A Dança dos Orixás

 

Sensual, guerreira manhosa, a fascinate dança dos orixás

            Das mais de quinhentas danças que a interligação de culturas semeou de norte a sul do território brasileiro, três fontes ficaram evidenciadas; a indígena, bem caracterizada pela coreografia dos caboclinhos (ou cabocolinhos) originários dos cucumbis; e européia, através do pezinho, das tiranas ou dos schottish, e, por ultimo, a influencia africana, via candomblé, umbanda. Razão determinante do fascínio e da multicriatividade dos passos do samba, e dessa ultima e cristalina fonte que nos ocupamos agora.
            Com suas cores, metais, alimentos, domínios no universo, saudações e, aqui ressaltadas as danças, os orixás povoam a cultura brasileira desde o tempo da colonização. Estão presentes em todas as nossas artes, notadamente no samba, um dos símbolos internacionais da brasilidade.
            De suas coreografias deve-se ressaltar:
            Bravun, de origem keto, o ritmo percutido com varetas, e a dança dos Exus, com domínio nas aberturas de rua e encruzilhadas. Suas cores são vermelha e preta e os animais o galo, bode e cachorro. O bronze e metal dos exus e laro ie a saudação que eles mais apreciam.
            Mensageiro por excelência, Exu apresenta-se numa dança serpenteada, as mãos ora levantadas para o orun (céu), ora para o aye (terra) os quais ele interliga.
            A comissão de frente nas escolas, em especial a partir dos anos 60, executa inúmeros de seus passos.
E também o bravun a dança de Ogun, orixá do ferro que alimenta-se de varias carnes e, em especial de galinha d'Angola. Sua saudação é "ogun ie" e a cor o azul.
            A coreografia de Ogun tem a dança do bravun bem agitada, os passos mais acelerados, braços movimentados para o alto, a frente e na horizontal, nesta ultima parte como a cortar lanças e defender-se de adagas com escudo imaginário, ações típicas de sua essência guerreira.
            Aguerê e a forma coreográfica com a qual se expressa Oxossi. Dono das matas, sua cor é o verde e a saudação "Oke" ou "Oke aro". Metal é o bronze. O galo e animais de caca são oferendas preferidas e o seu domínio a lua.
            A dança de Oxossi e de especial beleza. Muito rápida, compõe-se de inúmeras fugas e contrafugas. Em esquivas ligeiras projeta o bailado por toda a extensão do ambiente. O corpo corcoveia, vai ao chão, para. Observa e retoma as mesmas atividades anteriores. Não tendo a posse do arco e flecha, símbolos de Oxossi, quem para ele dança abre o polegar e indicador da mão direita, formando um angulo reto, enquanto os demais dedos desta mão se fecham. O indicador da mão esquerda, esticado, toca a falange, a falange o polegar da direita, criando a imagem do arco engatilhado.
            O aguerê é também a coreografia de Iansã, cujas cores são vermelha/branca ou amarela. Seu metal, o cobre. Domina os ventos, a tempestade e os animais prediletos são a cabra e a galinha. A saudação é "eparrei". Alem da rapidez, das fugas e contrafugas próprias de Oxossi, a dança de Iansã tem como propriedade feminina o enlaçar dos braços. A partir desses meneios desenvolve-se o "iruechim", uma ondulação flutuante de mãos com os braços erguidos, comumente chamada de quebra-pratos, e na qual se utiliza um feixe de fios de rabo de cavalo. O "iruechim" é uma evocação aos eguns (espírito dos mortos), simbolizando a vida física que se quebrou, se foi; ou melhor, passou para outro estagio.
            Toda a graça do jogo cênico dos braços dessa coreografia e exibida no belo momento do desfile das grandes escolas de samba, a passagem da veterana Paula do Salgueiro.
            Ainda é o "aguerê" a dança de Oxumaré que, nas sete cores do arco-íris tem seu domínio. Ela alimenta-se do galo ou do bode e, para saudá-la diz-se "arroboboi". Na dança de Oxumaré a coreografia do "aguerê" é serpenteada, muito semelhante a cobrinha que as alas reproduzem para avançar, sinuosamente, na pista de desfiles.
            A nação ijexá empresta seu nome ao ritmo fracionado - quebradinho - e, também, a forma de dança que dele advém.
