Escola dá samba?
O que têm a dizer os compositores do bairro de Oswaldo Cruz e da Portela

 

         O samba é um dos ritmos mais populares da cidade do Rio de Janeiro e têm grande importância em sua identidade cultural. Durante o ano inteiro muita gente participa das produções ligadas ao “mundo do samba”. Mas o sambista compositor é que se projeta, tem a visibilidade e é símbolo deste mundo e referência cultural de significativo setor da população carioca. Saber o que ele pensa acerca da escola, como a vê e como ele se vê nela ou fora dela é uma forma de olhar a escola formal a partir de outro ângulo, permitindo que apareçam aspectos privilegiados por este olhar, possibilitando outra leitura da escola em sua relação com a clientela e sua cultura antropológica de origem.
            Em nossa pesquisa, que resultou numa dissertação de mestrado, entrevistamos 10 compositores do bairro de Oswaldo Cruz, subúrbio intimamente ligado à história do samba na cidade do Rio de Janeiro, e do Grêmio Recreativo Escola de Samba Portela, criado no mesmo bairro, também uma instituição fundamental na história do gênero.

Conceitos que dão samba

                Neste estudo, reconhecemos o caráter polissêmico do conceito de cultura e suas acepções, procurando definir o conceito com o qual trabalhamos. Partimos de uma síntese de Gilberto Velho (1994) quando diz que os homens em interação social, “participam sempre de um conjunto de crenças, valores, visões de mundo, rede de significados que definem a própria natureza humana” (p.63). A cultura, no sentido antropológico, entendida como um elemento dinâmico, em movimento, em transformação, um elemento vivo. Esta é a conceituação que orienta o presente trabalho.
         Assim, o que fica além das inúmeras concepções do termo, é a compreensão de que não existe a cultura, mas culturas. Reconhece-se, ainda, que as culturas estão em relação, havendo trocas entre elas, não existindo cultura pura, “e que o outro não é nunca absolutamente o outro e que há sempre algo de nós nos outros” (Cuche, 1999:243).
         Quando se fala em samba, remete-se à concepção de cultura popular. O uso sistemático do termo “cultura popular” na imprensa e na academia mostra a importância que tem, ainda que nesta última o conceito seja, às vezes, desconstruído, buscando negar uma “pureza” e uma “autenticidade” que lhe seria inerente e de apontar seu caráter dinâmico, de mistura e de entrecruzamento. De fato, se formos estudar qualquer fenômeno cultural que tenha como referência a população de baixa renda, de periferia das grandes cidades ou de áreas marginalizadas socialmente, o termo se impõe, mesmo que seja para uma análise crítica do seu uso.
         Monique Augras, em seu livro O Brasil do samba-enredo (1998), logo na apresentação enfrenta a questão afirmando que não gosta do nome ‘cultura popular’ (p.9), pela sugestão que parece carregar de corte, diferenciação quase natural, com a cultura ‘erudita’. Mas admite o termo ‘popular’ através da “idéia que designa exclusivamente um lugar de produção cultural” (p.10).
         Para Marilena Chaui (1996), a cultura popular não deve ser vista como uma totalidade em oposição antagônica à totalidade dominante, mas reconhecida num “conjunto disperso de práticas, representações e formas de consciência que possuem lógica própria” (p.25), onde estão presentes o conformismo, inconformismo e a resistência à cultura dominante, que é o que distingue cultura popular da cultura dominante.
         Concordando com as relativizações acima e reconhecendo a existência de várias culturas populares, utilizamos um termo que dá especificidade ao nosso estudo: a cultura do samba.

Educação e cultura(s)

         Pensar educação também no sentido mais amplo que escolarização, como forma de socialização de saberes, e cultura em seu sentido antropológico, é uma idéia que ganha corpo na pedagogia, inclusive em termos oficiais.
A uniformidade vigente no currículo, o conteúdo dos livros didáticos e a organização da escola – a  cultura escolar [1] constituída – sempre estiveram presentes  entre os fatores que pesaram no fracasso escolar. A cultura escolar, homogeneizada, desconsidera as diferenças. Assim, para Juarez Dayrell (1996:140):

Uma outra forma de compreender esses jovens que chegam à escola é apreendê-los como sujeitos sócio-culturais. [...] Trata-se de compreendê-lo [o aluno] na sua diferença, enquanto indivíduo que possui historicidade, com visões de mundo, escalas de valores, sentimentos, emoções, desejos, projetos, com lógicas de comportamentos e hábitos que lhe são próprios.

         Ou seja, são estudantes que têm uma cultura diferente. Os alunos, provenientes de bairros populares, têm a escola, muitas vezes, como um instrumento que o aliena de sua cultura, mesmo levando-se em consideração que esta não seja pura, estática, e esteja continuamente sendo cruzada por outras culturas, inclusive a cultura escolar. Gimeno Sacristán, criticando as acepções mais ou menos restritas de cultura, diz, baseado em Aronowitz e Giroux:

O desafio escolar, não fácil de ser realizado hoje em dia, está não em opor esta alta cultura à cultura antropológica de referência do aluno, mas em reconciliá-las, em fazer que cada uma delas encontre a relevância na outra. (Sacristán, 1996:41).

         Dessa maneira, a distância entre a escola e os alunos tem contribuído para que o conflito – e não apenas a tensão – entre cultura escolar e cultura “antropológica de referência do aluno” se alargue, somando-se às outras razões que produzem a evasão e o fracasso escolar. É preciso levar em conta a comunidade e o público que a constitui para se entender esta distância e pensar caminhos para um diálogo.

