A Trajetória

 

          A partir de 1932, a Portela iniciou uma vitoriosa trajetória que a tornaria em pouco tempo a escola com o maior número de títulos do carnaval carioca. Se hoje as escolas de samba fazem carros gigantescos e luxuosos, é porque em 1935 a Portela desfilou com um rústico Globo terrestre giratório no enredo "O samba dominando o mundo". Era a primeira alegoria de uma escola de samba.
          Os primeiros desfiles da escola foram marcados pelas inovações de Paulo e seus companheiros. Foi através da Portela que o espelho e outros materiais passaram a fazer parte do mundo do samba. Foi a Portela quem desfilou pela primeira vez com uma comissão de frente uniformizada. Foi a Portela quem organizou os primeiros desfiles colocando uma corda para separar a platéia dos componentes.
          Certa vez, ao observar um guarda de trânsito exercendo sua função, mestre Betinho, o homem que criou o estilo da bateria da Portela, resolveu utilizar o apito para facilitar a comunicação entre eles e seus primeiros ritimistas. Nunca mais uma bateria seria a mesma coisa. Betinho também introduziu a caixa-surda e o reco-reco nas escolas de samba.
          Já na década de 30, a Portela participaria de dois filmes, recebeu professores estrangeiros, ministros de estados e seus sambistas eram exaltados nas principais rádios da cidade. Paulo da Portela despontava como um dos principais interlocutores entre os sambistas do morro e do subúrbio com as classes que insistiam em ignorar o samba. Sua imagem era a prova de que, apesar das inúmeras adversidades e da incompreensão da sociedade, o negro e o pobre eram dignos e capazes. Neste período, nosso fundador ainda foi eleito cidadão-samba e integrou a primeira comitiva de sambistas brasileiros ao exterior.
          Após o carnaval de 1935, a vai como pode encontrou uma inesperada dificuldade para renovar sua licença. O delegado Dulcídio Gonçalves se negava a renová-la alegando que o nome não era adequado para uma agremiação nos moldes que o estado exigia. Sugeriu, então, que a escola passasse a se chamar Portela, numa alusão a estrada do Portela, onde ficava a sede da escola. Mesmo tendo encontrado resistência em Paulo e seus companheiros, a idéia acabou sendo aceita por todos. Assim, depois de vários nomes ao longo de 12 anos, nossa escola passou a ser finalmente conhecida como Grêmio Recreativo Escola de Samba Portela.
          Em 1939,  Paulo seria responsável pelo primeiro samba-enredo da história: "Teste ao samba". Foi a primeira vez também que toda escola estava fantasiada de acordo com o enredo. Mesmo respeitado e admirado por todos, Paulo afastou-se de sua escola de coração em 1941 após desentendimentos com o valentão Manuel BamBamBam minutos antes do início do desfile. Vindo de São Paulo com o Conjunto Carioca, composto por ele, Cartola e o antigo desafeto de muitos  Heitor dos Prazeres, Paulo e seus amigos foram impedidos de desfilar devido à roupa preta habitual do grupo. Alegando uma determinação do próprio Paulo para que se desfila-se apenas de azul, o que é confirmado por todos que presenciaram o fato, BamBamBam impediu que os três desfilassem pela Portela. O "valentão" ainda abriria uma exceção para Paulo, mas se manteve intransigente quanto a Cartola e Heitor. Paulo acabaria se afastando de sua escola e não mais voltaria até sua morte, em 1949. Hoje, entretanto, acredita-se que o verdadeiro motivo da briga foi o antigo desentendimento de Heitor com Rufino e o próprio Manuel BamBamBam. A Portela venceria o desfile de 1941, mais do que isso, venceria também os desfiles de 1942,43,44,45,46 e 47, os chamados "sete anos de glória", uma seqüência de conquistas que nem a guerra foi capaz de interromper,  mas sem a importante figura de Paulo Benjamim de Oliveira.
          Mesmo afastado e brigado com a escola, Paulo foi o anfitrião de Walt Disney quando o famoso empresário americano, em visita ao Brasil, visitou num dia famoso a quadra da Portela. Era 1941, começava a política de boa vizinhança dos Estados Unidos com os demais países da América latina, e Walt Disney, acompanhado de seu desenhista, queria conhecer a verdadeira cultura carioca. O Show da Portela ao ilustre visitante americano foi inesquecível. Anos mais tarde, surgia o personagem Zé Carioca, muito provavelmente inspirado em algum sambista de Oswaldo Cruz. Quem sabe, essa Zé Carioca não teve como inspiração o próprio Paulo da Portela?
