Antônio Correia do Espírito Santo, Toco, um poeta...

 

          Lutou muito. A vida inteira. Até o último de seus dias. E foi vitorioso em todos estes. Levou a pureza de sua arte em forma de samba, encantou gerações distintas, brindou de vida, vitórias e magia uma certa estrela verde-branca. Sorriso inconfundível, franzino de corpo, mas grandioso em alma e sonhos.
          Venceu. Sem qualquer dúvida, bateu à porta dos céus e disse orgulhoso para São Pedro: "Cumpri a minha missão". Como poucos, deu asas ao nobre ofício de tornar as pessoas mais felizes com a sua poesia. Legado que enfeita a galeria de grandes obras da Mocidade Independente, mas, acima de tudo, os corações dos enamorados pierrôs e colombinas de tantos e tantos carnavais...
          Contam os amigos que, durante a internação, chegou a brigar com um dos médicos: “O senhor me deixe livre para fazer a minha arte, e eu não o atrapalharei na arte de me curar”. Pleiteava o mestre, naquela oportunidade, que os seus parceiros tivessem mais liberdade para visitá-lo, já que, mesmo no hospital, a produção do hino vitorioso da Mocidade Independente rumo ao carnaval 2007, estava a todo vapor. O doutor, claro, cedeu aos apelos do mestre.
          "Sou eu, tenho samba no pé, sou sambista..." São muitos os que se dizem sambistas. Mas poucos têm na essência tão especial talento de artista, o orgulho de ser um artesão das palavras. "Nas noites enluaradas" e estreladas, ou mesmo nas mais chuvosas, Toco foi inspiração e emoção recorrentes, singulares. Criou uma legião de seguidores.
          "A musa do poeta e a lira do compositor” convocaram o povo para entoar poemas mil sob as bênçãos do mais brasileiro dos ritmos. Do menino de pés descalços da Vintém, ao mais distante admirador da escola de Padre Miguel. Da criança ao mais experiente, dos diretores aos componentes, dos pobres aos ricos, do mocinho ao bandido.
          "Virando nas viradas desta vida", Toco ajudou a dar títulos e glórias ao seu grande amor. Esteve presente na autoria de quatro dos seis hinos campeões da Mocidade (contando aí o campeonato de 1958, “Apoteose ao Samba”, passaporte para o grupo de elite). Não quis nem saber e deixou elas, as águas, rolarem faceiras - suor nos corpos e lágrimas nas faces - “no afã de encontrar” o mais novo e doce jeito de fazer um povo inteiro delirar.
          Saudades. Sentidas sim, mas também "saudades coloridas", já que "a vida que pedi a Deus", ou melhor, que todos pedimos ao criador, este humano "poema singular" nos ajudou a proporcionar. Nos versos seus, também tão nossos, a lição final de um visionário:

"Amar, viver, sonhar, acreditar".

          Há melhor e mais verdadeira mensagem ante as loucuras da ordem mundial contemporânea?
          O mundo do samba perde um pouco de sua alma, mas ganha uma estrela que sempre haverá de interceder por ele.
          Fecham-se as cortinas, mas não se calam as palavras.
          Até para sempre.

“Então componho um poema singular
Rememorando obras célicas
Do cancioneiro popular”

Fábio Fabato

 

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