Podemos falar de uma cultura do samba?

         Menos do que criar um termo ou expressão, ao falarmos em cultura do samba, estamos falando sobre o samba como vários autores (Cabral, 1996; Cavalcanti, 1995; Goldwasser, 1975; Lopes, 1981; Tramonte, 1996) se referem a este gênero musical e toda a sua rede de significados, de produções, de espaços, de formas de se comportar, de hábitos, de tradições renovadas a cada ano –  algo que lhe dá uma especificidade – que são interpretados pelo termo mundo do samba. Esse termo é o que entendemos por sinônimo de cultura do samba.
         Para entendermos a cultura do samba é necessário conhecer um pouco da história do samba, sem o que só a perceberemos como expressão musical. Há uma construção de redes de significados, costumes, solidariedade, afirmação de valores, afirmação de um grupo social, de resistência cultural, política e étnica, ao mesmo tempo em que há um processo de trocas. As ambigüidades apresentadas neste processo acabam por revelar sua riqueza e complexidade.
         Mas, o que é o samba? De onde se origina? São perguntas que recebem respostas aparentemente tão óbvias do tipo “é música negra brasileira”, “o samba veio da África”, “o samba é música afro”, e por aí vai. Esta compreensão, embora não deixando de ser baseada na realidade, é aquela do senso comum e simplifica um processo rico, dinâmico e que não deve ser separado de determinados processos sociais de nossa história. A cultura do samba é formada na tensão entre o social, o econômico, o político e a herança cultural, aqui ressaltando a religião e suas práticas sincréticas.
         A mistura de ritmos e a designação geral de samba para toda e qualquer música afro-brasileira, foi superada pela organização das Escolas de Samba, que apresentavam, com singularidade, uma nova forma de tocar e cantar a música que se originara nos batuques, criando novos instrumentos e dançando de forma peculiar, ainda que resultasse de uma estrutura copiada dos Ranchos. O que interessa é que com as Escolas o samba obteve uma visibilidade e identidade, de modo a não confundir com nenhum outro ritmo: aquele era o samba. A divulgação do samba através do rádio e das gravadoras, juntamente com um processo de contribuições diversas, acabariam por ampliar as variações do samba, que continua até os dias de hoje.
         O samba pode ser considerado um dos instrumentos de penetração do afro-brasileiro [2] na sociedade branca. E nesse processo a perseguição aos sambistas foi grande.  Sérgio Cabral (1996) cita alguns depoimentos como o de Donga: ‘O fulano da polícia pegava o outro tocando violão, este sujeito estava perdido. Perdido! Pior que comunista, muito pior ...” (p.27); ou de João da Baiana: ‘A polícia perseguia a gente. Eu ia tocar pandeiro na festa da Penha e a polícia me tomava o instrumento’ (p.28).
         Como diz Sodré (1988:134), para o negro, após a abolição, “a apropriação da cidade como estrutura de encontro interétnico, criação festiva e confrontação simbólica” se intensificou, porque antes o negro tinha seu lugar – fixo e desumano, é verdade – mas depois ele não tinha lugar algum. E são as Escolas de Samba, em nossa análise, um dos mais importantes instrumentos dessa penetração.
         Para entendermos esse processo é preciso ter em conta os elementos que compõem a cultura do samba:

  • Mediação cultural – A mediação cultural é aqui entendida como a ação dos indivíduos e grupos, ou o local de realização, que efetiva uma relação de troca entre indivíduos, grupos, espaços, de culturas diferentes.
  • Identidade cultural – Uma contínua criação/recriação da identidade afro-brasileira.
  • Afirmação socialA visibilidade positiva adquirida pelos desfiles possibilitou maior inserção dos afro-brasileiros em nossa sociedade historicamente preconceituosa.
  • Memória coletiva Assim como várias manifestações populares, o samba funciona como memória de um povo.
  • SociabilidadePossibilita processos de integração social.
  • SolidariedadeÉ um elemento próprio do mundo do samba, fruto histórico das relações estabelecidas para a sobrevivência entre as camadas pobres da população.
  • Respeito aos direitos, contradições e conflitos – Há uma série de valores morais que preservam a família, a liberdade religiosa e política. No entanto, ao lado desses valores, aparecem o alto consumo de bebidas alcóolicas, as relações com a contravenção, as relações machistas, que refletem as condições materiais, históricas e culturais.
  • Tradição e renovaçãoTradição e renovação se afirmam dialeticamente.
  • Socialização de saberes – Esse é o elemento crucial da cultura do samba, sem o qual não seria possível o desenvolvimento dos outros. Por que? Porque não se trata somente da socialização e transmissão de saberes com referência à composição, instrumentalização e dança do samba, bem como organização das Escolas de Samba e eventos como o desfile na avenida, que por si só já são importantes. Trata-se, ao mesmo tempo, de socializar ethos, códigos, estratégias de sobrevivência, de resistência cultural, de afirmação de grupos sociais [3] .

