Eu odeio TV: Carnaval 2006
cobertura burocrática

 

          A cada ano que passa, menor é minha expectativa de que algo vai mudar na transmissão do desfile na Sapucaí. Este ano, não foi diferente. Pode até ser que alguém goste daquela câmera que corre a Avenida inteira, mostrando nada. O único objetivo deve ser mostrar que existe uma câmera que corre a Sapucaí inteira. Assim como não tem mais graça aqueles efeitos a la Hans Donner, quando vão repetir a imagem de algum passista.
Antes, isso fosse o pior. A parte mais deprimente é o desfile de pseudo-celebridades que vão apenas para tentar aparecer. E chamar atenção para que os repórteres entediados os entrevistem. O que foi aquela troca de alianças de Angela Bismarck? Como pode uma pessoa assim ser considerada famosa e digna de uma entrevista? Seu vocabulário é um acinte à língua portuguesa.
          É uma alegria não ter mais Lecy Brandão como comentarista. Nos carnavais anteriores, sempre que ela falava, eu tirava o som ou mudava de canal. Não há o que criticar sobre os comentaristas da Globo. São pessoas competentes e entendem de carnaval. Mas falar uma noite inteira sobre o mesmo tema gera monotonia. São 80 minutos para encher lingüiça sobre cada escola. É de uma importância atroz saber que a porta-bandeira e o mestre-sala da Caprichosos de Pilares foram durante 15 anos da Mangueira. Ou que Sandra de Sá era a única que estava com os seios tapados.
          Em contraponto aos profissionais, a Globo escolheu, a dedo, péssimos repórteres para ajudá-los na difícil tarefa de virar a noite. Não entendendo nada sobre o espetáculo, disseram besteira a noite toda, contando fatos que os espectadores estão carecas de saber, além de não calarem a boca em momentos importantes. Na hora em que a Mangueira ia entrar na Avenida, foi irritante ouvir as bobagens que diziam. Fundamental era ouvir a armação da escola, que foi emocionante. Mas, infelizmente, pouco se ouviu - os dois não deram muita chance.
          Na maior festa carioca, escolheram Márcio Gomes para a ligação entre os repórteres. Não poderia ser pior. O rapaz é duro de cadeira e não tem nenhuma descontração.
          E é claro que a Globo tem que dar cobertura à visita do par do BBB, Mariana e Carlão, cujo deslumbramento e comentários são tão óbvios quanto os de todos os Big Brothers anteriores que desfilaram.
          Para alguns repórteres, deve ter sido um achado encontrar Maradona, que continua com uma bela assessoria de imprensa. O cara faz tudo para aparecer. Até beijar mão dos passantes. Não é esse o espírito do carnaval do Rio.
          O espaço que sobrou para o contato com o público, como sempre, foi mínimo. Nas poucas e rapidíssimas entrevistas que fez, Ana Furtado saiu-se muito bem. O que não se pode dizer de Cláudia Rodrigues - uma decepção.
          Durante o desfile, que pelo tempo se torna monótono, há espaço bastante para se conversar com o público. É divertido e, às vezes, interessante. O povo gosta. Foi o caso do papo com Marcos Palmeira, Milton Nascimento, com o histérico Jorge Fernando, o elétrico Milton Cunha, carnavalesco da Viradouro, Tiago Lacerda, Danton Mello e Grazielli e Allan. Mas nada que justifique duas noites em claro.

Thomas Villena
(Publicado originalmente no Jornal do Brasil em 05 de março de 2006)

 

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