De Minas Para o
Brasil – Tancredo Neves – O Mártir da Nova República
Seu
nome significa MINAS GERAIS, isto é, de toda espécie, e, conseqüentemente,
mina de ouro, prata, cobre e ferro, encontradas dentro de seus limites,
além de muitas pedras preciosas.
MINAS de Igrejas magníficas que pasmam os fiéis com o brilho de seus
adornos, em suas fachadas e interiores luxuosos, realizados por mestres
do barroco mineiro.
MINAS
de Ouro Preto, São João del Rey, Congonhas e Sabará, verdadeiros monumentos
artísticos.
MINAS
GERAIS, onde começa a liberdade, tão sonhada por nossos Inconfidentes
e, sobretudo o alferes Xavier, o Tiradentes que ao juntar seus esforços,
defenderam a bandeira, e adotaram como lema um verso do poeta latino
Virgilio que se inicia dizendo: ”Libertas, quae sera tamen...” Liberdade
ainda que tardia.
MINAS
de grandes políticos como Juscelino Kubitschek, conhecido por suas
realizações econômicas, e o nosso grande e eterno, Tancredo neves,
que será nosso triunfal enredo para o carnaval de 2002.
Tancredo
de Almeida Neves integrava a especialíssima linhagem de políticos
cujas ações não só ajudam a torna viável às transformações do Brasil
nas últimas décadas como, suas freqüentes demonstrações de maleabilidade
e guinadas oportunas (eventualmente oportunistas), permitiram desvendar
o caráter sinuoso dos meandros da política. Disposto a retroceder
sobre os próprios passos, aliar-se com os inimigos, perdoá-los e esquecer
suas ofensas, Tancredo foi político mineiro, calado sempre que possível,
reticente quando necessário, corajoso em momentos chaves, torno-se
um especialista em caminhar no fio da navalha.Tais habilidades de
malabarismo político não o impediram de ser eventualmente forçado
a descer do muro – ora à esquerda, ora á direita. Depois de ir ás
ruas pedindo eleições diretas-já, rendeu-se ás evidências de que o
período mais nebuloso da vida pública brasileira estava atrelado ao
”entulho autoritário“ e candidatou-se à presidência da República em
pleito indireto.
Em
1985, aos 75 anos, seria eleito presidente, mas morreria antes da
posse. Tragédia de tal proporção, levou Tancredo ao patamar reservado
aos mártires nacionais e impediu que sua vida e obra fossem analisadas
sob o ângulo frio dos fatos concretos. Mais do que se tornar o presidente
que não foi, Tancredo Neves passou a historia como o presidente que
poderia ter sido no sentido da expressão.
Descendente de açorianos, Tancredo Neves nasceu em 4 de março de 1910
em São João del Rey (MG) quinto dos 12 filhos de Francisco Neves e
Antonina de Almeida. O pai, vereador, morreu aos 48 anos, mas inoculou
no filho o gosto pela política. Em 1932, Tancredo, tornou-se advogado.
Três anos depois, elegeu-se vereador pelo Partido Progressista.
Com
o golpe do Estado Novo, em 1937, Tancredo Neves perdeu o mandato.
Em 1945, com a queda da ditadura, novos ventos o levaram ao Partido
Social Democrata (PSD). Elegeu-se deputado em 1946 e apoiou a candidatura
de Dutra à presidência. Em 1953, tornou-se ministro da Justiça de
Vargas (que o cassara 15 anos antes). Foi ignorado pela “República
do Galeão”, que investigou por si o atentado a Lacerda, e assistiu
da ante-sala do poder ao dramático desfecho da madrugada de 24 de
agosto de 1954, quando Getúlio Vargas “deixou a vida para entrar na
história”. Depois de atacar duramente o novo governo chefiado por
Café Filho, Tancredo foi um dos maiores articuladores da campanha
de JK de quem se tornou conselheiro.
Em
1961, quando a turbulência de um golpe de Estado já se desenhava nos
céus do país, Tancredo foi encarregado de negociar com João Goulart
as condições para que os militares aceitassem a posse do vice-presidente,
após renúncia de Jânio Quadros . Graças ao êxito da missão, assumiu
como primeiro-ministro do governo parlamentarista. Quando o governo
Goulart começou a perder para a esquerda, Tancredo se demitiu. Mas
o golpe era página já escrita, quando ele eclodiu, Tancredo se manteve
no posto de deputado federal. Da trincheira no MDB, equilibrou com
rara eficiência papéis antagônicos com a negociação e a oposição a
um regime militar de ferocidade crescente, função que o fez manter-se
calado inúmeras vezes e o impediu de ser cassado. Senador em 1978
aliou-se ao seu inimigo histórico Magalhães Pinto para formar o Partido
Popular (PP), que se fundiu com o PMDB quando Tancredo se tornou,
junto com Ulysses Guimarães, uma das principais figuras da campanha
das diretas e o “candidato natural” à presidência da República, ainda
que por caminhos indiretos.
