A pura cadência da Tijuca
Estudo sobre organização social através da bateria do Grêmio Recreativo Escola de Samba Unidos da Tijuca

 

Resumo:

          O trabalho procura retratar uma das formas de organização social e simbólica do ritual "Carnaval Carioca": a bateria de uma escola de samba. A análise enfoca a integração do grupo e sua autoconsciência. Pretende-se neste estudo entender melhor a teia de significados que permeiam as relações dentro da bateria e verificar como se agregam à Escola de Samba e aos demais grupos que a formam.

"A união é bonita / E a gente acredita na força do irmão..."[1]

Introdução:

          O desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro está fortemente ligado à mutação espacial da cidade, desde a organização urbana até a de seus habitantes. As escolas de samba surgem com o estabelecimento do estilo musical samba e sua aceitação nas camadas mais destacadas na escala social. No início do século XX, os desfiles tinham uma estrutura simples e bastante caracterizada pela participação de elementos ditos de “comunidade”, isto é, de um núcleo comum e pequeno. Estes desfiles começaram a despertar certo interesse por parte de jornalistas, especialmente, e de outros setores sociais. Conseqüentemente, instituiu-se a competição entre as escolas num desfile, sendo o evento patrocinado e divulgado pelos jornais. A competição entre as escolas adquiria novos propósitos e se tornava a maior atração do carnaval. O “status” da vitória dado à “comunidade” da escola, ou seja, o bairro ou região da cidade, era algo bastante almejado. (Lopes, 1992). Deste modo, as escolas passaram por um processo de padronização, com a finalidade de oficializar e consolidar uma estrutura de desfile: enredo, samba–enredo, alegorias e fantasias. (Cabral: 1996; Lopes: 2003).
          Minha entrada na Unidos da Tijuca se deve muito a afinidade que tenho com o ambiente carnavalesco. O carnaval carioca sempre me chamou atenção pelas suas formas de manifestação e por sua mobilização popular, além de sua proximidade com o cotidiano durante o ano inteiro. Diante deste meu interesse sobre o tema, fui convidado a um ensaio da escola na época em que são feitos os “cortes” de samba.[2] Assim que entrei na quadra, fiquei sabendo de um projeto que os ritmistas[3] desempenhavam para aqueles interessados em aprender a tocar instrumentos da bateria. Percebi naquele momento uma grande chance de conhecer um setor daquela escola de samba: a Bateria. Este projeto é desenvolvido por alguns ritmistas de tamborins, principalmente pelos seus diretores, e é chamado de Tamborim Sensação. Vi a necessidade de participar do projeto a fim de extrair informações e definir alguns objetivos ao estudo. Passei a freqüentar as aulas na agremiação aos sábados no turno da tarde e conheci algumas pessoas que mais tarde passaram a ser meus contatos dentro do grupo. Muitas informações adquiridas foram à base de participações em eventos como churrascos, feijoadas ou apenas conversas regadas à cerveja no clube onde a Unidos da Tijuca realiza seus ensaios.[4] Durantes os ensaios, intentava prestar atenção nas instruções gestuais dos responsáveis pela bateria, nos discursos dos diretores da escola e nos seus componentes. Gradativamente, fui descrevendo o que se passava naquele ambiente coletivo e percebendo como eu estava me integrando ao grupo e sua teia de significados, para utilizar um conceito de Geertz (2003). Os objetivos da pesquisa começavam a se definir: procurava conhecer quem eram os integrantes de uma bateria de escola de samba, no caso, a Unidos da Tijuca; quais eram suas origens dentro da sociedade; e como e por que as pessoas passam a integrar a bateria. A partir da vivência, procurei ainda conhecer um pouco da história da agremiação, sendo algumas informações extraídas de relatos de cronistas que tratam sobre o carnaval e das próprias definições que a agremiação divulga em seu portal na internet a fim de complementar o observado.

