Carmen Miranda

 
          Anos 20, 30. Um Rio de grande transformação, que se moderniza. Surgem as grandes avenidas. O maiô começa a ser usado. Carmen é jovem nesse tempo. Foi menina e moça muito alegre, vocação para o palco desde o colégio, cantora espontânea, que exibia, além da voz (num tempo em que havia exclusivamente o rádio), o corpo, os sapatos, a roupa, o virar dos olhos. Mesmo a atuar em rádio, era o que na época se chamava “cheia de visagem”. E muita alegria natural. Nessa época abençoada, surge uma notável geração de compositores e sambistas dos anos 20: Assis Valente, Joubert de Carvalho, Sinval Silva, Dorival Caymmi, Almirante, Braguinha, Lamartine Babo.Tantos outros.
          Em 1925, a mãe de Carmen passa a dirigir uma pensão com os seus cinco filhos. Carmem tinha 16 anos. Sua adolescência foi marcada por uma irradiante agitação, que contagiava os demais. Usava gíria, sabia ser divertida e possuía uma sensualidade peculiar. Era atraente sem ser especialmente bonita.
          Ademar Casé (avô da Regina Casé), titular do então mais importante programa de rádio da época, contava que era remador do Boqueirão do Passeio, clube na Ponta do Calabouço. Todos os dias saíam às 7:30 da manhã e faziam exercício na Baía da Guanabara. Um dia, resolveram remar até a Urca. Lá, encostaram a iole na praia e começaram a conversar. Viram aquela menina-moça, Carmen Miranda, bonita, com um corpo perfeito e um maiô ousado para a época. Ademar Casé dá um jeito de conhecê-la.
          A essa época, ela mal sabia que um ano depois estaria a cantar no Programa Casé. Carmen praticara o francês, aprendeu logo a fazer chapéus, trabalhou em várias atividades e, a essa altura, já não podia parar de cantar. Considerava importante ter uma profissão, mas sua soltura e irreverência não lhe permitiam ficar muito tempo nos empregos. O micróbio da arte já se disseminara.
          Segundo sua irmã, Aurora Miranda: “Carmen vivia a cantarolar e as colegas de trabalho sempre lhe pediam para cantar. Às vezes o patrão a pegava em flagrante, cantando, e dizia: ‘Dona Carmem, assim elas não trabalham’. E, antes que o patrão a mandasse embora, ela já saía. Além de cantar, queria ser atriz. O cinema era a febre carioca. Os filmes de Hollywood e da Europa chegavam junto com as grandes figuras de Rodolfo Valentino e outros. O cinema ocupava o sonho. Esse sonho levou Carmem a aparecer como extra na revista chamada Seleta em 1923. Talvez intuísse que viria a ser uma das maiores estrelas do Carnaval.

Artur da Távola
(Publicado originalmente no jornal O Dia em 09 de fevereiro de 2005)

 

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