FICHA TÉCNICA 2004

 

Carnavalesco     Milton Cunha
Diretor de Carnaval     Ricardo Almeida Gomes
Diretor de Harmonia     Marco Antonio dos Santos (Marquinho Harmonia)
Diretor de Evolução     Roberto Gomes
Diretor de Bateria     Renato Almeida Gomes (Mestre Renatinho)
Puxador de Samba Enredo     Anderson Paz
Primeiro Casal de M.S. e P. B.     Paulo Roberto e Gleice Simpatia
Segundo Casal de M.S. e P. B.     Marcelo Vinícius Santana do Nascimento e Mariana Paez
Resp. Comissão de Frente     Roberto Almeida Gomes e Roberto Lima
Resp. Ala das Baianas     Maria Cristina da Silva Cardoso
Resp. Ala das Crianças     Paulo Ramada

 

SINOPSE 2004

Boi Voador sobre o Recife: Cordel da galhofa nacional

Sinopse

1 - A cobra vai fumar...

          Nos idos do encantado Século XVII,a cobra fumava nas terras do nordeste brasileiro, pois várias nações disputavam o título de Rei da Cocada Preta do Branco Açúcar, que por aqui produzíamos. Os verdes mares bravios viram ancorar o Conde Maurício de Nassau, representando a Corte Holandesa, a gananciosa Casa de Orange, que  estava atrás de um dindim e que acreditava que o paraíso fiscal era aqui, que o Eldorado precisava se conquistado.

2 - É na boquinha da garrafa...

          Pouco tempo se passou para que eles enxergassem as índias boazudas, as mamelucas, as cafusas, as negrinhas, a Conga la Conga da Gretchen,  o chicote da Tiazinha, o Carandiru da Rita Cadilac e a boquinha da  garrafa de Carla Perez; enfim, gringos em turismo sexual atraídos  pelo paraíso das gostosonas desprotegidas, índias que se não  quisessem o "apito", o pau iria comer...  Noves fora isto, ele governava a Capitania Hereditária de Pernambuco  com grande destreza política e visão social, porque ninguém é de  ferro.

3 - Dos Países Baixos para a baixaria...

          Os mangues, pântanos, lamaçais e afins que circundavam a área do  porto do Recife infernizavam a vida dos branquelos como insetos  enloquecedores, conhecidos como as pragas do Brasil, que eram cinco, o que levou o Comandante em Chefe de Mar e Terra, Nassau, a duas  conclusões: uma de que muita saúva, caracol, mosquitos etc...e pouca  saúde, os males dos aborigenes eram; e outra, que a brasileirada   adorava a pompa e circunstância dos "estrangeirismos", e achou melhor   para impressionar geral a galera se apresentar como Príncipe. A partir deste dia ele abalava Bangu em Chamas...

4 - A ponte que te partiu...

          Reestruturava a sociedade pernambucana e imprimia-se o progresso à  cidade do Recife, movimentando-a cultural, política e socialmente.  A Corte incluia grandes artistas, cientistas e engenheiros, que  acabaram por deixar marcas indeléveis para a vida brasileira, como os  Jardins Botânicos e Zoológicos onde se percebia que o jeitinho  brasileiro dava a Nova Holanda um tempero especial; que as aves que   aqui gorjeiam não gorjeiam como lá; que o Carcará pega, mata e come...Dentre inúmeras obras magníficas que o Conde construiu em sua  Mauritia ( assim era conhecida a capital pernambucana), destacava-se  o Palácio de Boa Vista, sua residência de verão, uma espécie  de "piscinão" da época; o Forte Orange; e para alegria do Zé do  Caixão, que a meia noite levará a tua alma, um cemitério chiquérrimo.  Mas foi a construção da ponte sobre o Rio Capibaribe, sua última  grande obra, que acabou esvaziando os cofres da Deficitária Companhia   das Índias Ocidentais, e deu o maior rebuceteio. Ele que ja tinha  sido Flor do Campo nas Oropa, estava preste a se tranformar em  tiririca do brejo nesse fim de mundo. Uma situação tipo ou dá ou  desce e ele resolveu dar: dar uma cartada decisiva, lançando mão do  que melhor ele tinha aprendido em terras terceiro-mundistas, a galhofa nacional brasileira.

5- O boi decola...