A história da Unidos da Tijuca

          Dentro da história do carnaval carioca, o bairro da Tijuca caracterizou-se como um dos núcleos urbanos onde o samba teve suas origens. Junto com a região do mangue, atual bairro do Estácio, a região do Morro da Mangueira e o subúrbio de Oswaldo Cruz e adjacências, a Tijuca, já no final do século XIX, passava por importantes transformações sociais. A ocupação dessas áreas era devido à grande atração aos trabalhadores pelo estabelecimento de fábricas. Os morros do Salgueiro, da Formiga, dos Macacos e do Borel abrigavam estes trabalhadores na Tijuca, fazendo deles importantes redutos da cultura negra no Rio de Janeiro, e do samba em particular (Lopes, 1992).
          Em 1854, uma fábrica de rapé e tabaco se estabelecia nas cercanias da atual Rua São Miguel, na Tijuca. Esta era a Fábrica Boreal. A partir deste estabelecimento e da conjuntura econômica da época, várias pessoas, em sua maioria negros livres e ex-escravos, começaram a formar núcleos habitacionais em torno das encostas tijucanas. A oferta de postos de trabalho e as oportunidades de desenvolvimento foram os principais motivos do surgimento dos morros tanto na Tijuca como no resto da cidade. E assim, grosso modo, originou-se o Morro do Borel, a célula-mater do Grêmio Recreativo Escola de Samba Unidos da Tijuca (Lopes, 2003).
          Fundado em 31 de dezembro de 1931, o G. R. E. S. Unidos da Tijuca é sediado na Rua São Miguel. O Grêmio Recreativo é a terceira escola mais antiga do Rio de Janeiro.[5] Como símbolo a escola se apropria das cores Azul-pavão e o Amarelo-ouro; e o Pavão como animal-símbolo.[6] Na origem da escola, seus componentes eram operários da Fábrica de Cigarros Souza Cruz[7], da Fábrica de Tecidos Maracanã, do Lanifício Alto da Boa Vista, da Fábrica de Tecidos Covilhã e de outras fábricas de menor porte localizadas nas proximidades da Tijuca. A agremiação foi o resultado da fusão de quatro blocos existentes nos morros do Borel, da Casa Branca e da Formiga. A Unidos da Tijuca se orgulha em dizer que mantém uma tradição de ter em seus quadros [8] pessoas de todas as classes sociais.[9]
          Além desta tradição, a Unidos da Tijuca se denomina como única representante da colônia portuguesa no carnaval carioca. A escola contabiliza que, nos últimos quinze anos, metade dos componentes e dos torcedores da escola são portugueses e descendentes de portugueses. Evidencia-se tal fato pelo grande número de comerciantes de origem lusitana. Os comerciantes da região são os principais colaboradores financeiros da escola, visto que a agremiação não conta com a figura do “Patrono”, geralmente ligado ao jogo do bicho. O presidente da escola é um português, Francisco Horta, assim como parte da diretoria. Horta é empresário estabelecido na Tijuca e preside a Unidos da Tijuca desde 1986.[10]
          A agremiação tijucana afirma em seu discurso prezar pelo fortalecimento dos traços de união com suas “comunidades”.[11] Dos 4000 componentes que desfilam pela escola, eles afirmam que 2500 pertencem às suas “comunidades”, e destes 70% têm suas fantasias doadas pela escola, e estas são fruto de um grande esforço por parte da diretoria em angariar fundos que possibilitem a doação das mesmas. Para eles, a união de povos é uma característica especial da Unidos da Tijuca, que faz com que os brasileiros e portugueses se misturem na Escola sem distinção de cor, nacionalidade, credo ou religião.