            O ijexá é a animação coreográfica de orixás poderosos, a exemplo de Oshum (Oxum) que tem as cores do ouro ou azul. Seus animais preferidos a cabra e a galinha. Os domínios: a água doce e o amor sendo-lhe natural, também, o mar. Seus passos no ijexá são miúdos, lentos, delicados. Lua, meia-lua, como reproduzem os bailarinos clássicos ao representa-la. Os braços de Oxum conduzem o ritmo do corpo como se fora a puxada de remos, ora para frente, ora para trás. Ela reproduz, igualmente, sensual mexidinha dos ombros. orixá da beleza, do encantamento, também Oxum dança segurando e batendo a barra da saia, para onde olha, como a procura da imagem de sua graça no espelho das águas. Sua saudação é "ora ieie o".
            O ijexá e, igualmente, a dança de Ossanhe (Ossanha) que se reproduz em passos semicirculares, a perna direita a frente da esquerda, rastejando a planta dos pés ora para direita, ora para esquerda. Exercendo o domínio das ervas medicinais, Ossanha dança com os braços e mãos multidirecionados, como a distribuir as folhas e raízes da sua essencialidade curativa. Para saudá-la diz-se "eu eu o". Sua cor e abóbora-clarinha, e ferro o metal preferido.
            Os passos lembram a coreografia do corta-jaca, sem a finalização da limpeza do visgo que a frente descreveremos.
            Opanijé e a coreografia de Omulu, Obaluaê, que dominam o sol, a terra e, notadamente, as doenças epidêmicas. são preta, branca e vermelha as cores e saudação "atotô". Os animais preferidos são galo, porco ou o bode. A dança e exercida através de três passos a um lado, os braços erguidos ao céu; igual andamento para o outro lado, novamente os braços alçados. De volta a base, então os três passos serão para frente.
Sem tirar nem por, e um dos principais movimentos das alas para se arremeterem a frente sem abrir claros na harmonia do desfile das escolas de samba.
            Alujá e a dança de Xangô, a mais viril e agressiva de todas as coreografias dos santos africanos. Dominador do raio, do fogo e, sobretudo, da Justiça, de Xangô são as cores vermelha e branca e, as vezes, o marrom. Cobre e seu metal e alimentos preferidos são o carneiro e o galo. A saudação: Kaô-Kabiecilê.
            Com guerreiro, a coreografia de xangô e dominada pela simulação de golpes de machado, um de seus símbolos. Num momento, ele rasga o espaço para frente, noutros cruza sua arma com o imaginário opositor (o mal).             De forma impetuosa, uma coxa a frente, o tronco e impulsionado para frente e, em seqüência, para um dos lados a coreografia vai ocupando todo o espaço que lhe e dado. Para executa-la bem, ha de ter muito vigor físico.
            O ibin tem duas vertentes, porque o próprio orixá (Oxalá) se subdivide. Quando aparece como Oxaguian, sua coreografia tem mais vibração, mas e executada a passos curtos, curtíssimos, para a direita e esquerda, ao tempo em que os braços movimentam-se para o alto, elevando sua espada para o céu. são passos semelhantes aos de Ogum, contudo, regidos pela brandura, a suavidade.
            Como Oxalufan (o oxalá mais velho), ao dançar a composição do corpo e arqueada. Amparado no Opaxoro (o cetro) ele praticamente caminhas, passo a passo, com intervalos vibratórios da cabeça aos pés.
            A coreografia de Oxaguian da postura as baianas, excetuando-se a rodada do corpo, propriedade do samba.
A descrição da coreografia dos orixás foi adotada com base em informações colhidas junto ao escritor Fernandes Portugal. Autor de diversos livros sobre cultura religiosa ioruba, Fernandes Portugal e permanente consultor de obras para cinema e televisão.
            Os indicativos dos domínios dos orixás são do livro "Os orixás e o candomblé", Editora Eco, de Byron Torres de Freitas / Vladimir Cardoso de Freitas. O autor acrescentou os elementos complementares que a compreensão do texto exigia.

 

José Carlos Rego
(Pesquisador de carnavel e autor do livro Dança do Samba)

 

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