O samba enredando a vida

         As histórias de vida dos compositores nos possibilitam entender como esses sujeitos ajudam a construir uma cultura musical e social que, particularmente na cidade do Rio de Janeiro, é constitutiva da sua identidade cultural e, de forma mais ampla, marca indelével da história de nosso país.
         Wilson Moreira [4] , negro [5] , nos diz: “convivo com o samba desde criança.” É assim que fala de sua relação com o samba quando freqüentava as antigas agremiações que existiam em Realengo e Padre Miguel e conta que “a música me veio aos... 12, 13 anos de idade...”.
         O compositor Monarco [6] , moreno, por sua vez, assim se expressa:

Meu envolvimento com a Portela é desde a infância. Eu morava em Nova Iguaçu ainda, tinha lá meus sete, oito anos de idade, eu já ouvia aqueles sambas... Noel Rosa... [cantarola] ‘salve Estácio/ Salgueiro, Mangueira/ Oswaldo Cruz e Matriz...’ [...] Aí de repente a minha mãe se separou do meu pai e viemos morar em Oswaldo Cruz. Ô destino!

         Mauro Diniz [7] , negro, filho mais velho de Monarco, relata:

Minha mãe era dona de casa, ela era pastora da Escola, né, ela desfilava na Portela também. O papai costumava falar que eu já freqüentava a Portela dentro da barriga da minha mãe. Eu me lembro... ele falou que eu, com 1 ano de idade, ele me botou a fantasia da Portela.

         Marcos Diniz [8] , negro, outro filho de Monarco, começou na União de Vaz Lobo, com 7, 8 anos, e a admiração pelo samba fazia o menino pobre prestar atenção, conta “...eu era garoto, eu ficava escutando, olhando para o nariz escorrendo...” Diz: “primeiro samba que eu fiz foi aos doze anos de idade, mas eu comecei a ter certeza das coisas foi com treze anos”, pois com essa idade ganhou um samba no Bloco Xodó de Oswaldo Cruz, onde participavam compositores respeitados.
         Mas se existem exemplos de composição precoce, também temos outros que não começaram tão cedo assim. Jair do Cavaquinho [9] , pardo, nascido no bairro de Oswaldo Cruz, conta: “a minha infância toda foi no Grêmio Recreativo Escola de Samba Portela. Eu, desde pequenininho, com 7 anos de idade, já fui mascote da Escola de Samba Portela.” Portanto, a viu nascer. Mas surpreende: “eu comecei a fazer samba era... foi em 1958”, ou seja, aos 36 anos de idade!
         Seu Argemiro [10] , negro, outro membro da Velha Guarda da Portela, revela: “eu comecei essa vida de compositor aos 56 anos”! Mas o contato com o samba foi desde a infância, quando o pai brigava com a sua madrasta e levava os filhos para ficarem na casa da cunhada, perto da Portela, “...então aí eu... minha prima ia sempre pra assistir ensaio, aí me levava, aí eu ficava vendo” e se apaixonou pelos instrumentos de percussão.
         Casquinha [11] , pardo, que retoma a composição de samba após um intervalo de quinze anos, quando parou de jogar futebol, aos trinta anos, sempre morou em área de samba: “... eu nasci em Anchieta, [...] sou radicado aqui em Oswaldo Cruz desde... dos dez anos.”
         Teresa Cristina [12] , negra, que viveu até os 28 anos na Vila da Penha, também teve sua relação com o samba interrompida. Na adolescência, conta,  “eu comecei a gostar de rock, porque eu via todo mundo cantando rock... jornal, televisão, era só rock...” Mas no seu caso, o território suburbano ficou marcando a presença como elemento da cultura do samba. Como ela explica, “... eu nem escolhi ser Portela, sabia? Quando eu nasci minha família já era portelense. Tinha Escola de Samba? Era a Portela. Não foi uma coisa que eu escolhi.” Aos 29 anos, casada com músico de um grupo de samba e morando no Leblon é que principiou a compor sambas.
         Outro exemplo de uma ligação mais diversificada em termos musicais que, no entanto, não afastou a influência do samba que tinha desde a infância, é o compositor Edinho Oliveira [13] , negro. Nascido numa família grande, tendo vivido no bairro de Rocha Miranda e há quase vinte anos em Oswaldo Cruz, desde cedo teve contato com as batucadas. Seus contatos, no entanto, foram ampliados e, como ele diz, trabalha “há 23 anos com música”, não se restringindo somente ao samba.
         David do Pandeiro [14] , pardo, nascido em Bento Ribeiro numa família onde vários membros eram músicos, acabou aprendendo samba em colégio interno na cidade mineira de Passa Quatro, para onde foi internado pela mãe, após separar-se do pai, como conta: “E lá em Passa Quatro, no meio da garotada lá de morro, pessoal pobre lá, aquela coisa toda, mas gente de samba, eu, que já tinha o samba no sangue, né, aí virei sambista, aprendi a tocar pandeiro, num pandeiro de lata de goiabada cascão...” Quando voltou para o Rio, acompanhava os blocos, que naquela época tinham samba de verso. Mas os contatos com outros espaços como o rádio, os shows, viagem internacional e outros tipos de música como a cubana, por exemplo, se o fizeram experimentar novos ritmos e danças, não o afastaram do samba, tanto que hoje faz parte do conjunto da Velha Guarda da Portela.
         No imaginário social, a representação do sambista como negro, malandro, pobre e morador do morro é ainda forte e reforçada pelos próprios sambistas. Monarco, referindo-se aos moradores da favela do Jacarezinho, dizia “o povo do morro”, apesar da citada favela se situar numa área plana na região da Leopoldina.
         Por que, então, essa reiteração? Porque, para os sambistas especificamente, e no imaginário social, o samba é produto dos setores mais pobres e marginalizados da população, que está no morro, na favela. Morro e favela têm a mesma identidade. Toda favela, então, é sinônimo de morro, pelas condições sócio-econômicas dos moradores, pelas privações, falta de colégio, dificuldades, discriminações e, o que parece ser uma contradição, pela alegria, solidariedade, sociabilidade e produção cultural, na qual se destaca o samba.
         Uma confirmação que podemos encontrar na origem social e experiência da maioria dos sambistas [15] , como atesta a vida de nossos entrevistados. Como diz o compositor Edinho Oliveira, de família operária, “... eu tenho uma compreensão de samba: o samba é uma cumplicidade, é de uma raça, de um segmento racial, de um segmento de classe.”
         Casquinha, criado em Oswaldo Cruz, é o único dos entrevistados que tem pai estrangeiro. “Era engenheiro elétrico, ele veio da Alemanha pra montar as torres de eletricidade aqui no tempo do bonde, [...] a minha mãe era preta, por isso que eu sou raça negra (rindo), eu sou meio claro mas eu tenho orgulho de pertencer à raça negra.”
         Como se pode notar, apesar do discurso de que não há diferença, é o negro que é tomado, subrepticiamente,  como parâmetro para se saber se alguém tem qualidades de sambista. Porém, é uma constante, na fala dos compositores a afirmação de igualdade, ou pelo menos da possibilidade, do branco, no samba, ser ou se tornar um grande sambista.
         Como surgem os compositores de samba? De onde sai a capacidade para compor aquelas canções, muitas delas mais tarde se tornando clássicos do samba e da chamada Música Popular Brasileira? “O que é o mundo do samba? Mundo do samba é o Rio de Janeiro”, diz Jair do Cavaquinho. O “meio ambiente”, como dizem Candeia e Isnard (1978), torna-se um estímulo para a produção do sambista. Podemos mesmo dizer que é o “caldo de cultura” que ajuda formar grandes compositores. Mesmo aqueles que não nasceram neste “meio”, mas que amam e convivem num ambiente de samba, sofrem a influência do que chamamos cultura do samba, como definimos anteriormente.
         Com efeito, assim nos revela Mauro Diniz, filho de compositor e de pastora da Portela:

Eu comecei a fazer samba quase sem perceber, na realidade, né. Quando eu era pequeno eu ouvia muito o papai e... [...] uma vez, sem querer – a gente tinha um bloco lá em Oswaldo Cruz, na rua Cananéia, o nome do bloco era Bloco da Alegria – eu tinha mais ou menos 8 anos... eu fiz uma paródia de um... samba enredo com a melodia de um samba que o papai tinha, coincidentemente, né, aquilo veio muito espontâneo, então eu comecei assim, eu fazia e tinha vergonha de mostrar, escrevia algumas coisas, depois eu comecei a ter coragem, as pessoas começaram a puxar por mim, principalmente o papai, né, eu comecei a mostrar e a coisa surgiu naturalmente.

         Note-se que a interpretação do sambista é de que esse fenômeno acontece “sem querer”, “muito espontâneo”, e não como uma produção da cultura. Ressalte-se também, o incentivo de pessoas da família, de amigos, de vizinhos, que constitui-se parte do processo cultural que produz compositores de samba.
         A história de Jair do Cavaquinho é intimamente ligada à Portela. Quando pequeno, conta, “a minha mãe sempre me levava pros ensaios, né. Foi quando fui me ambientando no negócio.” E vivendo naquele bairro, a vida do menino Jair encontrava o samba a todo momento, como narra:

...eu, pequenininho, ia comprar pão... ia comprar pão, passava ali, esquecia que ia comprar pão. Ficava olhando, apreciando... [...] Aí um dia eu fiz assim: peguei um pedaço de pau, uma tauba, botei quatro arames bem fininhos, representando as quatro corda, aí o que eu via ele fazer com as posição, aí eu fazia também no meu “cavaquinho”, porque eu não tinha dinheiro pra comprar um cavaquinho, né. [...] Eu sei que, não sei se foi a força de vontade, eu sei que eu... em pouco tempo eu peguei...

         Quando perguntado sobre o que a Portela lhe deu, Argemiro Patrocínio de pronto respondeu: “trouxe o que eu sou hoje. Eu não sou um camarada marginalizado.” Nessa afirmação está uma das possibilidades que traz o samba para uma ampla camada da população carioca. De fato, o samba tem encarnado para muitos compositores do gênero, o sentido da vida, e retirando ou evitando que o caos social da maioria da população de baixa renda e das comunidades das periferias urbanas, econômicas ou sociais, se abata sobre os indivíduos, arrastando-os para a marginalidade ou contribuindo para a baixa estima. Outro aspecto, não menos importante, está na construção da identidade social e cultural que o samba ajuda a afirmar para parcela significativa da cidade do Rio de Janeiro.
         Diante das falas, percebe-se a íntima ligação dos sambistas com a cultura do samba ao longo de suas vidas. Uma ligação que é um processo de afirmação não só de indivíduos, mas de grupos sociais, que vêem no samba uma identificação, uma forma de viver, um produto da sua cultura, de valorização do seu espaço geográfico e social, de elevação da auto-estima. Como se vê, a relação com o samba é a relação com a vida.

Escola dá samba?