Iniciando a observação participante

          Para alcançar os objetivos do trabalho, contei com a ajuda de uma ritmista do instrumento chocalho da Bateria da Unidos da Tijuca. Meu contato pessoal dentro do grupo se chamava Joana Cunha e estava no seu terceiro ano de desfile pela escola. Ela imaginou que eu pleiteava a integração na bateria e rapidamente começou a me ensinar como se tocava o chocalho. Inicialmente, ela não sabia de minha motivação investigativa de estar na aula. Eu não levava muito jeito, nem muita fé, no meu aprendizado, mas ele foi bastante útil para reunir elementos de análise. Mais tarde contei a ela meu principal motivo e ela intensificou minha aprendizagem, pois segundo a ritmista, a melhor forma de entender como se formava e funcionava a bateria era fazendo parte dela. Deste então, eu comecei a segui-la dentro da escola de samba.
          Passei para um novo estágio naquele grupo: minha identificação. Quem eu era? “O que ele quer aqui?”. Joana se encarregava deste detalhe: “Ele tá tentando uma vaga na bateria... está aprendendo a tocar...”. Sempre procurei observar a naturalidade e a espontaneidade dos “nativos tijucanos” e, rapidamente, busquei reconhecer quem comandava aquele grupo. Joana me apresentou ao mestre da Bateria[12], o Celinho; e, depois, aos seus diretores[13], Ricardinho, Serrinha, Ivanzinho, Claudinho, Casa Grande ou “Casão” e Henrique. Perguntei a Joana um detalhe que me intrigou na apresentação: por que, com a exceção dos diretores Casa Grande e Henrique, a maioria dos diretores era identificada por apelidos no diminutivo? Ela me respondeu que era uma forma de intimidade criada para aproximar o ritmista a seus diretores. Buarque de Hollanda (2001) nos fala sobre esta forma de aproximação presente nas relações sociais na sociedade brasileira. O autor evidencia que estas relações se baseiam em um fundo emotivo familiar e na simpatia. O gosto pelos diminutivos traz esta esfera de intimidade desejada, mas, ele ressalta a superficialidade e a questão da manutenção de aparências neste tipo de relação.
          A Bateria encontra-se num estado de forte coletivização, o que Van Gennep (1978) e Da Matta (1978) entendem como essencial e liminar. O momento do ensaio é especial, pois promove uma experiência coletiva[14]. Experimentei esta noção ao me relacionar com os ritmistas. Sempre achei estranha a maneira tão próxima e natural como me tratavam. Eles mal me conheciam e já tratavam como me conhecessem há muito tempo. Todos falavam comigo e esperavam que eu respondesse, mesmo que nem soubessem meu nome. Além de me integrarem às “rodas de cerveja”, onde eles conversavam e bebiam. Esta é a noção de cordialidade (Hollanda, 2001). Concomitante a esta experiência, sentia-me obrigado a participar desta “troca”. Mauss (1974) fala que trocar é confrontar-se e incorporar-se a sistemas de hierarquia social, é a um só tempo associar-se e rivalizar. O autor estabelece uma dicotomia entre a total confiança e desconfiança, o que se aplica neste estudo. Minha incorporação na Bateria implicava em me confrontar com seus elementos e integrantes. O próprio desfile das escolas de samba combina proximidade e hostilidade entre as agremiações e mesmo no interior de cada uma delas. Esta combinação permite acessar a articulação e os confrontos dos valores do grupo que também estão presentes nas diferentes camadas da sociedade.[15] Este é o conceito de troca agonística (Mauss: 1974).
          Após passar vários estágios de aprendizagem dentro da Bateria, viria agora saber se desfilaria ou não pela Unidos da Tijuca. Joana foi perguntar a um dos diretores se poderia “tirar as medidas” e fazer a “carteirinha”.[16] Esta seria minha prova final de integração do grupo após todo este desenrolar, que Turner (1974) chamaria de “Processo Ritual”. A resposta foi afirmativa e naquele instante eu passava a ser o mais novo ritmista da Bateria da Unidos da Tijuca após três meses de ensaios.[17] Obtive minha carteira de ritmista, o que me possibilitou acesso tanto aos ensaios da escola quanto para outras escolas também. Agora estava identificado dentro daquele mundo e fazia parte daquele grupo.

