisadas a gravações comerciais de cinco anos (5 CDs com 12 faixas cada), interpretadas por 18 (cantores) puxadores oficiais; uma faixa foi excluída por se tratar de uma cantora. O trecho inicial de um minuto de gravação com a voz do intérprete foi editado para análise perceptivo-auditiva, considerando-se os seguintes parâmetros: tipo de voz, coordenação pneumofonoarticulatória, pitch, loudness, ressonância, ataque vocal e articulação. A avaliação foi realizada por cinco especialistas em voz. As amostras de voz apresentadas foram de modo aleatório, sem identificação dos cantores. Os trechos puderam ser repetidos para assegurar a avaliação.  Os intérpretes de samba-enredo analisados no período compreendido entre os anos de 2001 a 2005 apresentaram características vocais com desvios variados e em pequeno grau, caracterizados principalmente por uma qualidade vocal discretamente rugosa e articulação imprecisa.
          Descritores: Voz; Análise perceptivo-auditiva da voz; Voz no Samba-enredo.
          Title: The voice categorization of the Samba Interpreters of Rio de Janeiro - Special group  between 2001 to 2005.

Introdução:

          A partir da década de 30, iniciou-se a história da voz nas escolas de samba.   Segundo Araújo (2003) na “época de ouro da música popular”, havia grandes compositores e intérpretes da música popular brasileira, nos seus variados gêneros e ritmos. Inicialmente, a denominação samba-enredo não existia, o samba era o momento onde a classe empobrecida tinha a oportunidade de expressar sua realidade. O samba de então era construído de improviso, cantava-se apenas a primeira estrofe e o restante da composição era criado assim como o repente[1], no momento da apresentação quando o samba era concluído. O início do samba era cantado por mulheres, “as coralistas”, chamadas de pastoras[2], que ficavam próximas ao palanque onde se encontravam personalidades do samba incluindo uma comissão julgadora (julgadores formados por cronistas que tinham a função apenas de julgar o samba). As pastoras cantavam a primeira parte do samba e a segunda ficava a cargo dos chamados versadores ou mestres do canto (precursores dos puxadores de samba). Após aquele período, as escolas de samba começaram a criar identidade própria e a criar os primeiros enredos. Na seqüência, surgiu o “samba-enredo”.  Os puxadores e o apoio vocal (as pastoras), cantavam o samba sem apoio de sonorização (acústico).
          Devido à preocupação em relação ao ritmo, foram surgindo idéias de amplificação sonora até a chegada do recurso de som na avenida, na década de 60, logo depois, com Jamelão na G.R.E.S. Mangueira; mesmo período em que surgiu o termo “puxador de samba-enredo”, direcionado ao responsável pelo canto da escola na Avenida e que Jamelão posteriormente introduz o termo “intérprete” de samba enredo. Durante o desfile é o intérprete de samba-enredo quem canta o samba acompanhado de quatro a seis auxiliares que fazem o coro, vem acompanhado de um surdo de marcação e instrumentos de cordas (cavaquinhos e violões).  Araújo (2003) destaca que o puxador de samba é um especialista, que além de possuir boa voz, deve dominar o ritmo e a tonalidade adequada ao samba.  Entretanto, fatores externos também interferem nesta harmonia, atualmente, o sambódromo, apresenta problemas de acústica, o que vêm dificultando todo o processo de acerto de sons no templo do samba.  A história de Homens e Mulheres cantores de samba-enredo era diferente, os homens faziam o solo dos sambas e as mulheres o coro. Embora já demonstrados o seu poder de afinação e de resistência vocal, neste meio, mulheres são pouco vistas. Em média, um samba enredo é cantado na avenida, entre 40 a 100 vezes dependendo do tamanho da composição. Requerendo domínio da coordenação pnemofonoarticulatória e postura corporal vocal para obter qualidade e resistência vocal. A figura do puxador de samba-enredo é de suma importância para a escola de samba, pois ele é o seu representante sonoro. Nesta perspectiva, o intérprete deve contemplar além do cantar, uma relação interativa entre ele e a comunidade da escola, a diretoria, e o público presente ao evento.
          O intérprete/puxador faz o marketing da escola, torna-se o foco de atenção no que se refere à interpretação do samba e sua comunicação eficiente no espaço cênico. O intérprete e o coro têm funções diferenciadas: o intérprete na função de imagem direta da escola, é a primeira voz (voz guia) canta o samba e em alguns momentos realiza chamadas ( cacos[3]) que dão a identidade do samba ou do intérprete em si e o coro é o apoio, fundamental para manutenção e sustentação do samba na avenida. Enquanto o intérprete canta ou realiza cacos para chamar atenção do público e dos desfilantes, o coro harmônico possibilita expressividade, leveza e qualidade na apresentação, como observou Monteiro (2006).
          A gravação comercial das composições das escolas de samba surgiu a partir de 1968, inicialmente em LP, atualmente em CD, e estes registros permitem-nos analisar o quanto suas vozes possuem características próprias que os pontuam. Fundamentados em autores como Araújo (2003) e Augras (2006) que descrevem a figura do puxador / intérprete de samba-enredo, nosso estudo visa identificar parâmetros vocais que categorizem suas vozes. Segundo Abreu (1994), o profissional de canto exige mais de seu aparelho fonador do que um não-cantor, na medida em que necessita de um controle maior da expressividade, altura, intensidade, extensão vocal, qualidade da voz, respiração e articulação, entre outros. A maioria dos intérpretes de samba-enredo das escolas de samba, historicamente e culturalmente desconhecem como a voz é produzida, a formação do aparelho fonador e tem pouco contato com fonoaudiólogos e otorrinolaringologistas, a maioria não se preocupa com a higiene vocal, tem muitas dúvidas sobre alimentação adequada antes de uma apresentação, costumam se apresentar à noite, dormindo pouco, utilizando a automedicação e principalmente na época do carnaval o uso intensivo da voz acaba provocando inicialmente disfonias funcionais que podem se transformar em alterações mais sérias.