Os
brasileiros despertaram cedo naquele 15 de março de 1985, sobressaltados
pela saudável expectativa de assistir à posse de um presidente eleito
– ainda que indiretamente. Acabaram tendo uma desagradável surpresa
ao ligar a TV e assistir à posse de José Sarney, um vice que parecia
ter entrado na chapa como mero complemento. Àquela altura, Tancredo
Neves embarcava numa viagem sem volta num leito do Hospital de Base,
em Brasília.
Internado
às pressas, estava destinado a jamais assumir a condição de ocupante
do Palácio do Planalto. As dores se manifestavam havia vários meses,
mas apesar da insistência de sua mulher, Risoleta, e de amigos e assessores
mais próximos, Tancredo estava decidido a levar até o fim o papel
do candidato viável – o que naquele momento significava alguém de
perfil liberal o suficiente para canalizar as esperanças da retomada
da democracia, e conservador o bastante para não cutucar demais a
moribunda ditadura militar.
Em
15 de Janeiro de 1985, o congresso elegeu Tancredo Neves o 34° presidente
do Brasil, conferindo-lhe 480 votos, contra os 180 dados a Paulo Salim
Maluf. A herança do regime militar incluía a maior inflação da História,
uma dívida de US$100 bilhões e uma lista de incontáveis escândalos
financeiros.Tancredo carregava o sonho dos brasileiros de ver o país
ingressar num período de liberdades políticas, transparência da administração
pública e crescimento econômico sustentável.
O
sonho de Tancredo de conduzir o processo, no entanto, não chegou a
se concretizar. Em 13 de março, a dois dias da posse, submetido a
exames, foi informado pelo médico da existência de um processo infeccioso
no abdômen. Precisava ser operado com urgência. ”Os senhores precisam
saber até o dia 17, às 5 horas da tarde, eu não posso me submeter
a essa cirurgia”, disse taxativamente. Para o dia e horário citados,
estava marcada a primeira reunião ministerial do novo governo. A partir
dali, imaginava, sua internação já não provocaria turbulências graves
e os militares não iriam intervir no processo de redemocratização.
Na
noite do dia 14, o quadro clínico indicava possibilidade de parada
cardíaca, parada respiratória e morte. Mesmo alertado dos riscos,
Tancredo Neves só concordou em ir ao hospital para tomar soro. Foi
o truque encontrado pelos médicos para interná-lo. Começava a longa
agonia de Tancredo e de todos os brasileiros. Enquanto se iniciava
a cirurgia, numa sala reservada do Hospital de Base, alguns dos caciques
da “Nova República“, entre os quais os novos ministros Marco Maciel,
Aureliano Chaves, Leônidas Pires Gonçalves e Affonso Camargo e o senador
Fernando Henrique Cardoso decidiram que era preciso preparar com rapidez
a posse do vice-presidente eleito José Sarney. Havia temores de que
a linha dura não aceitasse a posse de Sarney e aproveitasse o pretexto
para criar uma nova crise institucional de conseqüências realmente
imprevisíveis.
* “(...). A nação interia
comunga deste ato de esperança, reencontramos, depois de ilusões
perdidas e pesados sacrifícios, o bom e velho caminho democrático.
Não há Pátria onde falta democracia. Esta memorável campanha confirmou
a ilimitada fé que tenho em nosso povo. Nunca, em nossa Historia,
tivemos tanta gente nas ruas, para reclamar a recuperação dos
direitos da cidadania e manifestar seu apoio á um candidato. Em
todo o país foi o mesmo entusiasmo. De Rio Branco a Natal, de
Belém a Porto Alegre, as multidões se reuniram, em paz, cantando,
para dizer que era preciso mudar, que a Nação cansada do arbítrio,
não admitia mais as manobras que protelassem o retorno das liberdades
democráticas. Não vamos nos dispersar. Continuemos reunidos, como
nas praças públicas, com a mesma emoção, a mesma dignidade e a
mesma decisão. Se todos quisermos, dizia-nos, há quase duzentos
anos, Tiradentes, aquele herói enlouquecido de esperança, podemos
fazer deste País uma grande Nação.
Vamos fazê-la”.
*
(Trecho do discurso perante o Congresso Nacional, logo após sua vitória
no Colégio Eleitoral, em 15 de janeiro de 1985).
Vamos
juntos cantar e mostrar, aplaudir e enaltecer o homem Tancredo Neves,
seu tempo, sua trajetória política, suas iniciativas. Recordaremos
em grande homenagem ao Presidente Tancredo Neves, o mártir da “Nova
República”.
Edgley Cunha
|