Formação da bateria da Unidos da Tijuca

          A bateria se divide basicamente em duas partes em função da sonoridade. A frente da bateria concentra os instrumentos de som agudo e a parte de trás os instrumentos de som grave (Costa e Gonçalves, 2000). Joana logo me disse o seguinte quando entrei na bateria: “Paulo, a bateria se divide em frente e cozinha”. E eu retruquei: “Cozinha? O que é isso? Por que Cozinha?”. Obtive a seguinte resposta: “Cozinha são as marcações. Nós do chocalho prestamos atenção nas caixas e nos tamborins, entendeu? Cozinha é porque lá onde o samba pega sustentação, lá onde o ritmo se alimenta, pega também um molho com o repique, pega um swing, entende?”. Achei estranho, pois o lugar “cozinha” dentro de uma casa seria o mais íntimo, onde há a reprodução alimentar. Seria ali que o ritmo se reproduziria? Entendi que esta associação feita por eles seria neste sentido.
          Joana me apresentou a ala de chocalhos. Constatei uma predominância feminina no instrumento e as concentrava na bateria. Reparei que na “cozinha” não havia mulheres, diferentemente do lugar “cozinha” dentro de uma casa, onde as mulheres predominam. No tamborim existia uma mulher e na cuíca também. Éramos eu e mais um homem no chocalho. Segundo Joana, essa predominância feminina na frente da bateria, especificadamente no chocalho, se explica pela leveza e mobilidade para dança que o chocalho proporciona. Leva-se em consideração também que o chocalho não toca o samba inteiro, mas em partes específicas.
          Outro fator evidenciado na bateria foi a questão da cor de pele. Visualmente, a grande maioria da bateria da Unidos da Tijuca é de origem negra ou mestiça. A “cozinha” é predominantemente negra e mestiça, além de masculina. Neste setor, podemos encontrar grande parte dos moradores do morro do Borel e adjacências. Na frente da bateria, podemos observar que há uma grande concentração de pessoas de cor branca e mestiça. Nos tamborins, encontramos mais claramente esta concentração devida, em grande parte, às aulas do Tamborim Sensação, que traz elementos de fora do grupo. Há um “degradé racial” das cuícas até a “cozinha”. O naipe dos tamborins, assim como o de chocalhos uma grande mistura. Segundo o que outro ritmista, Cláudio Francioni, relatou ao ser entrevistado, os instrumentos da frente da bateria[18] são aqueles que podem ser adquiridos mais facilmente pelos ritmistas. Por serem mais leves e mais baratos, estes instrumentos são comprados por aqueles que estão aprendendo e que vem do “asfalto”. Os instrumentos da “cozinha”[19] são fornecidos pela escola, mais pesados e que o povo do “morro” tem acesso.

Esquema da formação espacial da bateria da Unidos da Tijuca

“COZINHA”

  • (SURDOS, REPIQUES E CAIXAS).
  • TAMBORINS

(frente)

  • CHOCALHOS

(frente)

  • CUÍCAS

(frente)

A oposição Frente X “Cozinha” da bateria

          A distribuição espacial dos ritmistas chama atenção desde a primeira observação. A divisão rítmica entre sons agudos e graves entre os dois setores é a mais óbvia, porém, a partir dela podemos interpretar várias outras não menos importantes para se compreender a composição da bateria da Unidos da Tijuca.
          A primeira divisão que podemos evidenciar é acerca do gênero. As ritmistas praticamente se concentram na frente da bateria. Isso se explica devido ao fato que estes instrumentos são mais leves e podem proporcionar coreografias e não tocam o samba todo. Já os instrumentos da “cozinha” são mais pesados, tocam o tempo todo e demandam mais força e concentração.
          A segunda divisão diria respeito à cor de pele, condição social e “comunidade”. Das cuícas à “cozinha” podemos verificar que a cor de pele dos ritmistas parte de uma predominância mais clara para outra mais escura. A incorporação de novos integrantes de camadas médias na bateria também contribui para esta diversificação. A frente da bateria costuma atrair pessoas de diferentes níveis sociais por ser uma parte de mais destaque. Já o pessoal da “cozinha” reúne pessoas mais antigas da escola sendo elas consideradas de “comunidade”. A “cozinha” desempenha um importante papel durante o desfile, pois suas marcações sustentam o ritmo. Segundo declarações espontâneas durante os ensaios, para se tocar uma marcação, o ritmista tem que tocar com os batimentos cardíacos no ritmo do samba. Quem toca surdo tem ser da escola e torcer por ela.
          Outro elemento a ser salientado são as relações sociais entre frente e “cozinha”. Não há uma relação social explícita entre as partes, isto é, apenas entre certas pessoas e não igualmente entre os grupos de pessoas que compõem as diferentes alas de instrumentos da bateria. As alas de instrumentos se relacionam socialmente entre si. O círculo de amizades é formado, sobretudo entre pessoas dos mesmos instrumentos. Pode haver, em alguns casos, tensões entre frente e “cozinha”.[20] Apesar desta suposta divisão, as duas partes se completam e somente unidas podem desempenhar seu papel durante o desfile (Mauss: 1974).