Métodos:

          Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Estudos da Voz (Nº 2613/05).
          Foi analisada a gravação comercial de cinco anos (5 CDs com 12 faixas cada), interpretadas por 18 (cantores) puxadores de sambas oficiais; uma faixa foi excluída por se tratar de uma cantora. Foi utilizado um computador da marca Metron, modelo Premium, código 0702012183. Utilizou-se programa  Adobe Audition 1.5  para selecionar e copiar os trechos  das amostras. O trecho inicial de um minuto de gravação com a voz do puxador foi editado para análise perceptivo-auditiva, onde utilizamos um protocolo considerando-se os seguintes parâmetros: qualidade vocal - tipo de voz classificada como: adaptada, rouca, soprosa, áspera, tensa e outras; coordenação pneumofonoarticulatória classificada como: adequada ou inadequada; pitch dividimos em (adequado, agudo ou grave); loudness classificamos como (adequado, forte ou fraco); ressonância classificamos como: equilibrada, oral, nasal, faríngea ou laringo-faríngica; ataque vocal classificado como: isocrônico, brusco ou aspirado  e  a articulação classificada como: precisa, imprecisa, travada ou exagerada. A avaliação foi realizada por cinco especialistas em voz e as amostras apresentadas de modo aleatório, sem identificação dos cantores. Os trechos puderam ser repetidos em até três vezes para assegurar a avaliação. Foram repetidas 10% das amostras para verificar a confiabilidade intra-avaliador. Os resultados receberam tratamento estatístico com seleção e reunião dos intérpretes e trechos; observação e classificação dos mesmos quanto à qv, cpfa, pitch, loudness, ressonância, ataque vocal e articulação. Foram analisadas as variações da qualidade vocal e do pitch  .

Resultados:

          Os ajustes fonatórios promovidos pelos intérpretes de samba-enredo no período de 2001 a 2005 demonstraram por meio de análise perceptivo-auditiva que neste campo de atuação profissional a qualidade vocal verificada foi adaptada em 52,5% das amostras, com desvios de discreto a moderado, principalmente em direção à rugosidade, na metade das amostras desviadas. (Tabela 1) A cpfa mostrou-se adequada  em 88,1% das amostras e o principal desvio foi 11,9 % das amostras. O pitch adequado com 66,1%, agudo em 23,7% e grave em apenas 10,2%; A loudness foi considerada adequada em 64,4%, fraca em 22,0 % e forte em 10,2%; ressonância equilibrada em 42,4 %, nasal em 37,3% e laringo-faringea 16,9%; O ataque vocal isocrônico em 76,3% e quando desviado 23,7%; A articulação em 45,8%  adequada e  maior desvio  em 54,2% das amostras . Foi interessante encontrar que os puxadores trocam de escolas diversas vezes, mas suas vozes permaneceram estáveis no período analisado de cinco anos.
          No presente estudo, o resultado da análise perceptivo-auditiva no período compreendido entre 2001 a 2005, referindo-se à qualidade vocal, constatou-se em sua maioria um desvio com mais incidência de rouquidão em grau variado.(Tabela 1). A rouquidão com variação de grau evidenciado neste período analisado pode ser justificada por vários fatores, como sonorização, espaço cênico, desgaste e fadiga vocal, entre outros, entretanto esse tipo vocal se encontra presente e o caracteriza neste grupo (como imagem vocal positiva ou negativa). No samba-enredo onde ocorreu predomínio da ressonância  equilibrada, entende-se quando utilizado de forma distribuída os três focos principais de ressonância(laringe, oral e nasal); Onde podemos supor facilidade em exteriorizar a emoção. Observamos que toda vez que o pitch foi desviado a articulação apresentou em sua maioria alterada. (Tabela2). O pitch correlaciona-se com a ressonância, onde é empregada a relação direta com a intenção do discurso. Neste caso evidenciamos pitch em tom mais agudo que sugere expressão mais alegre, ênfase mais marcada e velocidade de fala maior. O estilo musical sugere este modelo. A intensidade vocal requer uma série de fatores fisiológicos, dentre eles a resistência que a glote oferece a passagem do ar, psicologicamente expressa o limite em relação a si e ao outro, neste caso, infere aspectos de interação de controle de projeção vocal no espaço. Espera-se que o intérprete de samba-enredo tenha uma consciência na relação com o outro (o coro, desfilantes e público), com o ambiente e que a intensidade, ou seja, a loudness empregada seja reflexo diante o contexto, a estrutura melódica e a dinâmica da composição. Há variação da articulação no samba-enredo por seus intérpretes.  Os ajustes motores propiciam informações subjetivas, diante o estilo musical. A articulação com desvio compromete a clareza de idéias e pode interferir na linha melódica (quando compromete a estrutura rítmica frasal). A cpfa é o resultado da interrelação harmônica das forças expiratórias, mioelásticas da laringe e musculares da articulação. A cpfa adequada transmite ao ouvinte a sensação de estabilidade, de harmonia e demonstra que o som através do indivíduo soa como um todo. O ataque vocal de ordem fisiológica é o inicio da sonorização e está relacionado à configuração glótica no momento da emissão, depende da situação de comunicação, da intenção do discurso e da freqüência de seu uso na fonação. No samba-enredo há variabilidade de ataque vocal. Podemos ressaltar que o cantor de samba-enredo além de seu conteúdo de voz ele sofre influências estruturais musicais (como ritmo, cadência, linha melódica, letra, etc...)  e sociais ( tipologia do cantor, origem, etc.. ) que podem explicar os ajustes adotados ao puxar um samba.  Vale ressaltar que encontramos puxadores que trocaram de escolas diversas vezes, mas sua voz permaneceu estável no período analisado de cinco anos. A permanência de um mesmo intérprete na escola não significa que os parâmetros vocais permaneçam os mesmos.

Tabela 1 - Análise perceptiva auditiva dos intérpretes de samba enredo, entre 2001 e 2005 do grupo especial

Ano:

2001

2002

2003

2004

2005

Total

N

% Col

N

% Col

N

% Col

N

% Col

N

% Col

N

% Col

Qualidade vocal

Adaptada

5

41,7

6

50,0

9

75,0

6

54,5

5

41,7

31

52,5

Rouca Áspera G1

   

1

8,3

           

1

1,7

Rouca G1

1

8,3

           

2

16,7

3

5,1

Rouca G2

           

1

9,1

   

1

1,7

Rouca Soprosa G1

1

8,3

2

16,7

1

8,3

1

9,1

1

8,3

6

10,2

Rouca Tensa G1

2

16,7

           

2

16,7

4

6,8

Tensa G1

3

25,0

3

25,0

2

16,7

3

27,3

2

16,7

13

22,0

CPFA

Adequada

11

91,7

11

91,7

11

91,7

9

81,8

10

83,3

52

88,1

Inadequada

1

8,3

1

8,3

1

8,3

2

18,2

2

16,7

7

11,9

Pitch

Adequada

9

75,0

6

50,0

9

75,0

9

81,8

6

50,0

39

66,1

Agudo

3

25,0

3

25,0

2

16,7

1

9,1

5

41,7

14

23,7

Grave

   

