Brasil, teu espírito é santo
Introdução:
Com a responsabilidade de uma nação prestes a completar seus primeiros
500 anos de luta ininterrupta para manter o clima de fraternidade
mundial, o Brasil oferecerá às Nações amigas, por ocasião dos festejos
da Comemoração dos 500 anos do descobrimento , o maior espetáculo
que o Mundo Moderno poderá realizar, coincidentemente durante o período
de festividades pela passagem do milênio.
Certamente as Escolas de Samba do Grupo Especial, parte significativa
do evento que atrairá atenções, devido as suas responsabilidades sócio-culturais,
grandiosidade, será registrada na Memória dos Povos.
E a Caprichosos de Pilares, escola de vanguarda, sempre atuante nesses
movimentos artísticos, como já demonstrou dedicando um enredo clamando
pelas "Diretas Já" fato que mereceu destaque na capa de
uma grande revista, associa-se a esse projeto com o limite da sua
criatividade e irreverência, suas principais características.
E apoiados na "sabedoria - popular", que desde tempos
imemoriais afirma que Deus é Brasileiro, então, somente o Brasil possui
um Espírito Santo. Essa verdade é incontestável, e se for considerado
pelos fenômenos naturais enfrentados por todos os povos, alguns em
escala catastrófica, exceto aqui no Brasil, nada mais justo e oportuno
do que relembrar, durante as Comemorações dos 500 anos do Descobrimento
do Brasil, que o nosso país supera as maiores adversidades, até mesmo
crises políticas com a intensidade das acontecidas nos anos de 1961
até 1992.
Em qualquer outro lugar do mundo, principalmente depois que ocorreu
a enorme transformação da sociedade, na 2ª metade do século, influenciada
pelo surgimento da Jovem Guarda, Bossa Nova, e o Movimento Hippie,
esse último mais recentemente, que tinha como lema: "Nada a acrescentar!
Só falaremos agora em diante de um espelho e na ausência das testemunhas".
Nessas condições, dificilmente um movimento político, com características
e complexidade do ocorrido no país no período de 1961/1964, seria
encerrado sem choro e lamentações.
O enredo para o Carnaval 2000 focalizará alguns desses episódios,
sem qualquer obrigatoriedade de seqüência de datas, por não ter outra
pretensão que não seja apresentar os fatos dentro da sua ótica, da
sua alegria, irreverência e, mais que tudo, o desejo de reviver um
dos períodos mais importantes para o registro da "Memória da
Nação Brasileira"
Vale ainda acrescentar, para bem definir o posicionamento da Caprichosos
de Pilares, que a escola não pretende escrever a história a sua maneira,
modificá-la ou apresentar fatos novos, menos ainda se inclinar para
um dos lados que ainda hoje mantém disputas ideológicas, como poderá
ser visto através da sua apresentação, no desfile do carnaval 2000.
Achamos, no entanto, que a luta é válida e perfeitamente normal
enquanto travada pacificamente, em busca de idéias e ideais e, mais
ainda, quando o grupo de vencidos ou vencedores for considerado fator
irrelevante.
De qualquer modo é bom que o homem satisfaça a sua natureza essencialmente
política, já que não poderá viver afastado, indiferente aos acontecimentos
ao seu redor, porque perderia a própria identidade e se entregaria,
passivamente, ao sabor do acaso e das circunstâncias.
Sinopse do Enredo
Emergindo de um período nevoento, o Brasil elegeu, com pompa,
fé e entusiasmo, JK para Presidente da Republica, com mandato de 1956
até 1961.
O Governo JK, caracterizado por avanços sociais e econômicos,
terminou sem trauma, de acordo com as normas constitucionais. A Partir
daí o tempo, de nevoento, passou para instável, sujeito a chuvas e
trovoadas.
Com a saída de JK assumiu o governo o Presidente JQ, apoiado por
expressiva maioria popular, cujo mandato foi interrompido espontaneamente,
num determinado dia, de um mês "bem a gosto" dos brasileiros,
menos de 7 meses depois de empossado, deflagrando, com a sua atitude,
uma das mais sérias crises políticas acontecidas ao longo desses 500
anos que estamos comemorando.
Para justificar o ato, alegou que se encontrava sob enorme pressão
das "forças ocultas" e como eram ocultas não podiam ser
varridas do país.
Substituiu-o o Vice Presidente JG, em 7 de setembro de 1961, com
poderes limitados pelo regime parlamentaristas, depois de exaustivas
negociações com o Congresso Nacional, para contornar a explosiva situação,
provando, mais uma vez que o Brasil possui um Espírito Santo.
O Regime Parlamentarista foi encerrado em janeiro de 1962, pressionado
por uma proporção de 80 para 20 do povo brasileiro, para a volta do
sistema presidencialista, uma vocação do povo que durou até março
de 64.
No início do outono de 64, estação do ano sujeita a instabilidade,
desabou sobre o pais chuvas torrenciais, não ocasionando, felizmente,
inundações, afogamentos, desabamentos, etc.
Desenvolvimento do Desfile
Iniciando, então, a esperada apresentação plástica a respeito
dos episódios ocorridos a partir de 64, a Caprichosos, mostrará uma
comissão de frente para "revolucionar" o espetáculo. Metade
da Comissão representará o direito da força. A outra metade a força
do bom senso, que levou ao entendimento e convivência pacifica.