         Como vimos, o compositor se forma num meio ambiente que chamamos de cultura do samba. É aí que ele tem seu aprendizado como compositor. Reconhecendo a impossibilidade da educação formal, ou seja, o colégio [16] , educar para tudo e educar em todos os aspectos que a cultura alcança, colocam-se algumas questões: como os sambistas vêem o colégio em sua formação de compositor? Que papel teve o colégio em suas vidas? Que relações podemos estabelecer entre o colégio e a cultura do samba? A partir das falas dos sambistas, procuramos pensar as relações entre o colégio e cultura.
         O samba é “uma dádiva de Deus”?
         Essa é uma frase comum, usada na afirmativa entre os sambistas, quando falam do fato de terem se tornado compositores, apesar da relação estabelecida por eles com a cultura do samba desde tenra idade. Edinho Oliveira explica: “... eu continuo achando que o samba é uma dádiva de Deus.” No entanto, não defende a idéia de se valorizar a condição de não alfabetizado e entende que a leitura é importante.
         Para Monarco, nem mesmo as Escolas de Samba ensinam a compor: “tem pra aprender sambar, tudo, mas compor, eu acho que é uma coisa que já vem... acho que é uma dádiva divina que Deus dá...”.
         O que pudemos perceber através das falas dos compositores é que, apesar da importância do fator que chamam de “dom”, “hereditariedade” ou “dádiva divina”, a inserção na cultura do samba também é crucial. Ali eles obtêm os conhecimentos que se tornam fundamentais.
         Ao mesmo tempo, pudemos perceber uma menção constante à “ajuda” do conhecimento obtido através da escolarização, e uma certa importância desses conhecimentos na elaboração dos sambas. Ou seja, se de um lado, o “dom”, a cultura do samba, são os ingrediente fundamentais para o sambista, não se apresentou uma visão de negação ou desprezo da formação escolar, mas se considerou como um elemento que pode ajudar a fazer samba.
         O papel do colégio na vida dos sambistas sempre foi minimizado na análise dos próprios compositores e também na imprensa especializada, ajudando a formar uma representação, ou seja, uma imagem e uma idéia de como é a relação entre compositores e o colégio: nenhuma. Se esta está ancorada numa realidade, não se deve universalizá-la e o papel do colégio não é tão irrelevante assim, como procuraremos demonstrar.
         Jair do Cavaquinho foi sintético ao falar de sua relação com o colégio e demonstrou um certo incômodo com a questão. Ao relatar que estudou pouco e que o pouco que sabia vinha do berço e da força de vontade, estava adiantando sua visão de que o colégio nenhuma influência tinha em sua formação de sambista.
         Mas para “seu” Jair o samba “ensina muita coisa”. Além de ritmo, canto e dança, “o samba dá desenvolvimento [bota os dois dedos indicadores de cada lado da fronte]! Desenvolvimento!” E explica que não adianta só ler e escrever a letra, porque tem a música. Ou seja, tudo isso exige esforço de raciocínio e um processo autodidata.
         Edinho Oliveira, criado em Rocha Miranda, sempre ligado ao samba, mesmo enfrentando as dificuldades da vida de família pobre, como ele diz, “cheguei a me  engraçar, digo até assim, engraçar no nível superior pra fazer engenharia, depois eu vi que não era... compatível à minha realidade...”
         Ele reafirma ainda a importância do estudo e coloca inclusive sua posição com respeito ao tipo de ensino que se tem em nossos colégios: “... quando estudamos, nós abrimos claros em nossa mente, em nossa visão, em nossa forma de pensar e perceber, porque no ensino básico hoje no Brasil, mesmo sendo com a cara... é a cara e o molde do ensino europeu, é ensino”. Para ele é importante ter um ponto de partida e daí desenvolver um autodidatismo. Contudo, não deixa de fazer a crítica ao que falta à nossa cultura escolar: “Cadê a cultura do índio? O que é que temos de informação da escola, no ensino básico sobre o índio? Tacape, pau pesado; índio de pele avermelhada, cabelos lisos, coisa e tal e acabou, que o índio come peixe. Não, o índio tem muito mais contribuição...”
         De acordo com o depoimento de Argemiro do Patrocínio, ele é um caso sui generis de evasão escolar, pois saiu do colégio porque não queria usar calça curta, na época obrigatória para crianças e adolescentes. Mas entende que sua escolaridade foi suficiente, como relata:

...estudei mucado, primário, né, mas naquele tempo o primário era um primário, né! Também só fiz até... até o quinto ano só. Aí não quis mais porque... já... quinze anos, já tava com mais ou menos com quin... catorze, quinze anos, aí digo, ah, não vou andar mais de calça curta [...] Eu, um negão já grande, de calça curta... eu, hein!