3

25,0

1

8,3

1

9,1

1

8,3

6

10,2

Loudness

Adequada

5

41,7

9

75,0

7

58,3

7

63,6

10

83,3

38

64,4

Equilibrada

       

1

8,3

1

9,1

   

2

3,4

Forte

2

16,7

2

16,7

1

8,3

1

9,1

   

6

10,2

Fraca

5

41,7

1

8,3

3

25,0

2

18,2

2

16,7

13

22,0

Ressonância

Equilibrada

4

33,3

4

33,3

5

41,7

4

36,4

8

66,7

25

42,4

Laringo-Faríngea

2

16,7

4

33,3

2

16,7

2

18,2

   

10

16,9

Nasal

6

50,0

3

25,0

4

33,3

5

45,5

4

33,3

22

37,3

Oral

   

1

8,3

1

8,3

       

2

3,4

Ataque vocal

Brusco

3

25,0

5

41,7

2

16,7

1

9,1

3

25,0

14

23,7

Isocrônico

9

75,0

7

58,3

10

83,3

10

90,9

9

75,0

45

76,3

Articulação

Imprecisa

8

66,7

9

75,0

6

50,0

5

45,5

4

33,3

32

54,2

Precisa

4

33,3

3

25,0

6

50,0

6

54,5

8

66,7

27

45,8

Total

N   e   %

12

100,0

12

100,0

12

100,0

11

100,0

12

100,0

59

100,0

Tabela 2 - Análise perceptiva auditiva do PITCH dos intérpretes de samba enredo, entre 2001 e 2005 do grupo especial (que participaram 4 ou 5 anos)

Intérprete

Ano:

2001

2002

2003

2004

2005

Total

Qualidade vocal

N

% Int

N

% Int

N

% Int

N

% Int

N

% Int

N

% Col

Dominguinhos

Adequada

1

20,0

1

20,0

1

20,0

1

20,0

1

20,0

5

100,0

Gera

Adequada

   

1

25,0

1

25,0

1

25,0

   

3

75,0

Agudo

1

25,0

               

1

25,0

Jackson Martins

Adequada

1

25,0

1

25,0

           

2

50,0

Agudo

       

1

25,0

1

25,0

   

2

50,0

Jamelão

Adequada

1

20,0

1

20,0

1

20,0

1

20,0

   

4

80,0

Agudo

               

1

20,0

1

20,0

Nêgo

Adequada

1

20,0

1

20,0

1

20,0

1

20,0

1

20,0

5

100,0

Neguinho da Beija-Flor

Adequada

1

20,0

   

1

20,0

1

20,0

1

20,0

4

80,0

Agudo

   

1

20,0

           

1

20,0

Paulinho Mocidade

Adequada

1

25,0

   

1

25,0

1

25,0

   

3

75,0

Agudo

   

1

25,0

           

1

25,0

Quinho

Adequada

1

20,0

           

1

20,0

2

40,0

Grave

   

1

20,0

1

20,0

1

20,0

   

3

60,0

Wander Pires

Adequada

           

1

25,0

   

1

25,0

Agudo

       

1

25,0

   

1

25,0

2

50,0

GRAVE

   

1

25,0

           

1

25,0

Wantuir

Adequada

   

1

20,0

1

20,0

1

20,0

   

3

60,0

Agudo

1

20,0

           

1

20,0

2

40,0

% Int = percentual do Intérprete no período

% Col = percentual da coluna (no Intérprete)

Tabela 3:

Intérpretes - Isabel

Nome

Ano

Qualidade vocal

CPFA

Pitch

Loudness

Ressonância

Ataque
vocal

Articulação

Carlinhos da Paz

2001

Adaptada

Adequada

Agudo

Adequada

Equilibrada

Isocrônico

Imprecisa

Dominguinhos do Estácio

2001

Adaptada

Adequada

Adequada Adequada Equilibrada Isocrônico Imprecisa

Jackson Martins

2001

Adaptada Adequada Adequada Adequada Equilibrada Isocrônico Precisa

Nêgo

2001

Adaptada Adequada Adequada

Fraca

Nasal

Isocrônico Imprecisa

Neguinho da Beija-Flor

2001

Adaptada Adequada Adequada Fraca Equilibrada Isocrônico Precisa
Carlinhos da Paz

2002

Adaptada Adequada

Agudo

Adequada Equilibrada Isocrônico Imprecisa

Celino Dias

2002

Adaptada Adequada

Grave

Adequada Equilibrada Isocrônico Precisa
Dominguinhos do Estácio

2002

Adaptada Adequada Adequada Adequada Equilibrada Isocrônico Imprecisa

Jackson Martins

2002

Adaptada Adequada Adequada Adequada Equilibrada Isocrônico Precisa

Jamelão

2002

Adaptada Adequada Adequada

Forte

Laringo-Faringea

Isocrônico Imprecisa

Nêgo

2002

Adaptada Adequada Adequada Adequada Nasal Isocrônico Imprecisa

Celino Dias

2003

Adaptada Adequada Adequada Fraca Nasal Isocrônico Precisa

David do Pandeiro

2003

Adaptada Adequada Adequada Fraca Nasal Isocrônico Precisa

Gera

2003

Adaptada Adequada Adequada Adequada Equilibrada

Brusco

Imprecisa

Jackson Martins

2003

Adaptada Adequada Agudo Adequada Nasal Isocrônico Imprecisa

Jamelão

2003

Adaptada Adequada Adequada Forte Laringo-Faringea Isocrônico Imprecisa

Neguinho da Beija-Flor

2003

Adaptada Adequada Adequada Adequada Equilibrada Isocrônico Precisa

Paulinho Mocidade

2003

Adaptada Adequada Adequada Equilibrada Equilibrada Isocrônico Precisa

Wander Pires

2003

Adaptada Adequada Agudo Adequada Nasal Isocrônico Precisa

Wantuir

2003

Adaptada Adequada Adequada Adequada Equilibrada Isocrônico Precisa

David do Pandeiro

2004

Adaptada Adequada Adequada Fraca Nasal Isocrônico Precisa

Gera

2004

Adaptada Adequada Adequada Adequada Equilibrada Isocrônico Precisa

Jamelão

2004

Adaptada Adequada Adequada Forte Nasal Isocrônico Imprecisa

Nêgo

2004

Adaptada Adequada Adequada Adequada Nasal Isocrônico Imprecisa

Neguinho da Beija-Flor

2004

Adaptada Adequada Adequada Adequada Equilibrada Isocrônico Precisa

Paulinho Mocidade

2004

Adaptada

Inadequada

Adequada Equilibrada Equilibrada Isocrônico Precisa

Bruno Ribas

2005

Adaptada Adequada Agudo Adequada Equilibrada Isocrônico Precisa
Dominguinhos do Estácio

