Um ser criança
Introdução:
Resgatar
as formas tradicionais de fazer Carnaval e criar uma produção cultural
capaz de financiar todas as suas atividades são os principais objetivos
dessa que é uma das mais antigas Escolas de Samba do Rio de Janeiro.
Para sustentar o carnaval da Vizinha Faladeira e viabilizar o seu
desenvolvimento criou-se um projeto de revitalização cultural na Zona
Portuária. Este projeto prevê a construção de casa de espetáculos,
oficinas de arte, teatro, cinema, vídeo e som, escola de alfabetização,
informática e um museu de memória da Zona Portuária tendo a Escola
de Samba como a espinha dorsal desse complexo cultural.
O trabalho que será apresentado na Passarela do Samba, sua primeira
aparição nesse espaço, além de compor mais uma etapa do crescimento
da Escola, reflete o esforço para maximizar e consecutar nossos objetivos.
Apresentação:
A construção do enredo “Um ser criança” atende a nossa filosofia
de fazer carnaval dentro da realidade cultural do povo, observando
não só os seus aspectos culturais, mas também a ordem social, política
e econômica do cotidiano de nossa população.
Além desses dados, há uma ocupação de se respeitar os elementos básicos
que permeiam esta festa: criatividade, espontaneidade, naturalidade
e emoção.
Daí, a partir desses elementos, busca-se o encontro do natural dessa
Escola, em função, sobretudo, de sua historicidade e também de pôr
em questão o resgate do Carnaval dentro de sua verdade natural e não
aquela traduzida pela mídia.
A atestação dessa nossa filosofia é demonstrada pelo conceito estético
de se fazer a fantasia, onde o desenho é de comunicação direta entre
o que se mostra e o que o enredo fala, o uso de material que não onera
o custo da Escola e do próprio Carnaval e, assim, aguçando ainda mais
o poder de criar.
Dentro dessa ótica de se fazer carnaval, há, por continuidade cultural
e pela facilidade de expressão do conteúdo, incluindo o material usado
e a sua forma de usar, uma estreita relação da Escola com a Comunidade
onde ela esta inserida, sendo parte verdadeiramente integrante dessa
produção cultural popular.
Desenvolvimento:
A proposta do enredo é resgatar as possibilidades da essência infantil
contida em todos nós em variadas situações.
Traduziremos o elemento físico, psicológico, cultural, esotérico e
sonhador da criança.
Assim, retrataremos a alegria, a espontaneidade, o lúdico, o verdadeiro,
o natural como um conjunto que representa o ritual de passagem pela
vida. Neste aspecto, configura-se o próprio valor do carnaval, isto
é, o movimento que se -faz e desfaz, sendo que a Passarela é o aspecto
físico de demonstração desse ritual de cultura e vida.
Em resumo, o pensamento geral contido no enredo é de que a vida só
vale a pena pelo prazer, pelo tesão, pela alegria, pelo humor, pela
graça e beleza de olhar o mundo e vivê-lo assim.
Dessa forma, o elemento infantil é o sustentáculo que nos leva a superar
as questões políticas e econômicas que amargam a natureza humana.
Viver a criança é atingir a essência da vida. É se transpor para uma
outra tônica do real de viver.
Filosofia do Desfile:
Resgatar a qualidade de vida através da alegria que o Carnaval nos
possibilita assim, inicia-se um projeto de realizar um primeiro momento
de elucidar as formas espontâneas de se fazer Escola de Samba através
de alguns elementos básicos contidos na origem dessa expressão cultural,
modernizando sim, mas sem perder alguns pontos que norteiam a identidade
dessa cultura, fortificando a imagem do natural e espontâneo, os quais
tão bem podemos encontrar na temática infanto-juvenil.
Estrutura do Enredo:
Setor 1: A criança sob o olhar da Literatura Brasileira.
Neste momento privilegiaremos, entre os vários escritores da literatura
infantil, a figura de Monteiro Lobato.
Aí, teremos o encontro de alguns momentos da literatura infantil,
como por exemplo, Maria Clara Machado, Ziraldo e Maurício de Souza,
mas os destaques serão os personagens lobatianos. Os demais adornarão
os de Monteiro Lobato.
