A mesmice do Carnaval na TV

 

          Todo ano é a mesma coisa. Eu tento ver o desfile das escolas de samba pela TV mas não dá pra agüentar. E posso garantir ao prezado leitor que não é por causa do sono, não. Esse, claro, chega mais depressa do que deveria devido à transmissão monótona e repetitiva, com narradores e comentaristas fazendo das tripas coração para manter ligado o interesse do telespectador. Como sou do ramo e narrei o desfile da Sapucaí alguns anos, sei que é duro “encher lingüiça” com as informações de sempre sobre a escola, sua história, seus dirigentes, quem é quem na comunidade, etc. etc. etc.
          A TV não evolui no quesito transmissão de imagens. A comissão de frente e o carro abre-alas são mostrados à exaustão, porque a escola evolui lentamente no início do desfile para correr desenfreadamente da metade em diante para passar no tempo regulamentar. Então os que saem na frente da escola são contemplados com maior exposição na TV. Mais do que eles, só mesmo as modelos da ocasião e os artistas da Globo que descobriram no Sambódromo (na passarela ou nos camarotes) uma maneira de aparecer na vitrine e mandar seu recado como quem diz: "- olhaí, pessoal, eu estou aqui, lembrem-se de mim na hora de escalar a próxima novela".
          Mas onde o fenômeno da mesmice aparece com maior nitidez é no próprio desfile. Cada ano que passa, as escolas ficam mais iguais, nem as cores originais são mais respeitadas. Fantasias de gosto duvidoso, com adereços de mão ou na cabeça, muitas vezes dificultam a movimentação do desfilante. Digo desfilante, porque os sambistas de verdade (poucos) são relegados a segundo plano pelas câmeras de TV e até pela própria escola, que prioriza o desfilante que paga, ao morador do morro que ama sua escola mas não tem dinheiro para comprar a fantasia. A mesmice é tanta que hoje, antes da abertura dos envelopes, a mídia especulava que das treze escolas oito eram favoritas ao título.
          Capítulo especial para os carros alegóricos. Os carnavalescos se esmeram em produzir uma geringonça maior que a outra. O resultado são carros gigantescos que quase não cabem na avenida. É comum quebrarem antes ou no meio do desfile. Ouso sugerir que os carros tenham uma competição à parte, fora das escolas, pois só assim o pessoal que sai no chão teria maior oportunidade de sambar e de aparecer para o público e para a TV.
          No mais, vale registrar a importância que a mídia deu ao incidente entre a cantora Beth Carvalho e a direção da Mangueira. É assunto de suma importância. Certamente, as pessoas vão passar noites sem dormir, preocupadas com o destino da cantora no futuro de sua amada "agremiação".
          Ah, ia me esquecendo de falar da Cicarelli, nomeada pela mídia "musa" do camarote daquela cervejaria. Dizem os coleguinhas que toda vez que aparecia um fotógrafo ou cinegrafista, Cicarelli agarrava seu namorado, ainda aquele da praia espanhola, aos abraços e beijos na boca. Fiquei a imaginar quantas calorias ela gastou nessas duas noites de carnaval, sabendo-se que "um beijo de língua movimenta 29 músculos, sendo 17 nela mesma; alguns estudiosos estimam que um beijo prolongado gaste entre 12 e 14 calorias", segundo Arlete Gavranic, coluna Sexo, em site publicado no UOL (http://www1. uol.com.br/ vyaestelar/ sexo.htm) .
          Com ou sem os beijos da Cicarelli, o passa-fora que a Beth levou e a mesmice do desfile na TV, juro que no ano que vem vou tentar mais uma vez.

Eliakin Araújo
(Publicado originalmente no site Direto da Redação em 22 de fevereiro de 2007)

 

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