2005

Adaptada Adequada Adequada Adequada Equilibrada Isocrônico Imprecisa

Preto Jóia

2005

Adaptada Adequada Adequada Adequada Equilibrada Isocrônico Precisa

Serginho do Porto

2005

Adaptada Adequada Agudo Adequada Equilibrada Brusco Precisa

Wander Pires

2005

Adaptada Adequada Agudo Adequada Nasal Isocrônico Precisa

Gera

2001

Rouca G1

Adequada Agudo Adequada Laringo-Faringea Isocrônico Imprecisa
Paulinho Mocidade

2002

Rouca Áspera G1

Adequada Agudo Forte Nasal Brusco Imprecisa

Roger Linhares

2005

Rouca G1

Adequada Adequada Adequada Equilibrada Isocrônico Precisa

Ronaldo Ilê

2005

Rouca G1

Adequada Grave Adequada Equilibrada Isocrônico Precisa

Quinho

2004

Rouca G2

Inadequada Grave Adequada Laringo-Faringea Isocrônico Imprecisa
Wantuir

2001

Rouca Soprosa G1

Inadequada Agudo Fraca Nasal Brusco Imprecisa

Gera

2002

Rouca Soprosa G1

Inadequada Adequada Adequada

Oral

Brusco Imprecisa
Wander Pires

2002

Rouca Soprosa G1

Adequada Grave Adequada Nasal Brusco Imprecisa
Dominguinhos do Estácio

2003

Rouca SoprosaG1

Adequada Adequada Fraca Equilibrada Isocrônico Imprecisa
Dominguinhos do Estácio

2004

Rouca Soprosa G1

Adequada Adequada Adequada Equilibrada Isocrônico Imprecisa

Wantuir

2005

Rouca Soprosa G1

Inadequada Agudo Fraca Nasal Brusco Imprecisa

Celino Dias

2001

Rouca Tensa G1

Adequada Adequada Forte Laringo-Faringea Brusco Imprecisa

Quinho

2001

Rouca Tensa G1

Adequada Adequada Fraca Nasal Isocrônico Precisa
Neguinho da Beija-Flor

2005

Rouca Tensa G1

Adequada Adequada Adequada Equilibrada Isocrônico Precisa
Quinho

2005

Rouca Tensa G1

Adequada Adequada Fraca Nasal Isocrônico Imprecisa
David do Pandeiro

2001

Tensa G1

Adequada Adequada Fraca Nasal Isocrônico Imprecisa

Jamelão

2001

Tensa G1

Adequada Adequada Forte Nasal Brusco Imprecisa
Paulinho Mocidade

2001

Tensa G1

Adequada Adequada Adequada Nasal Isocrônico Precisa

Neguinho da Beija-Flor

2002

Tensa G1

Adequada Agudo Adequada Laringo-Faringea Brusco Imprecisa

Quinho

2002

Tensa G1

Adequada Grave Adequada Laringo-Faringea Brusco Imprecisa
Wantuir

2002

Tensa G1

Adequada Adequada Fraca Laringo-Faringea Isocrônico Precisa

Nêgo

2003

Tensa G1

Inadequada

Adequada Adequada

Oral

Isocrônico Imprecisa

Quinho

2003

Tensa G1

Adequada Grave Adequada Laringo-Faringea Brusco Imprecisa

Jackson Martins

2004

Tensa G1

Adequada Agudo Adequada Nasal Isocrônico Imprecisa
Wander Pires

2004

TensaG1

Adequada Adequada Adequada Nasal Brusco Precisa

Wantuir

2004

Tensa G1

Adequada Adequada Fraca Laringo-Faringea Isocrônico Precisa
Jamelão

2005

Tensa G1

Adequada Agudo Adequada Equilibrada Brusco Precisa

Nêgo

2005

TensaG1

Inadequada Adequada Adequada Nasal Isocrônico Imprecisa

Discussão:

          Há no Samba influência de diversos estilos musicais. Este gênero musical assim como os demais  acolhe interpretações de cada cantor.  O estilo musical imprime uma gama de elementos capazes de instituir diferentes graus de valor às criações artísticas, pelo emprego dos meios próprios de expressividade e imprime determinados padrões estéticos. O samba possui vários gêneros, apresentando diversidade de interpretações: erudito (interpretação do cantor com formação operística que faz prolongamento de frases melódicas), popular (o cantor que segue um estilo próprio, sem uma técnica definida), impostado(o cantor que está próximo ao erudito, utilizando algumas técnicas de impostação) e coloquial (que canta em um estilo próprio de comunicação com os ouvintes). Monteiro, (2008). O samba é denominado cultura popular. Augras (1998), expõe e enfrenta a questão afirmando que não gosta do nome ‘cultura popular', pela sugestão que parece carregar de corte, diferenciação quase natural, com a cultura ‘erudita'. Mas admite o termo ‘popular' através da “idéia que designa exclusivamente um lugar de produção cultural”. Naidish (1984) diferencia canto lírico e popular, descrevendo que o cantor popular utiliza amplificação eletrônica, o que não acontece com o cantor lírico, que precisa de um volume de ar maior e de bons ressonadores para uma boa emissão dos harmônicos.  Refere, ainda, que os cantores populares têm estilo e expressividade próprios e os líricos utilizam ainda mais o jogo melódico, agilidade e proezas vocais. Observou, também, que a técnica vocal não difere muitos entre estes cantores, porém as necessidades de cada grupo são diferentes. O samba-enredo oscila entre o erudito e o popular. Os enredos e sua encenação do desfile da escola de samba beiram o operístico, porém o ritmo, a música e o instrumental permanecem como “samba”, o que é inegavelmente uma produção de cultura popular, segundo Monteiro (2008). As criações e variações vocais progrediram paralelamente ao grande desenvolvimento fonográfico. É importante salientar que a história da formação das escolas de samba e da criação do samba-enredo é o ponto de partida para o estudo da voz deste grupo. As vozes dos intérpretes de samba-enredo traduzem muito de sua formação social, expressa na sua linguagem oral. Acreditavam que suas vozes não demandavam cuidados especiais, o que vem sendo reformulado através de informações específicas sob sua posição de profissionais da voz, dadas principalmente por Fonoaudiólogas.
          A qualidade vocal do intérprete de samba-enredo também é alvo de discussões, uma vez que para sua produção é necessária à monitoração dos diversos parâmetros envolvidos na voz.
          A avaliação perceptiva auditiva se baseia no julgamento subjetivo que um ouvinte faz a respeito das características de uma voz. Na clínica pode-se considerar como uma estratégia à comparação de uma voz com um sistema de referência interno do avaliador, que depende de diversos fatores e varia de sujeito a sujeito.
          Russo e Behlau (1993) observaram que a qualidade vocal do ponto de vista fisiológico depende da força e controle respiratório, da espessura, elasticidade, comprimento e condições das cordas vocais. As alterações vocais no canto podem ser decorrentes de uma disfunção funcional primária por falta de conhecimento vocal, levando, muitas vezes, à manifestação de uma disodia (alteração da voz cantada) podendo ser decorrente de métodos empíricos, falta de conhecimentos sobre produção da voz, classificação vocal errônea, uso vocal incorreto, além da falta de treinamento vocal referente às técnicas de aquecimento e desaquecimento.
          O estudo das emoções demonstra que há influências consideráveis em relação voz cantada. Ao cantar um samba-enredo, o cantor pode ali se revelar, não somente pela voz, mas, também pelo comportamento durante a apresentação sob impacto.
          Segundo Abreu (2001), “Sim, a estética musical oscila eternamente em busca de um equilíbrio a partir de lugares antagônicos: espírito/matéria, natureza/arte, tradição/ transgressão, sagrado/profano, razão/magia, técnica/espontaneidade, erudição/intuição, voz/ instrumento, intérprete/autor, obra/artista. Desta busca do equilíbrio já estava Aristóteles, defendendo que uma das funções vitais da música era a catarse. A catarse, dizia ele, é a crise que a música provoca na alma atribulada, provocando sentimentos poderosos e finalmente a emoção, ou seja, o “movimento para fora” e assim facilitando o necessário retorno ao estágio de equilíbrio”.
          Behlau (2001), descreve que estudos relacionados à ressonância demonstram que as impressões transmitidas fisiologicamente consistem na amplificação da intensidade de sons de determinadas freqüências da voz e no amortecimento de outras, psicologicamente indica objetivo emocional do discurso. A extensão de freqüência da voz cantada refere-se à faixa de máxima e mínima de freqüência vocal que o cantor consegue produzir, segundo Heilen, (2002), a fonação é produzida com uma série mais rica de freqüências fundamentais e harmônicos (em torno de duas oitavas e meia) e com intensidade mais forte do que durante a fala, Menaldi (1992).
          Mürbe et al. (2002) investigaram a relação entre feedback auditivo e cinestésico e voz cantada, no que diz respeito ao controle da freqüência vocal de cantores no início do seu aprendizado. Concluiu-se que o feedback auditivo contribuiu de forma significativa para o controle da freqüência vocal.
          No uso da voz falada, é essencial que haja uma boa articulação das palavras já que a mensagem que será transmitida depende delas. No canto, a projeção vocal é primordial, sendo necessário que a boca esteja mais aberta, reduzindo os obstáculos à saída do som. Porém, se no canto o som se projeta de forma mais livre, essa configuração oro-faríngea cria peculiaridades singulares para a formação das palavras, incluindo o abrandamento ou reforço de certas consoantes e a neutralização/fusão de vogais em determinados pontos da extensão vocal. Nesse caso, a mensagem não depende apenas das palavras, mas também dos aspectos musicais, necessitando de apurada qualidade vocal. Fatores como a distância do público e o objetivo a ser alcançado, tanto na voz falada quanto na voz cantada, determinam o tipo de projeção vocal. Quanto à postura, durante a fala ocorrem mudanças constantes, não havendo, dependendo da postura adotada, grande interferência em sua produção. Tais variações são naturais, conhecidas como linguagem corporal, sendo úteis na complementação das idéias na fala (Behlau e Rehder, 1997). No caso dos puxadores de samba é importantíssimo que se unam projeção e a articulação, de modo a comunicar ao público o sentido emocional do samba-enredo.
          Segundo Behlau (2004), O pitch correlaciona-se com a ressonância, onde é empregada a relação direta com a intenção do discurso.

