Da propaganda à enganação - o samba-enredo da decepção

 

          Confesso que num primeiro momento fiquei entusiasmado com a idéia de ver nossa Poços de Caldas sendo homenageada com o samba-enredo de uma das maiores escolas de samba do país.
          Não por que seja um carnavalesco apaixonado - aqueles que me conhecem sabem que prefiro a tranqüilidade do campo às festas do Rei Momo - mas pela oportunidade de poder ver e ouvir na avenida, a história de Poços de Caldas cantada em verso e prosa na voz de Neguinho da Beija-Flor.
          Enquanto a maioria da população se posicionava contrária à idéia da atual administração, alegando, em síntese, que existem questões mais urgentes em nossa cidade a serem objeto da atenção de nossos administradores, preferi aguardar para ver como iriam se desenrolar os ajustes com a escola de samba para somente depois me manifestar sobre a matéria. Hoje posso dizer que estou decepcionado. Onde está, no tão esperado samba-enredo, a referência a Poços de Caldas, senão na citação vazia e quase perdida do nome de nossa cidade.
          Não sou, como já me referi anteriormente, um "expert" em matéria de carnaval, muito menos em samba-enredo, mas o que será apresentado na Marquês de Sapucaí em nada individualiza ou homenageia a nossa cidade.
          O samba-enredo é absolutamente genérico, vago, insípido, tedioso, monótono e poderia adequar-se a qualquer município que possua, como atrativo turístico natural, as sua águas. Substitua-se, no samba-enredo, a palavra “Poços de Caldas” por Caxambu, Cambuquira, São Lourenço, Caldas Novas ou qualquer outra que deseje, que o restante poderá manter-se inalterado.
          Alguém investido de um mínimo de seriedade e capacidade de análise pode afirmar que Poços de Caldas será “tema de samba-enredo”? Onde está a nossa história, os áureos tempos dos cassinos onde apresentaram se Carmem Miranda, Carlos Galhardo e Orlando Silva e outros, além das maiores orquestras musicais do mundo? E nossas belezas naturais e arquitetônicas? O Cassino da Urca? O Pálace Hotel com sua suíte presidencial que tantas vezes abrigou o Presidente Getúlio Vargas? O verde de nossas matas e tantas outras maravilhas de nossa cidade?
          Se quisessem referir-se somente à temática das águas, poderiam ter falado do Véu das Noivas, da Cascata das Antas, do Balneário Mário Mourão, das Thermas Antônio Carlos e de nossas raríssimas águas sulfurosas e termais, da Fonte Sinhazinha, mas, ao contrário, nada disso foi objeto de qualquer referência do samba-enredo.
          Sinto-me, como toda a população, traído pela propaganda enganosa de nossos administradores que em todos os momentos afirmaram que Poços de Caldas seria “homenageada” como tema de samba-enredo. Como diriam os antigos: “conversa pra boi dormir”.
          Pode até ser que os milhares de reais doados à Escola de Samba Beija-Flor possam ser compensados pela repetição vazia do nome de nossa cidade na avenida, não quero adentrar nesta análise, mas certamente o orgulho que os poçoscaldenses esperavam sentir ao ver e ouvir a história de nossa cidade sendo apresentada na passarela do samba foi completamente substituído pela decepção daqueles que, mais uma vez, foram alvos da propaganda enganosa da administração municipal, lamentavelmente, todos nós.

Marcílio de Sousa Magalhães
O autor é advogado e ex-secretário municipal de Administração da cidade de Poços de Caldas
(Publicado originalmente no Jornal da Cidade - Poços de Caldas em 09/02/2006)

 

Artigos