         Observemos que sua análise é de que foi uma boa escolaridade, porque o primário daquele tempo era o primário, num enaltecimento muito comum ao colégio de ontem e crítica ao colégio de hoje. Assinalamos ainda que ele estudou em colégio público. Embora começasse a fazer sambas somente aos 56 anos, acredita que tem algo a ver com os tempos colegiais: “Ah, veio aparecer... é conseqüência, né, rapaz, é como eu te falei... o início... eu sempre gostava de... no colégio, eu sempre gostava de fazer verso, poesia, então vem negócio de namorada, né, garoto... namorar...”
         Casquinha é mais um daqueles sambistas que sua permanência no colégio foi obstaculizada pela desestruturação familiar e pelas condições materiais de sobrevivência. De qualquer maneira, acha que o colégio teve importância porque “... eu cheguei a fazer concurso e passar com aquele pouco que eu estudei [...] Também o concurso era uma dissertação, quatro operações, um ditado, tudo isso, eu passei...”. Mas é no samba que ele acaba mostrando a importância dos estudos: “... por exemplo, hoje o camarada que tenha pouca instrução ou quase nenhuma, é difícil ele fazer uma letra pro samba-enredo. Ele faz a letra pro samba-enredo, mas ele sempre ele... tem que recorrer a outro pra pedir, tá entendendo, a orientação mais assim...”
         Ou seja, o conhecimento escolar está cada vez mais presente no samba. O que significa ampliar os conhecimentos já desenvolvidos pela cultura do samba pois, como diz Casquinha, “... o samba ilustra a pessoa, o samba ensina muita coisa, depois a gente aprende, aqui dentro [da Portela] mesmo a gente aprende, não é, no desenvolver da... do tempo e tal, e daí vai aprendendo alguma coisa, bastante coisa, né”.
         De sua passagem pelo colégio interno em Passa Quatro, Minas Gerais, David do Pandeiro relata: “Lá no... o estudo de lá, os estudos de lá em Passa Quatro são muito avançados nesses estudos em Minas... Caxambu, Viçosa... Os estudos lá são muito avançados e você tem que aprender mesmo, né, porque se não aprender, já viu, né, é castigo, etc etc. Não tem como fugir de lá”.  Mas do internato em Quintino, para onde foi transferido, ele conta:

Em Quintino eu me lembro, por exemplo, eu me perdi dentro da escola Quinze, no meio da garotada lá, juntei com aqueles moleques safados lá e fiquei um aluno terrível, um aluno terrível, revoltado com a situação e um dia eu encontrei um professor que ele me botou, não me bateu nem me botou de castigo nem nada, ele sentou comigo e começou conversar comigo baixinho, suavemente, daqui a pouco chorava eu, chorava ele. Aí ele... mudou a minha vida, passei a ser o primeiro aluno em caligrafia, fui o primeiro aluno do.. da 5ª série. José Vicente de Souza. Esse professor que mudou não só a mim como meus amigos também.

         Viu-se, pelas palavras dos compositores, que o recurso a bibliotecas, à leitura, demonstra por um lado um conhecimento obtido através da cultura escolar e, por outro lado, o auxílio de livros – representação e concretização de escolarização – significa que não é somente a inspiração, a “dádiva divina” e o meio cultural que compõem os elementos da produção musical dos sambistas. Mais do que isso, os depoimentos colhidos apontam uma tendência de que os compositores mais jovens ou são todos escolarizados ou apresentam um grau de escolarização maior do que os primeiros sambistas. Quase todos eles tiveram sua experiência escolar abortada por razões econômicas e sociais, acrescentadas por tragédias familiares, mas todos os compositores que têm filhos, encaminharam sua prole para os estudos, alcançando um grau de escolaridade bem maior que o dos pais, o que comprova a importância por eles dada à escolarização.

À guisa de conclusão: qual o enredo para a escola [17] ?