Conclusão:

          Os intérpretes de samba-enredo analisados no período compreendido entre os anos de 2001 a 2005 apresentaram características vocais com desvios variados e em pequeno grau, caracterizados principalmente por uma qualidade vocal discretamente rugosa e articulação imprecisa.
          A voz humana muda no transcorrer da vida, assim como o corpo e suas estruturas crescem e desenvolvem-se. A partir das emoções das pessoas e em resposta ao ambiente, refletindo o estado de saúde do corpo e da mente, a voz se impõe.  Assim, observa-se que não existem padrões estabelecidos e, com base nos aspectos levantados por Casper e Colton (1996), pode-se concluir que a voz normal não existe. Os conhecimentos e as caracterizações sobre a normalidade vocal nos diferentes momentos da vida permitem uma melhor compreensão da voz esperada. A execução de um samba-enredo vem sempre acompanhada de características das escolas de samba ( cadência, melodia, pegada e marcadores importantes que fazem parte do marketing da escola)  e a voz do intérprete sofre essas influências podendo variar sua voz.   Os dados sugerem, portanto, que os intérpretes se orientam, em grande medida, por fatos de natureza lingüística ao fazerem a organização prosódica dos sambas-enredos, no que se refere mais especificamente à frase entonacional. Mas, nessa orientação, os intérpretes parecem explorar diferentes possibilidades desse constituinte. Com efeito, por um lado, diferentes organizações prosódicas criadas a partir de uma mesma disposição seqüencial lingüística parecem mobilizar diferentes efeitos de sentido para essa seqüência; por outro lado, essas diferentes organizações podem ser vistas como marcas de subjetividade dos intérpretes na medida em que relacionam diferentes possibilidades de reestruturação a questões de estilo individual das escolas de samba. O cantor de samba-enredo é expressão de cultura de um povo e tem nuances na voz que deixam sua marca.

Referências:

  1. Behlau, M. Voz - o livro do especialista.1a ed. Vol 2. Rio de Janeiro: Revinter. 2005

  2. Behlau, M. Voz – O livro do Especialista. Vol 1. Rio de Janeiro: Revinter. 2001.

  3. Araújo, H. Carnaval – Seis Milênios de História. Rio de Janeiro. Gryphus. 2003.

  4. Sandroni, C. Feitiçaria decente: transformações do samba no Rio de Janeiro. 1917-1933. Rio de Janeiro: Ed. Jorge Zahar: Ed. UFRJ. 2001

  5. Colton, R. H & Casper, J. K. - Compreendendo os problemas de voz. Porto Alegre: Artes médicas. 1996.

  6. Augras, M. O Brasil do Samba-enredo. RJ – Ed. FGV. 1998.

  7. Cabral, S. As Escolas de Samba do Rio de Janeiro. RJ –  Lumiar. 1996.

  8. Augras, M.  História do samba. Revista Tempestade e Comunicação. 2006.

  9. Silva, M.A.A. Tipologia da Voz no Samba Carioca. Tese de Doutorado em Comunicação e Semiótica. Puc -São Paulo – SP. 2001.

  10. Naidish, S. Esquema corporal del cantante. Sensibilidades proprioceptivas. Técnica Vocal: su acquisicion. In: Princípios de Foniatria. Buenos Aires. Medical – Panamericana; 1984.

  11. Kyrillos, L.R. Expressividade – Da Teoria à Prática. Rio de Janeiro; Revinter; 2005.

  12. Sataloff, R.T. - Professional Voice. New York, Raven, 1991.

  13. Baê, T. & M. M. Canto, uma expressão -  Princípios básicos de técnica vocal. SP. Irmãos Vitale, 2000.

  14. Behlau, M. & Redher, I.. Higiene Vocal Para o Canto Coral. Rio de Janeiro: Revinter, 1997.

  15. Costa, H. & ANDRADA E SILVA, M. A. Voz Cantada. São Paulo, Edit. Lovise, 1998.

[1] Canto (melodia) com versos improvisados (Dicionário eletrônico da Língua Portuguesa Houaiss, 2001);

Em geral, praticado pelos brasileiros nordestinos.

[2] Intérpretes mulheres que cantavam os sambas realizando apoio para os versadores (solistas) apresentarem suas composições.

[3]  Expressão usada no teatro, sendo uma fala que originalmente não existia no texto, mas que, durante o período de ensaios, se encaixa e passa a fazer parte dele.

Isabel de Godoys Monteiro Gomes (Fonoaudióloga Clínica. Especialização em Voz – Centro de Estudos da Voz) e Mara Behlau (Doutora em Distúrbios da Comunicação Humana – UNIESP. Diretora CEV)

 

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