Agnaldo Timóteo- o filho de dona Catarina
Caratinga-MG. 16 de outubro de 1936
Sob
a luz do bom caminho me criei. Era um conjunto de valores que eu sabia
que me acompanhariam por toda a vida me fornecendo a base necessária
para formar o meu caráter como um cidadão de bem. O amor de meus pais,
a educação recebida por eles, a união do núcleo familiar, a preocupação
de meu pai em mostrar-me a importância de se ter uma profissão, e
bem provável acima de tudo, a fé e as rezas de minha mãe, dona Catarina,
que iluminariam para sempre os passos desse seu filho.
Na década
de 40, percebi que essa intensa luz me abençoava também com um dom
especial. Eu ouvia meus ídolos cantando nas rádios. Suas vozes ecoando
pelo país, pelos grandes palcos dos cassinos, teatros de revista e
programas de auditório, todo brilho, glamour e o esplendor de uma
época de ouro que me influenciava, seduzia e povoava os meus sonhos
de menino, me conduzindo a descoberta da minha vocação.
Queria
ajudar meus pais, retribuir-lhes o carinho e a dedicação, pra isso
ainda menino fui vendedor de frutas e engraxate a fim de colaborar
com o orçamento familiar. Estudei até o 3° ano primário e pelas mãos
de meu pai fui trabalhar como funcionário do DNER de Minas até que,
mais tarde obtive profissão a de torneiro-mecânico, diga-se de passagem,
"o melhor torneiro-mecânico do ofício". Trabalhei nas melhores
oficinas de minha cidade em Caratinga e também na capital. Teria sido
um grande profissional se não tivesse predestinado a cantar. E embora
a realidade a minha volta fosse dura, tinha força e disposição para
vencer os obstáculos os obstáculos torneando o meu próprio destino.
Tentei
um programa de auditório local, ...fui gongado. Passei a cantar nos
circos da cidade meus primeiros palcos. Aos quinze anos deixei verdes
campos da minha terra e embarquei num trem cheio de esperanças, os
trilhos que me colocariam na trilha da canção.
Para ganhar
mais espaço nos programas de auditório comecei a imitar o estilo de
cantar do Cauby, deu certo por um tempo, mas eu não queria ser eternamente
o imitador do Cauby.
Me sugeriram
então tentar carreira no Rio, para onde vim na década de 60. Aqui
a luta foi ainda mais difícil, madrugava nas rádios implorando para
que tocassem meus discos, suportando as humilhações por ser negro,
desconhecido e pobre.
Fui em
frente. Muitas vezes brigando. Precisava sobreviver e então trabalhei
como motorista pra Ângela que sempre me recomendou às rádios, mas
ninguém me ouvia. Eu interpretava músicas de sucesso nos auditórios
dos programas campeões de audiência da época. Até que de repente,
na gravadora Odeon, surge um astro. Daí foi uma seqüência de sucessos
e o reconhecimento do público veio logo em seguida. Participei de
muitos programas durante o período da jovem guarda junto com Roberto
e Erasmo, cantei muitas de suas composições. Desde aquela época que
eu canto para o povão, para aqueles que passam por necessidades por
que me identifico com eles, eu mesmo sou um produto das dificuldades
e por isso canto com a minha verdade. Meu repertório é exclusivamente
romântico feito pra gente igual a mim. Canto músicas que falam do
relacionamento de pessoas que se amam. Quando ouço minhas canções
no rádio sinto que o romantismo está no ar, invadindo os lares das
pessoas, dilacerando a alma dos que sofrem. São músicas que falam
das dores do coração, dos arrebatamentos do amor, dos sofrimentos
da paixão, do saudosismo das jovens tardes de domingo.
Um dia,
assistindo a apresentação de um candidato na TV, decidi lançar também
a minha candidatura a deputado federal. Não sei se foi por total indignação
do sistema, por pura impulsividade, ou de fato por ser conhecedor
da miséria, compreender bem o que é a pobreza e a discriminação. Tudo
isso um dia fizera parte da minha vida e eu achava que como parlamentar
poderia dar a minha contribuição para oferecer melhores dias de vida
às populações mais carentes. Acho imprescindível que as pessoas populares,
famosas, participem dos problemas sociais e econômicos do país....
A candidatura
deu certo, foram mais de 5000 mil votos "oficiais", que
me deram o direito de ir ao Congresso Nacional representar "as
massas". Logo de cara, como se não fosse eu, um inflamado torcedor
do meu time, botei fogo na tribuna em meu primeiro discurso ao ligar
pra dona Catarina e num gesto de profundo agradecimento, mostrar a
ela e a toda uma nação, até onde podia chegar um cara honesto, humilde
mas com muita garra, determinação e uma verdadeira vocação para cantar,
lutar e vencer.
Acreditei
em meus sonhos de menino e venci tantos obstáculos para atingir minhas
metas que já nem lembro quantos, mas consegui, e quando vejo nossas
crianças abandonadas a própria sorte sinto que continuo a ser o mesmo
menino sonhador de antes, um menino que agora espera que tantos outros
iguais a ele também possam guiar melhor o seu destino, com boa ambição,
com uma forte educação como base, com respeito às leis e as autoridades
e reconhecendo contudo o seu verdadeiro valor hoje essa é a minha
bandeira, meu grito de alerta à sociedade e a juventude. Sem fé e
sem direção, nada se aprende e nada se ensina, entretanto com projetos
e atitudes podemos mudar os rumos de vários jovens da nossa nação,
com mais escolas, mais ensinos, mais oportunidades e consequentemente
com mais diplomas.
Não tem
jeito, continuo sendo um lutador, é a minha sina. E se me perguntam
de que forma gostaria de ser reconhecido, respondo com todo orgulho:
- como
Agnaldo Timóteo - o filho de dona catarina.
Marcello
Portella
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