Um Príncipe Negro no Rio Antigo |
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Nascido no sertão da Bahia, mais precisamente, na Vila de Lençóis, por volta de 1845, Cândido da Fonseca Galvão , futuro Dom Obá II d'África tem sua vida reconstruída, com engenho e arte , por Eduardo Silva, chefe do Setor de História da Fundação Casa de Rui Barbosa , no Rio de Janeiro. O livro, Dom Obá II D'África, O Príncipe do Povo. Vida , tempo e pensamento de um homem livre de cor, acompanha de perto , este filho de africano forro , brasileiro de primeira geração nas suas idas e vindas pelo vasto território nacional. "Ao fazer uma investigação histórica sobre a vida, o tempo e o pensamento dessa figura ;hoje esquecida, Eduardo Silva recupera aspectos importantes do cotidiano, da ambiência cultural e do universo simbólico predominantes entre escravos libertos e homens de cor do Brasil do século XIX". Entre 1865 e 1869 , quase 3.000 escravos foram alforriados para "assentar praça" na guerra. Galvão não fazia parte deste grupo, mas de um grupo minoritário, o dos voluntários de fato. Tanto para os primeiros , como para os segundos o alistamento abria inúmeras possibilidades de ascender socialmente. Assim, para o Príncipe, a conquista da cidadania teve início concreto com o alistamento militar e prosseguiu com o processo de abolição progressiva. O baiano Galvão terminou a guerra do Paraguai como oficial honorário do Exército brasileiro, por bravura. Passou a morar no Rio de Janeiro e, gradualmente, marcou presença na sociedade da época. Para alguns era meio louco , um desses personagens típicos que cada cidade costuma ter; para outros, escravos , libertos e homens livres de cor era um príncipe real. "Dom Obá II d'África reinava não simplesmente pela tradição , mas através de poderes extraordinários que lhe eram atribuídos por sua larga "tribo de vassalos". Tais poderes incluíam, certamente, seus legados reais de Abiodun, seus feitos e medalhas de guerra, seu relacionamento com D. Pedro II e, acima de tudo talvez , sua capacidade , ou axé, para a ação política dentro dos quadros reinantes , para a real politik de então". (p.126) Silva, ao acompanhar os movimentos desse príncipe afro-brasileiro que perambulava pelas ruas do Rio Antigo, segue de perto a própria história político-social do país. História, que como poucas, soube esconder do público personagens negros de importância . Dom Obá II d'África nos seus escritos , fortemente rebuscados, defendia idéias como a de uma sociedade alternativa, a igualdade fundamental do gênero humano. Chegou a propor a abolição total já em 1882. A discriminação racial era para ele um completo absurdo, daí atacar energicamente o racismo. Ler a história de Dom Obá II D'África é ter em mãos um livro editado com extremo cuidado, é conhecer um personagem fascinante do Brasil do século XIX e inferir que o "avesso" de nossa história tem muito a nos revelar e ensinar. |
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Ênio Brito |
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