O conceito de “Pura Cadência”

          A cadência de uma bateria de escola de samba costuma ser sua identificação sonora. Ela se caracteriza pelo andamento da bateria. A Unidos da Tijuca se define como a bateria “Pura Cadência”. Eles procuram se diferenciar de uma tendência existente em outras baterias provocada pelo rigor do tempo de desfile. Há uma crença entre as escolas que, ao acelerar a cadência da bateria, a agremiação passaria mais facilmente no tempo estabelecido, mantendo um ritmo constante, porém mais acelerado. A “Pura Cadência” da Tijuca é uma autodefinição da bateria que procura se diferenciar ritmicamente das outras por um andamento mais lento da própria bateria. Percebemos que a reunião dos integrantes da bateria da Unidos da Tijuca no momento que eles produzem som é também um instante de reafirmação de seus valores.

A questão da utilização do conceito de “Comunidade”

          Entre os resultados obtidos nesta pesquisa, o conceito de “comunidade” é o que merece mais estudos em futuros trabalhos. Houve bastante dificuldade ao se caracterizar o que seria pertencer a “comunidade” dentro da bateria da Unidos da Tijuca.
          Por sua composição tão heterogênea, a bateria da agremiação não tem aparentemente uma definição clara do que seja uma pessoa de “comunidade”. Joana me definiu “comunidade” com sendo as pessoas que estão há muito tempo na escola e que a pessoa não nasce sendo de “comunidade”, mas torna-se conforme o tempo de sua atuação dentro da agremiação. Outras pessoas me relataram que são os indivíduos moradores do morro, mas que também podem ser os simpatizantes, os torcedores, os componentes etc. Considerei todas as definições que me foram trazidas e encontrei apenas um ponto de convergência: é necessária uma identificação por parte do grupo. Não adianta a pessoa se considerar de “comunidade” se ela não for identificada como tal. Passe-se por todo um processo de reconhecimento e aceitação. (Turner: 1974). Outra maneira de ser identificado como “da comunidade” é pelo parentesco com algum componente atuante na escola.
          Há uma qualificação em ser considerado “de comunidade”. Geralmente, as pessoas gostam de serem reconhecidas como sendo de comunidade, pois se consideram principais responsáveis pela formação da escola. Significa manter as tradições e os valores da agremiação. A “comunidade” é chamada de “chão da escola” pois sustenta grande parte do canto e dança da escola no desfile, sendo nela confiado o ponto forte do espetáculo.

Considerações finais

          Neste trabalho, podemos destacar alguns pontos importantes a serem desenvolvidos. A bateria da Unidos da Tijuca é um grupo heterogêneo, bem integrado, e que demonstra ser suscetível a incorporação freqüente de novos membros e a renovação. A transmissão de saberes nas aulas do Tamborim Sensação pode proporcionar o ingresso na bateria e o acesso ao grupo e seus valores. Este grupo considerado “comunidade” exige maior atenção para busca de melhor entendimento do conceito em novas pesquisas.
          Creio ter correspondido aos objetivos da pesquisa e ter inspirado novas questões a fim de dar continuidade aos estudos sobre o carnaval carioca. Partindo da bateria, temos muitos outros grupos dentro das escolas de samba a serem estudados. A riqueza deste tema nos faz cada vez mais confiantes em ajudar compreender um pouco de nossas histórias, identidades e valores cristalizados em nossa sociedade.

Notas:

Este trabalho foi feito para o Laboratório de Memória e Narrativa no segundo semestre de 2002 e depois apresentado na XXV Jornada de Iniciação Científica e XV Jornada de Iniciação Artística e Cultural no segundo semestre de 2003.

