Voz – Ontem, hoje e amanhã no samba-enredo

 

          A história se aplica a partir das décadas de 30, 40, 50 onde ainda não existia a figura do puxador- intérprete de samba-enredo, época em que o samba era cantado por um grupo de pastoras que ficavam próximas do palanque onde estavam a comissão julgadora. O samba era de improviso. E as pastoras cantavam a primeira parte e a segunda ficava a cargo dos chamados versadores ou mestre do canto ( precursores dos puxadores de samba).Após esse período, iniciou-se o recurso de som na avenida com Jamelão( voz forte, potente). Voz potente, ainda mais com amplificadores. Em seguida outras escolas foram aprimorando a sonorização. Neste tempo surgiu o termo "puxador de samba-enredo", direcionado ao responsável pelo canto da escola na avenida. Hoje encontramos um carro de som potente, com alta tecnologia, e um grupo que acompanha o intérprete oficial, designado de coro, geralmente 4 a 6 apoios vocais do carro de som com responsabilidade de manter, sustentar o samba na avenida . Este grupo favorece o cantor-puxador-intérprete oficial a poder entre outras coisas, realizar os cacos (marca registrada de cada intérprete oficial) e chamar atenção para a escola na avenida. Cada intérprete tem seu grito de guerra, seu estilo, seu carisma. É fato que hoje encontramos um carnaval bem diferente de outras épocas: ritmo, cadência, o uso da língua nas composições, se contrapõe com a tecnologia e com a forma de julgamento. Hoje, implementados com outros andamentos, inovação de bossas das baterias, letras das músicas sincopadas, conteúdo da letra condizente com o enredo,...tornando cada vez mais qualidade nas apresentações. Na voz há um novo alvorecer nas escolas de samba, ela passa por transformação, novos ecos na avenida vem acontecendo, renovação de estilos de canto, ritmo e andamento para o foco samba-enredo. Têm-se cantores-intérpretes oriundos de canto lírico, mpb, mas o que favorece é saber que cantar samba-enredo, é ter resistência vocal, articulação precisa, respiração e fonação controlados e harmônicos, ressonância equilibrada, altura elevada, postura, dentre outros quesitos exigidos. Na maioria das vezes homens são intérpretes / puxadores oficiais, as mulheres cantoras-intérpretes não exercem função de intérprete oficial no carnaval não, pois, geralmente as melodias, as composições são em tom mais grave o que torna um desgaste vocal enorme para elas, já que em média as vozes femininas são em tom mais agudo.
          Não é tradição mulheres serem puxadoras / intérpretes de samba por muitos considerarem que a voz aguda se torna difícil de sustentar o samba na avenida, mas algumas participam atualmente no carro de som como apoio/coro. Hoje temos na Mocidade, por exemplo, no Grupo Especial. Cuidados nesta época devem ser tomados por este seleto grupo, como, dormir bem, evitar gritar e falar em ambiente ruidoso, repouso vocal, beber bastante líquidos ( preferencialmente água) evitar beber gelado, comer alimentos leves e saudáveis, evitar comidas condimentadas, evitar pigarrear - raspar a garganta, sempre realizar aquecimento e desaquecimento vocal. O amanhã é fruto do que colhemos hoje. Esses profissionais dependem da voz, pois é seu instrumento de trabalho. VOZ É EMOÇÃO, É PESSOAL E INTRANSFERÍVEL. A história cita nomes de intérpretes que se encontram imortalizados na memória de muitos por suas apresentações/ interpretações. A tonalidade, a boa articulação e uma sustentação vocal são de admirá-los. Na maioria deles o carisma, a empatia com o público também fazem diferença. Esses permanecem presentes nas mentes daqueles que sabem que soar nos ouvidos do outro a voz, a emoção, a interpretação, enfim, a vida do samba da escola daqueles quem "quem sabe faz", é atemporal e os tornam inesquecíveis.

Isabel de Godoys Monteiro Gomes
Isabel é fonoaudióloga, professora universitária e pesquisadora. Realiza trabalhos com intérpretes de samba-enredo dos Grupos de acesso e Especial (staff vocal), consultoria inter-estadual e treinamento vocal.

 

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