O Abre Alas, exibirá o Mentor Espiritual de Brasil, o Pacificador,
guarnecido por belíssimas mulheres, representando a pureza e o amor.
A intolerância e a repressão, motivos do 2° carro do desfile,
serão simbolizadas por esculturas de cães ferozes, que eram lançados
contra as manifestações populares. Com muita propriedade o carro será
denominado " O Canil".
A lateral do 3° carro, que lembrará a Imprensa Muda, será coberta
com páginas em branco , dos jornais da época, devido a ação da censura,
prática que obrigou os meios artísticos e culturais exigirem, em praça
pública, o restabelecimento pleno do direito de opinião.
Completando esse quadro, componentes de alas, bem ao estilo e
caracterizados, mostrarão os artistas, estudantes e intelectuais que
participaram dessas manifestações, nenhuma delas será retratada, por
uma questão de ética e resguardo das sua privacidades.
Na metade da década de 60, época desses acontecimentos, indiferentes
a gravidade da situação, surgiram a Bossa Nova e a Jovem Guarda. Para
embarcar, também no 4° carro alegórico, que será chamado Bossa Nova,
sem dizer se era para explicar ou complicar ainda mais, convidamos
o movimento Hippie, o mais desleixado, abandonado, descomprometido,
desinformado, despenteado e disposto a ir em qualquer direção, com
destino a lugar nenhum.
Lembrando que adeptos desse movimento eram sonhadores e nada mais
queriam do que horizonte por fronteira e o céu por cobertura, a Bateria
da Caprichosos desfilará caracterizada de Hippie, sem qualquer uniformidade
nas fantasias, porque os grupos eram formados com roupas diferentes,
extravagantes, exóticas e coloridas.
As Baianas integrarão o desfile com uma fantasia inédita. A roupa
será dividida, verticalmente, em duas caracterizações. Uma parte totalmente
negra, inclusive o pé de sapato; e a outra metade nas cores verde,
amarelo azul e branco, com o outro pé de sapato nessas 4 cores. a
parte negra lembrará o tempo em que o país esteve as escuras. A outra
metade a esperança, a riqueza, a prosperidade e a paz.
O 5° grupamento será procedido por uma alegoria chamada "
Caminho da Saudade", com destaques para a guarita e a cancela
com movimentos que permitiam a passagem dos exilados políticos. Mesmo
nessas situações, de acordo com a ótica da Caprichosos, a ternura
deve prevalecer. No lugar de guardas, o carro será guarnecido por
belíssimas mulheres, vestidas a caráter, com uniforme de campanha
e palmas de flores sobre os ombros, ao invés de armas.
Alguns excessos foram cometidos em momentos de extrema emoção.
Pequeno numero de manifestantes não tiveram a mesma sorte e hoje são
apenas saudade, lembrados pela áureas dos seus anjos.
O Carro seguinte prestará uma homenagem a própria Caprichosos,
primeira entidade a exibir, em praça pública, uma enorme faixa reivindicando
Diretas Já, que foi sustentado por balões infláveis, em plena Marquês
de Sapucaí, na década de 80.
O Ato, considerado de extrema coragem, para os padrões da época,
mereceu destaque na capa de uma revista de grande circulação. A escola
interpretava o desejo do eleitor assinar, ele próprio, a procuração
para o eleito representá-lo livre e soberanamente, por período previamente
combinado.
O Brasil possui um Espírito Santo! a afirmativa é comprovada pelo
fato do Movimento Armado de 64, responsável pela mobilização de grande
número de manifestantes de duas correntes políticas, não terem chegado
a posições extremas, numa demonstração de maturidade e responsabilidade
civil.
A persistência do povo brasileiro, finalmente, resultou positivo.
Depois de enfrentamentos verbais, sem uso de outra arma além da capacidade
de persuadir demonstrada pelas lideranças mais atuantes, a sociedade
brasileira recuperou o direito do voto direto.
O Primeiro presidente eleito pela vontade popular, foi Fernando
Collor de Mello. A esperança da maioria da população, 24 horas depois
de sua festiva posse, transformou-se em angustia e indignação. O presidente
inova na área econômica confiscando depósitos bancários, congelando
preços e salários, que julgava ser a mágica salvadora. Mas não existe
ação sem reação. O Plano era mirabolante, mas imperfeito, e o governo,
já no início de 91, passou a enfrentar sérias dificuldades. A inflação
escapa ao controle, provocando aumento da recessão.
A evidência de favorecimento para alguns setores, obrigou o povo,
"mais uma vez", "de novo", "novamente"
a se mobilizar e voltar ás ruas. Nessas manifestações surgiram os
caras pintadas, que mais tarde dividiram as ruas com os descamisados.
Apesar de aparente desorganização e descontração, obrigaram os
congressistas a se decidirem pelo afastamento do Presidente Collor.
A turbulência política daqueles dias contribuiu para aumentar
a fabricação e o consumo das saborosas pizzas, entre amigos. Um verdadeiro
quebra-galho.
Dessa forma, nada mais apropriado para o encerramento do enredo
do que um enorme painel com data de 22 de abril de 1500, data do nascimento
do aniversariante, que também será escrita em vários outros idiomas
ocidentais e orientais, e ainda mostrará o tradicional símbolo de
reconciliação e paz: Uma gigantesca pizza, coberta com rodelas de
tomates, fatias de presunto e 500 lâmpadas, representando velas, nas
mais variadas cores. Afinal estamos tratando de Carnaval.
Etevaldo Brandão
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