A(s) conquista(s)

 

          Agora é ladeira abaixo! Não dá mais para olhar para trás. O que está feito, está feito. E olha que fiz bastante. Falo do trabalho de um ano inteiro. Ralação, alegria e cansaço. Dessa última parte, procuro nem me lembrar, por que, ao contrário da alegria que mora pra sempre no meu coração e nos meus HDs, arquivo das fotos carnavalescas, ela passa.
          Mais uma vez, consegui abrir uma frente na vida que escolhi e pedi a Deus. Comecei devagarzinho, fotografando os ensaios técnicos, o grupo de acesso e sigo ampliando meu horizonte.
          Veio o desfile do grupo especial e a pista, meu mais ousado sonho carnavalesco que realizo há alguns anos com a ajuda de muita gente boa. Primeiro, vem o Lorenzo Falcão, editor de cultura do Diário de Cuiabá que confiou nas possibilidades de uma cobertura exclusiva da maior festa popular do mundo para Mato Grosso. Com o pessoal da Liesa, a Liga das Escolas de Samba, aprendi  a ter paciência e saber que minha hora chegaria na medida em que mostrasse meu potencial e o fôlego de gato(a) necessário para agüentar o tranco. A Riotur me muniu da credencial essencial para que pudesse não apenas escrever, mas fotografar (e muito) a festa.
          Os anos foram passando e outras possibilidades surgiram. Maurício d'Paula, colega de Gestão de Carnaval e (re)conhecido destaque carnavalesco me levou ao barracão da Mocidade Independente de Padre Miguel e, ao me apresentar ao carnavalesco Cid Carvalho, abriu um novo caminho: a construção do carnaval no barracão. Isso foi ano passado. Nesta temporada repeti a dose, esquadrinhando os de 7 mil metros quadrados da escola, na Cidade do Samba.
          Mas não parou aí. Aluízio Derizans, vice-presidente administrativo da Mangueira, propôs um novo desafio: fotografar no mítico Palácio do Samba, a quadra da verde e rosa,  as festas da comunidade: feijoadas, ensaios e toda a escolha do samba... Trabalho para um ano inteiro.
          Topei a parada e entrei de sola, esmiuçando semanalmente o espaço, seus personagens e o efeito que ver aquela quadra festejando ao som da “Surdo Um” provoca em quem por ali passa. Teria que agradecer a muita gente. A cada sorriso, as palavras de incentivo, a ajuda  que recebi quando, altas horas parecia que a mochila de equipamentos ficava com o mesmo peso do cansaço que sentia. Nunca desisti pelo prazer de fazer parte dessa história, por saber onde ela me levaria e as pessoas especiais que iria conhecer nessa jornada.
          Minha última conquista foi muito pessoal. Havia um lugar onde eu queria chegar. Mas, para isso, teria que me vencer. Falo da torre de imagens da Passarela do Samba, na Sapucaí. Vários lances de escadas levam ao seu topo, uma passarela suspensa, sem ponto final. Dela se descortina uma visão privilegiada da pista. Olhava lá pro alto e me perguntava se o custo benefício da subida valeria a pena. Num dia de ensaio técnico esperei os fotógrafos partirem para lá e fui atrás, sem olhar para baixo, fixando os olhos nos degraus que passavam rapidamente pelos meus pés. Quando cheguei  lá um  engraçadinho, não sei se foi o Diego Mendes ou o Ricardo Almeida, me batizou pulando na ponta do espaço suspensa no ar e fazendo toda a estrutura balançar. Não dei a mínima. Estava tão ligada  nos novos planos que se descortinavam que só reparei no chacoalho por que, para me provocar, o engraçadinho fez todas as imagens gravadas dali do ensaio técnico que acontecia lá embaixo, flutuarem no ritmo do balanço da torre. Os cinegrafistas chiaram, mas sabiam que na chegada um desavisado  a brincadeira era de lei.
          Agora, cá estamos novamente, “tudo junto e misturado”, como dizia Mestre Marçal, vivendo mais um carnaval. E, depois de agradecer – e muito - só me resta fazer jus a confiança e ao carinho (marrento, às vezes) que me cercam. Meu obrigado ao povo do samba! É para você  que dedico esse trabalho. Ao seu olhar repleto de amor, aquele, que tento com tanto empenho capturar!

Valéria del Cueto
Valéria del Cueto é jornalista, cineasta e gestora de carnaval.
(Publicado originalmente no site SEM FIM [http://delcueto.multiply.com])
Esta crônica faz parte da série e “Ponta do Leme”

 

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