Setor 2: A expressão de verdade da alegria infantil
Neste bloco estarão contidos todos os elementos carnavalescos que
expressam humor, alegria e prazer. Serão figuras de resgate do carnaval
de rua, de salão, das próprias Escolas de Samba, do folclore brasileiro,
tudo que representa a alegria natural.
Assim, o Circo será o centro concreto desta realização.
Como figura-síntese deste bloco, o personagem Palhaço como mola-mestra
da alegria.
O picadeiro em sua forma circular representa o domínio do mundo, do
planeta, do útero materno que gera esta alegria.
Setor 3: Realidade e perspectivas da criança
Há nesta passagem, a mensagem da criança no aqui e agora da população
infantil brasileira. É um inicio de chamada de atenção a ecologia
humana infantil pelos problemas que elas passam. Porém, somente a
criança tem o poder de restabelecer a esperança. Ela é o futuro. Ela
nos dá essas perspectivas.
É a criança do amanhã. A criança no Terceiro Milênio gerindo o planeta.
E como representação simbólica desta fase vem o Flor do Amanhã na
pessoa que se destacou nacionalmente através, também, de um projeto
pedagógico baseado na cultura do carnaval.
Estamos falando do Sr. João Clemente Jorge Trinta, Joãozinho Trinta.
Na verdade o que queremos mostrar e que o nome João representa, sob
o ponto de vista nacional, o povo brasileiro, da mesma forma que Zé
e Maria. Dizendo assim que está na arte do povo a saída da cultura
brasileira, desprovida do artificialismo da cultura imposta pelo racionalismo
e pelo positivismo científico: “Deixa na mão do João”.
Explicativo:
-
O que quer dizer o enredo?
E muito simples. O enredo vai mostrar a coisa mais pura, livre, alegre,
natural e verdadeira: A Criança.
-
Mas que criança?
A criança que todos nos fomos e também a criança que existe dentro
de cada um de nós.
-
Mas por que a criança?
Existe uma relação profunda entre o ser CRIANÇA e o CARNAVAL.
Esta relação está num ponto básico chamado ALEGRIA.
A alegria e um estado de espírito espontâneo, natural que podemos
considerar o grande momento de prazer de viver. Portanto, o estado
de ser criança e o carnaval são momentos da vida que nos ajudam e
nos fazem esquecer o lado duro, pesado, cruel que é imposto pelas
ordens política e econômica, isto é, o lado racional, que tenta anular
o intuitivo, o emocional, o vibrante, o prazeroso, o tesão que esta
contido na criança e em todos nós.
-
Mas ser criança tem muitos sentidos?
Sim. O ser é uma maneira, logo ser criança é uma forma, uma maneira
de pensar, sentir e agir
-
E o ser criança como Escola de Samba?
Eis aí uma grande questão.
A história da Vizinha Faladeira é marcada por ser uma escola irreverente,
contestadora, e, por isso, popular.
Hoje, a massificação do
desfile das Escolas de Samba impede de cada
um ser criança; isto é, de curtir plenamente a alegria de desfilar.
-
O que, então, o enredo propõe?
Propõe-se um resgate de ser alegre e feliz na avenida. E é isso que
o samba de enredo demonstra.
Devemos buscar a origem da Alegria no carnava1 através da criança.
Embora tenha sido na Pedra do Sal que a história do samba começou,
lá na Saúde, foi naquela Pedra que aparentemente dura e salgada que
a Vizinha Faladeira começou a mostrar o seu molejo, alegremente construindo
o carnaval. E é isso que queremos dizer no pé em plena PASSARELA DO
SAMBA, que, pela primeira vez, vai ver a verdadeira alegria de fato
e de direito.
A nossa irreverência hoje não é ser futurista como era a Vizinha antigamente.
Ser futurista hoje é buscar as origens perdidas, já que massacraram
o Desfile e as Escolas de Samba.
Nossa resposta a tudo isto está no nascimento e redescobrimento da
vida: A CRIANÇA.
Sergio Murilo Pereira Gomes
Presidente da Comissão de Carnaval e Carnavalesco
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