         O sentido desse trabalho é discutir as relações entre escola e cultura, no caso, a cultura do samba, que consideramos uma das culturas antropológicas de origem de parcela significativa dos estudantes cariocas, buscando verificar como ela se dá, ou mesmo se esta relação existe a partir das histórias de vida dos compositores. Em nosso estudo procuramos observar a relação dos compositores de samba com o mundo e que papel teve a escolarização em suas vidas.
         Nesta relação entre a cultura escolar e sambistas, vamos encontrar no samba-enredo uma relação que nos revelou evidente. A composição de um samba-enredo não é tarefa fácil. Além da inspiração para compor uma bela melodia com bons versos, o compositor ou, o que é mais comum, os compositores, têm de dar conta dos aspectos do enredo em seus versos para que cumpra o papel de conseguir os pontos máximos em seu quesito. Dessa forma, para dar conta do recado, os sambistas são obrigados a pesquisar em jornais e livros, freqüentar bibliotecas e, quem não sabe ler, procurar alguém que o ajude, conforme ficou explícito nos depoimentos dos entrevistados.
         A composição de alguns sambas de exaltação neste período inicial, que fazem parte de uma estratégia de legitimação e busca de reconhecimento dos sambistas, levavam ao uso de um conhecimento da história oficial. Um processo que tem uma exigência para além da memória oral e uma aproximação com a cultura escolar. Não é de se espantar, portanto, que o enfoque das letras dos sambas apresentados nos desfiles, mesmo antes do aparecimento do samba-enredo [18] , assim como os sambas que mais tarde passaram a se caracterizar como de enredo, apresentassem um Brasil oficial, com os heróis oficiais, com uma história que constava nos manuais escolares. Foram esses manuais [19] as fontes principais para a elaboração das letras que exaltavam figuras da elite brasileira e fatos históricos que expressavam realizações da mesma elite. Ao mesmo tempo omitia, ou apresentava como versão contrária aos interesses nacionais, outros fatos históricos em que os setores populares agiram na defesa de seus interesses e que hoje são vistos de maneira muito diversa.
         Podemos apontar a marca da escolarização, mesmo que indireta, na produção daqueles sambas. Uma marca característica da escola tradicional que reproduz enfoques históricos não críticos. E com a ampliação da importância das Escolas de Samba e dos desfiles, surge a figura do carnavalesco, que vai aumentar essa necessidade da relação com a cultura escolar. É o carnavalesco, ou a comissão sob sua orientação, que elabora a sinopse do enredo entregue aos sambistas para orientar a composição do samba-enredo.
         Mas existem vários sambas-enredo que fugiram da mera glorificação das elites, buscando mostrar os setores populares como sujeitos históricos e referindo-se a fatos, personagens e cultura ligados à sua própria história [20] , que por sua vez mostram-se também como fruto de um processo de escolarização. Porém o que queremos afirmar é que a escola formal foi o principal agente de reprodução da história oficial [21] , neste aspecto deixando de contribuir para uma visão mais crítica de nossa história e nossa sociedade na cultura do samba.
         Contudo, a menção de alguns sambistas mais velhos sobre uma superioridade do colégio público “antigo” não é um fator desprezível para analisarmos a potencialização que os compositores de samba fizeram de seus poucos anos de estudos. Ainda que tenhamos uma visão crítica sobre os métodos e processos de ensino do colégio “antigo”, deve-se reconhecer que havia uma determinada apropriação de saber, que proporcionou aos compositores de samba um melhor aproveitamento de sua criatividade. Nesta compreensão podemos perceber que os sambistas fizeram bom uso dos conhecimentos adquiridos, não só para passar em concursos públicos, conseguir empregos com melhor status, mas também compor sambas de rimas mais ricas e contribuir para seu sucesso artístico.
         A potencialização que a cultura do samba permite não é apenas de alguns indivíduos isolados, mas um fenômeno massivo, daí a sua importância para a escola formal. Queremos chamar atenção é para os aspectos simbólicos, que perpassam o mundo do samba para além da Escola de Samba, educando, formando, produzindo uma cultura fundamental para a potencialização do aluno, não observada pela escola formal, que aliena, num certo sentido, a criança e o jovem oriundo desta cultura. O que contribui, deste modo, para uma situação duplamente perversa e negativa para a criança/jovem, pois não trabalha sua auto-estima em relação ao seu pertencimento cultural e não lhe dá instrumentos para desenvolver o seu “capital cultural”, muitas vezes próprio da relação familiar e não só da comunidade ou vizinhança.
         Portanto, se observarmos as possibilidades que a escola tem para potencializar o saber de seus estudantes, podemos esperar que a relação entre a cultura escolar e a cultura do samba seja profícua, produzindo outra coisa que não a evasão escolar, ainda que reconheçamos que este grave problema repouse em várias questões. É preciso dar mais atenção ao que diz Jair do Cavaquinho ao afirmar, categórico, botando os dois dedos indicadores na fronte: “o samba dá desenvolvimento! Desenvolvimento!”
         Se os sambistas não aprenderam samba na escola, isto não significa que ela não contribuiu para o desenvolvimento das suas qualidades de compositor. Assim, os compositores têm aproveitado o pouco que a cultura escolar lhes deu. Podemos dizer que a cultura escolar tem mesmo uma contribuição, ainda que fora da intencionalidade de um projeto pedagógico. Mas certamente a escola pode contribuir muito mais para que as potencialidades de muitos futuros compositores sejam ampliadas. Se isso se der, o samba e a sociedade agradecem.

Referências bibliográficas:

  • AUGRAS, Monique. O Brasil do Samba-enredo. RJ: Ed. FGV, 1998.
  • CABRAL, Sérgio. As Escolas de Samba do Rio de Janeiro. RJ: Lumiar Ed., 1996.
  • CANDEIA & ISNARD. Escola de Samba: árvore que esqueceu a raiz. Rio de Janeiro: Lidador/SEEC, 1978.
  • CAVALCANTI, Maria Laura Viveiros de Castro. Carnaval carioca: bastidores do desfile. 2ª ed. RJ: Funarte, 1995.
  • CHAUI, Marilena. Conformismo e Resistência – aspectos da cultura popular no Brasil. 6a reimpressão. SP: Ed. Brasiliense, 1996.
  • CUCHE, Denys. A noção de cultura nas ciências sociais. Bauru-SP: EDUSC, 1999.
  • DAYRELL, Juarez. A escola como espaço sócio-cultural. In: DAYRELL, Juarez (org.). Múltiplos Olhares sobre Educação e Cultura. Belo Horizonte: UFMG, 1996.
  • FORQUIN, Jean-Claude. Escola e cultura. As bases sociais e epistemológicas do conhecimento escolar. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.
  • FRANCISCO, Dalmir. Negro, etnia, cultura e democracia. Revista do Patrimônio. IPHAN, n. 25, p. 185-198, 1997.
  • GOLDWASSER, Maria Julia.  O palácio do samba – estudo antropológico da Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira. RJ: Zahar Ed., 1975.
  • LOPES, Nei. O samba, na realidade... A utopia da ascensão social do sambista. RJ: Codecri, 1981.
  • SACRISTÁN, J. Gimeno. Escolarização e Cultura: a dupla determinação. In: SILVA, Luiz Heron da et alli. Novos Mapas Culturais, Novas Perspectivas Educacionais. Porto Alegre: Sulina, 1996.
  • SODRÉ, Muniz. O terreiro e a cidade: a forma social negro-brasileira. Petrópolis: Vozes, 1988.
  • TINHORÃO, José Ramos. Música Popular: um tema em debate. 2a ed. RJ: JCM, s.d.
  • TRAMONTE, Cristiana. O samba conquista passagem: as estratégias e a ação educativa das escolas de samba de Florianópolis. Florianópolis: Cristiana Tramonte, 1996.
  • VELHO, Gilberto. Projeto e metamorfose – Antropologia das sociedades complexas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1994.

Notas:

[1] Para um entendimento do conceito de cultura escolar aqui empregado, ver Jean-Claude FORQUIN, Escola e Cultura – as bases sociais e epistemológicas do conhecimento escolar, p.167.