[1] Trecho do samba-enredo da Unidos da Tijuca no carnaval carioca de 2003.
[2] Geralmente, a escolha do samba enredo se inicia por volta dos meses de julho/agosto. Fui na quadra no dia 31 de Agosto de 2002.
[3] Ritmista é a designação destinada às pessoas que tocam na bateria de uma escola de samba.
[4] A Unidos da Tijuca realiza seus ensaios longe do morro do Borel, no Clube dos Portuários, na Leopoldina, próximo à Rodoviária Novo Rio. A escola alega que o local é de mais fácil localização do que sua sede na Rua São Miguel, na Tijuca.
[5] A Portela (11/04/1926) e a Mangueira (28/04/1928) são as escolas de samba mais antigas do Rio de Janeiro.
[6] Impossível não fazer referência ao texto de Claude Lévi-Strauss, “Totemismo Hoje”.
[7] A fábrica Souza Cruz de Cigarros surgiu a partir da antiga fábrica Boreal, que deu origem ao nome do morro do Borel. Atualmente, a antiga fábrica tornou-se um hipermercado e pequeno shopping.
[8] Os quadros que a Unidos da Tijuca se refere são os de componentes, ritmistas, passistas, baianas e pessoal de apoio.
[9] Discurso e informações retiradas do site da própria escola de samba: http://www.unidosdatijuca.com.br/.
[10] Vide nota 6.
[11] A escola se refere como “comunidades” os grupos brasileiros e portugueses residentes do Brasil.
[12] O mestre de bateria é o equivalente ao maestro numa orquestra. Ele quem comanda os ritmistas com a ajuda de seus diretores.
[13] Os diretores de bateria são responsáveis pelas alas de instrumentos da bateria. Os instrumentos da bateria da Unidos da Tijuca são surdos, caixas de guerra, repiques, cuícas, tamborins e chocalhos.
[14] Podemos entender o momento do ensaio da bateria como uma “communitas”, conceito utilizado por Victor Turner.
[15] Ver a tese de doutoramento de Cavalcanti (1994).
[16] Tirar as medidas para confecção da fantasia e fazer a carteirinha que dá acesso livre aos ensaios da escola são provas que a pessoa é ritmista da bateria da escola.
[17] Comecei a ensaiar em setembro de 2002 e esta confirmação só veio em dezembro.
[18] Os instrumentos da frente da bateria da Unidos da Tijuca são cuícas, chocalhos e tamborins.
[19] Os instrumentos da “cozinha” são surdos, repiques e caixas de guerra.
[20] Na festa de fim de ano da Bateria da Unidos da Tijuca, a “cozinha” foi em peso e a frente teve pouca representação.

Referências Bibliográficas:

  • CABRAL, Sérgio. As Escolas de Samba do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Lumiar Editora, 1996.
  • CAVALCANTI, Maria Laura Viveiros de Castro. Carnaval carioca: dos bastidores ao desfile. Rio de Janeiro: Funarte/ UFRJ, 1994.
  • COSTA, Mestre Odilon & GONÇALVES, Guilherme. O Batuque Carioca – As baterias das escolas de samba do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Groove, 2000.
  • DA MATTA, Roberto. “Apresentação”. In: Gennep, A. Van, Os ritos de passagem. Petrópolis: Vozes, 1978, p. 11 - 21.
  • GEERTZ, Clifford. A Interpretação das Culturas. Rio de Janeiro: LTC Editores, 2003.
  • GENNEP, Arnold Van. Os ritos de passagem. Petrópolis: Vozes, 1978.
  • HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo. Cia das Letras, 2001.
  • LOPES, Nei. O Negro no Rio de Janeiro e sua tradição musical. Rio de Janeiro: Pallas, 1992.
  • _________. Sambeabá – o samba que não se aprende na escola. Rio de Janeiro: Casa da Palavra e Folha Seca, 2003.
  • MAUSS, Marcel. Sociologia e Antropologia. São Paulo: EPU/EDUSP, 1974.
  • TURNER, Victor. O Processo Ritual. Petrópolis: Vozes, 1974.

Paulo Cordeiro de Oliveira Neto
(Publicado originalmente na revista Habitus - UFRJ em setembro de 2004)
Revista Eletrônica Habitus - Revista dos alunos da gradução de ciências sociais da UFRJ

 

Artigos