Voltando para 1922

 

            Todos devem saber que até 1922 a população brasileira imitava completamente o padrão cultural vindo da Europa, sobretudo o francês. Nada demais se lembrarmos dos mais de 300 anos de colonização. Nas ruas as pessoas usavam imensas roupas típicas de clima frio. As verdadeiras manifestações artísticas vinham da Europa. Música culta, civilizada etc.
            O que era tipicamente brasileiro era inferior. O negro, coitado, tentava sobreviver enquanto enfrentava o estigma da escravidão, as teorias racialistas e os projetos de embranquecimento da população. As manifestações culturais negras precisavam ser esquecidas. A fé combatida pelo estado positivista. Em suma, o que não era oriundo da tradição Européia era inferior e não prestava.
            Em 1922, a semana de arte moderna fez com que o Brasil olhasse para si próprio. Uma nova forma de pensar o Brasil surgia daí. O país possuía sua própria cultura e ela precisava ser descoberta. Este evento foi uma espécie de "marco inicial" para uma mudança de mentalidade no Brasil. Ela antecedeu o sucesso de vários artistas populares. Antecedeu a inclusão dos primeiros negros no futebol brasileiro, a fundação do PCB, o surgimento das primeiras escolas e outras manifestações que marcaram o início da inclusão ( ou de lutas pela inclusão) das camadas populares na cultura e no dia a dia do Brasil.
            Hoje, quase oitenta anos depois, vemos que resquícios desta época anterior a 1922 ainda estão presentes. O valores culturais tipicamente brasileiros e oriundos das classes populares ainda são relegados a um segundo plano. Para nossas elites, cultura é teatro, quadros de artistas famosos, cinema etc. O verdadeiro samba ainda é ridicularizado como se estivéssemos no final do século XIX.
            Em poucas palavras, o que eu penso é que o abismo que separa a cultura popular da cultura erudita ainda é imenso. Por isso, o samba é visto como algo inferior. Escolas de samba são consideradas pelas elites apenas espetáculo. Assim, escolas de samba de grupos inferiores são, evidentemente, apenas espetáculos inferiores e de má qualidade.
            O poder público gasta rios de dinheiro para promover o que ele considera verdadeiramente cultura. E o samba? Apenas algo exótico para atrair turista....Continuam virando as costas para o "Brasil de cá"....
            Precisamos voltar para 1922....

  Fábio Pavão
(Fábio Pavão é pesquisador de Carnaval e um dos Webmasters da Home Page da G.R.E.S. Portela)

 

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