[2] Utilizamos aqui o conceito de afro-brasileiro, tal como o faz Dalmir FRANCISCO (1997:185).

[3] Ver Cristiana TRAMONTE, O samba conquista passagem: as estratégias e a ação educativa das escolas de samba de Florianópolis, especialmente o capítulo A pedagogia das Escolas de Samba de Florianópolis, p. 209-269.

[4] Wilson Moreira Serra, nascido em 1936, mora atualmente nas imediações da Praça da Bandeira. É autor de vários sucessos, entre eles Mel e mamão com açúcar, e com Nei Lopes, Goiabada cascão, Coisa da antiga, Senhora liberdade, Gostoso veneno, Fidelidade partidária, e com Candeia, Não tem veneno, entre outros. Entrevista realizada em 05/06/1999.

[5] A cor apontada dos entrevistados é atribuída pelos próprios sambistas.

[6] Hildemar Diniz, o Monarco, nasceu em 1933, é membro do conjunto da Velha Guarda da Portela e mora na favela do Jacarezinho. Entre seus sucessos estão Coração em desalinho e Vai vadiar. Depoimento colhido em 20/06/1999.

[7] José Mauro Diniz nasceu em 1952 e sempre morou em Oswaldo Cruz. Suas músicas mais conhecidas são Depois de Madureira e Malandro também chora. A entrevista foi realizada em 07/07/1999.

[8] Marcos Antônio Diniz nasceu em 1965, mora em Cascadura. Tem entre suas músicas conhecidas Parabólica (c/ Barberinho do Jacarezinho e Luiz Grande) e Conflito (c/ Barberinho do Jacarezinho). Depoimento tomado em 17/08/1999.

[9] Jair de Araújo Costa nasceu em 1922, mora em Parada de Lucas. Tem entre seus sucessos Meu barracão de zinco, e com Nelson Cavaquinho, Eu e as flores. Concedeu a entrevista em 11/06/1999.

[10] Argemiro Patrocínio nasceu em 1923 e atualmente vive em São João de Meriti. De sua autoria são A chuva cai e Gorjear da passarada, ambas em parceria com Casquinha. Entrevista concedida em 12.09.1999.

[11] Otto Enrique Trepte, o Casquinha, nasceu em 1922 e mora na divisa  dos bairros Oswaldo Cruz e Rocha Miranda. Entre seus sucessos encontra-se, com Paulinho da Viola, Recado e, com Candeia, O ideal é competir. A gravação do depoimento foi realizada em 06/10/1999.

[12] Teresa Cristina Macedo Gomes nasceu em 1968 e atualmente mora no Leblon. Ainda não tem disco ou músicas gravadas. Entre as músicas executadas pela cantora e compositora que já chamam atenção estão Candieiro e Cafofo da Surica. A entrevista foi concedida em 28.05.1999.

[13] Edson José Alfredo de Oliveira nasceu em 1956 e mora em Oswaldo Cruz. Suas músicas mais conhecidas são Geografia popular e Pra Oswaldo Cruz, ambas em parceria com Marquinho de Oswaldo Cruz. Depoimento colhido em 20.03.1999.

[14] David de Araújo nasceu em 1934 e mora em Olaria. Suas músicas mais conhecidas são Vai saudade, Os partideiros e A paz no coração (todas com Candeia). Entrevista concedida em 22.09.1999.

[15] Uma pesquisa realizada por Antonio Candeia Filho e Isnard Araújo com os sambistas da Portela na década de 1970 revelou que “98% dos entrevistados sambistas estão incluídos na classe operária” (Candeia & Isnard, 1978:74).

[16] Usamos o termo “colégio” para designar a escola formal por ser uma categoria nativa e evitar confusão com o termo Escola de Samba.

[17] Daqui em diante o termo escola será utilizado no sentido de colégio, escola formal.

[18] Ver Monique AUGRAS, O Brasil do Samba-Enredo, especialmente o tópico Do reconhecimento à autocensura, p.41-48.

[19] Cf. Antonio CANDEIA & ISNARD Araújo, Escola de Samba: árvore que esqueceu a raiz, p.31-32; Cristiana TRAMONTE, O samba conquista passagem: as estratégias e a ação educativa das escolas de samba de Florianópolis, p. 45; Maria Júlia GOLDWASSER, O palácio do samba – estudo antropológico da escola de samba Estação Primeira de Mangueira, p. 23; Maria Laura V. de C. CAVALCANTI, Carnaval Carioca: dos bastidores ao desfile, p.106/7; Monique AUGRAS, op. cit., p.81-88; Sérgio CABRAL, As Escolas de Samba do Rio de Janeiro, p. 193.

[20] Como exemplos podemos citar: Quilombo dos Palmares (Salgueiro, 1960), Ylu Ayê (Portela, 1972), Os sertões (Em Cima da Hora, 1976), A criação do mundo na tradição nagô (Beija Flor, 1978), Kizomba, Festa de Uma Raça (Vila Isabel, 1988), E verás que um filho teu não foge à luta (Império Serrano, 1996).

[21] Uma das mais sintomáticas influências da história oficial nos sambas-enredo está no desfile da Beija Flor de Nilópolis em 1975, com o enredo “O grande decênio”, cuja letra do samba-enredo exaltava os dez anos da “gloriosa”, isto é, do golpe militar de 1964. Ver também Monique AUGRAS, op. cit., p.81-88.

Augusto César de Lima
(Publicado originalmente )

 

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