          Em 1948, a seqüência de vitórias portelenses foi interrompida por uma nova força que surgia no mundo do samba: O Império Serrano. Descontentamentos com o resultado provocaram uma série de desentendimentos entre os dirigentes geraram uma cisão que motivou o surgimento de uma outra liga. Portela e Mangueira, as duas principais forças do nosso carnaval, passaram a desfilar em uma liga distinta, enquanto o Império Serrano se manteve fiel a a  antiga Federação Brasileira das Escolas de Samba. Com o samba dividido, a Portela venceria o desfile de 1951, e o Império Serrano os anos de 49,50 e 51. Este fato marcou uma época em que o clima entre as duas escolas de Madureira não era nada amistoso, propiciando, inclusive, uma antes impossível aproximação entre Portela e Mangueira.
          A paz, marcada para 1952, foi atrapalhada por um forte temporal que resultou num pedido do Império Serrano pela anulação do desfile. Mas de 1953 não passaria, a Portela se vingaria com um desfile fantástico que mereceu 10 em todos os quesitos.
          Este desfile marcou a estréia de um jovem compositor que em pouco tempo se transformaria em um dos maiores sambistas de todos os tempos: Antônio Candeia Filho, que compôs o belo "As seis datas magnas" em parceria com Altair Prego.
          Ainda na década de 50, a Portela conseguiu com grande esforço construir sua sede própria, a "Portelinha", como hoje é conhecida nossa antiga quadra na estrada do Portela. Natalino José do Nascimento, o lendário Natal da Portela, já se destacava como grande líder da família azul e branca. Muitas de nossas vitórias devemos a dedicação que Natal, o nosso Natal, sempre teve com sua querida Portela.
          A década de 50 terminou com o nosso tetra-campeonato de 1957,58,59 e 60, este último numa tumultuada apuração que acabou ocasionando um acordo em que as cinco primeiras escolas foram aclamadas campeã.
          Durante a década de 60, apenas a Portela conseguia rivalizar com as inovações trazidas pelos novos artistas do Salgueiro. O grupo de encasacados tocando violinos em 1964, "O segundo casamento de D. Pedro", foi a resposta que a Portela encontrou para a ostentação demonstrada pelo Salgueiro em Chica da Silva, no ano anterior. Destaca-se neste período o belo samba-enredo de Paulinho da Viola em 1966, "memórias de um sargento de milícias", o único de Paulinho vencedor em nossa escola. No fim, contabilizamos nesta década os títulos de 1962,64 e 66.
          A nova glória de nossa escola  seria no desfile de 1970, "lendas e mistérios da Amazônia". Desde o aquecimento, quando o recém lançado "foi um rio que passou em minha vida" emocionou a todos, sabia-se que seria um desfile inesquecível. No fim o resultado não poderia ser diferente. Em 1972, o presidente Carlos Teixeira Martins, o Carlinhos Maracanã, assume a presidência da escola e empresta grande quantia de dinheiro para a compra da nova sede da escola, o "Portelão", um espaço digno e do tamanho das tradições portelenses. Desentendimentos quanto a escolha do samba de 1974 motivaram o afastamento de vários componentes importantes para a Portela.
          Contudo, a Portela se mantinha forte. No final da década de 80, nossa escola foi a única das chamadas escolas tradicionais que conseguia fazer frente as novas forças emergentes que surgiam: Beija-Flor, Mocidade e Imperatriz. Merece destaque neste período dois belos desfiles premiados pelo juri do Estandarte de Ouro, considerado o "Oscar do samba brasileiro": O "homem do Pacoval", 1976, e "incrível fantástico e extraordinário", 1979.
          A década de 80 começou com o título de 1980, "Hoje tem marmelada", e com o título de domingo no desfile de 1984, "contos de areia", primeiro ano do sambódromo. Em 1985, uma nova briga interna afastou alguns componentes que resolveram fundar outra escola de samba. Mesmo assim a Portela resistiu. Buscou forças em sua linda história e encantou o público com o lírico "Adelaide a pomba da paz", em 1987.
          Mesmo sem conseguir o título máximo do carnaval carioca na década de 90, a nossa Portela realizou três belos desfiles premiados com o estandarte de ouro de melhor samba: "Tributo à vaidade", 1991, "Os olhos da noite", 1998, e "Gosto que me enrosco", 1995, este último aclamado como campeão pelo público e pela crítica especializada.
          Um novo século se inicia com o ano de 2001. A nossa Portela, maior campeã da história do carnaval carioca com 21 campeonatos, continuará alçando vôos cada vez maiores em busca de novas glórias, conquistas e vitórias.

Fábio Pavão
(Publicado originalmente no site não oficial da Portela [www.gresportela.com])

 

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