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Caminhando na hora do almoço pela charmosíssima Travessa do Ouvidor, no
Centro do Rio, fui puxado pelo olhar à vitrine de uma livraria cuja atração
principal era um livro do excelente Ruy Castro. A cor da capa era meio
alaranjada, meio que derretendo a paisagem, meio de atrair o leitor. Não
bastasse isso, estampava o sugestivo título “Carnaval no Fogo”.
No prefácio, a obra descreve
com magnetizantes doses da melhor arte de escrever cenas de uma cidade
“excitante demais”, como estampada no subtítulo. No meio do fogo cruzado
entre o poder público e traficantes às vésperas do carnaval de 2003, comerciantes
de Ipanema fecharam as portas. Avessos a tudo isso, foliões “à toa na
vida” desfilaram como um rolo compressor sobre o decreto do poder paralelo
e cantaram “suas coisas de amor”. Sambam no território em guerra, restituindo
a ordem em meio à desordem carnavalesca.
Mas para que ordem se é carnaval?
Tudo bem, um carnaval no fogo, mas um carnaval... Em 2003, vivemos um
medo relativo desse tal de crime, organizado em tal maneira que não resiste
a um batuque. A folia torna-se a arma mais mortal, a alegria fere porque
contra ela qualquer contra-ataque parece um alfinete perfurando uma gelatina.
Não causa mais do que cócegas (Ó nóis aí rindo traveis...).
E assim segue esse Rio de
correntezas fortes. Um Rio que traz consigo um ranço de todo lugar e de
lugar nenhum. Um quê de Nova Iorque, Londres, Bombaim, e da Chicago dos
anos 30. Um Rio de gente que se disfarça para ser reconhecida. Que atrai
para si os holofotes do mundo em meio a um desfile de gente que não dispensa
uma passarela, seja no calçadão de Copacabana, no piscinão de Ramos ou
na Sapucaí. Um cortejo de herdeiros de Satãs, de Bornays, de Marçais,
de Rogérias, de Joões Trinta, quarenta, cem, mil vezes morrer a viver
sem carnaval!!
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