          Para fazer "caixa" era necessário oferecer uma festa de arromba, um arraial onde a Corte chutasse o pau da barraca, e cobrar algum tipo  de pedágio à população que atravessasse a ponte em busca de higiene  mental. Já familiarizado com o Zé povinho, após sete anos de  permanência nos trópicos, o Conde lançou mão do bom humor e seu  espírito aventureiro e empreendedor de sonhos: anunciou que durante a  inauguração um boi voaria sobre a festa.  O arraiá estava lotado de bichos e bichas: Falcão dos Guararapes  regendo a fanfarra dos cornos, o Velho Guerreiro e seu bacalhau, a Eguinha pocotó, o chupa-cabras, os veadinhos de Pelotas, o ET de  varginha, a mula sem cabeça e até os ex big-brothers; e o povo feliz  perguntando-se como aquele samba do crioulo doido seria possível.  Todos pagaram o pedágio e queriam ver o impossível. Para espanto e   aplausos do povo, um boi cruzou o céu negrooo da noite recifense,  acima dos telhados do palácio: um boi empalhado, mas um boi; um vôo  pendurado em corda estendida entre as duas torres do palácio de  Friburgo, mas um vôo. A mais pura magia do espetáculo,uma das grandes  galhofas nacionais. Gritos, comemoração, o Nassau fizera voar um  couro de boi cheio de palha preso por fios que a noite escondia.  O boi que já era amado nos folguedos populares do nordeste alcançava   mais uma esfera de magia e encantamento.  O Conde-Príncipe-Comandante e Chefe Mauricio de Nassau mostrava à  gente brasileira seu "fair-play"e sua plena compreensão de nossa alma e do jeitinho brasileiro. Talvez o Governante que melhor tenha brincado de Brasil e desta maneira melhor tenha feito o Brasil se enxergar. O povo recifense, que adora uma festa, comprou a brincadeira e a  partir de então adotou a expressão idiomática para designar promessas  que levam na gozação o cumprimento das mesmas: "Isto é coisa de boi  voador!".

6 - Ainda tem boi na linha...

          Tantos bois voadores contemporâneos: os empréstimos"mui-amigos"do  FMI; grampos telefônicos; ex mulheres movendo a história política do  Brasil e denunciando seus ex maridos; anões do orçamento que ganharam  várias vezes na loteria; ranários que consomem milhões da Sudam;  escândalos que acabam em pizza; o imaginário popular riquíssimo, que  resiste e reafirma o Brasil como nação Soberana.

7 - Nóis sofre mas nóis goza... No Gran Circo Brasil

          Traduções da galhofa nacional, do traço que nós mesmos  intitulamos "jeitinho brasileiro". E já que é Carnaval aqui está  nosso besteirol para a "Veneza Brasileira", terra onde tudo acaba em  frevo... ou samba...(Mas nóis não somos palhaço não, viche?).

(Para Mauro Rasi e Seu Creysson)

Milton Cunha

Cronograma de desfile:

Comissão de Frente: "Soldados de Nassau virando Boi"
Galhofa sobre os tripulantes da esquadra holandesa, e a influência dos trópicos nos espíritos europeus.

Grupo Abre-Alas “A Cobra vai Fumar"
Galhofa sobre a nau muito louca que transporta Nassau, e a expressão brasileira que significa que o bicho vai pegar.

Grupo Abre-Alas “Frevo Oceânico"
Galhofa sobre o mar pernambucano que recebe Nassau, já devidamente instalado sobre a sombrinha de nossa dança típica.

Ala 3: "Tribo Maresia, Sente a Maresia”.
Deboche sobre o estereótipo preguiçoso e malandro que o imaginário europeu estabeleceu para nossos habitantes e homenagem às "finas ervas" do novo mundo.

Ala 4 (Baianinhas): "O Pecado Mora ao Lado"
Deboche sobre a atitude pudica dos recém-chegados e o confronto de vontades que por debaixo dos panos escondem-se. Alguns dias no calor brasileiro e cobras selvagens “invadem” a mente e os sonhos holandeses. Ai, como eram grandes!

Ala 5: "Índios ao Mar"
Deboche sobre a imitação de comportamento que nossos habitantes, sem espírito crítico, fazem em relação aos que "vêm de fora”. Máscara de mergulho, respirador e bóias de bichinhos são incorporadas aos trajes indígenas.

Grupo Alegoria 2: "Gordinhas Farofeiras"
Deboche ao espírito farofeiro da corte brasileira, que adora uma mistureba e homenagem às formas arredondadas da mulher brasileira, banquete para trezentos talheres....

Ala 6: "Praga dos Caracóis"
Chacota sobre a preguiça tupiniquim e a velocidade com que as coisas andavam no Novo Mundo, segundo o preconceituoso olhar estrangeiro.

Ala 7: "Praga dos Escorpiões"
Chacota sobre o"veneno" dos tupiniquins, que não perdoavam um vacilo dos  estrangeiros, e estavam sempre a galhofar deles por puro preconceito.

Ala 8: "Rumba Louca das Aranhas"
Chacota sobre a "teia" de maledicências que se formou sobre todos os lados, abrangendo holandeses que tentavam urbanizar o charco que a região do Recife era, infestada de pragas de insetos; brasileiros que se dividiam em apoiar os dois lados de estrangeiros que guerreavam; a corte portuguesa, primeira a chegar e que não queria "largar o osso"; e os judeus "errantes" que acompanhavam Nassau.

Ala 9: "Praga de Formigas e Abelhas"
Chacota sobre o "morde e assopra" que reinava na hipocrisia das relações. De um lado o doce mel e de outro, o fel das mordidas.

Ala 10: "Praga dos Mosquitos"
Chacota sobre as picadas que até hoje assolam o Brasil. Como pode a saúde pública ainda não ter resolvido este histórico problema?

Ala 11 (Baianas): “Carcará /Nassau, pega, mata e come!”.
Metáfora sobre a astúcia, o espírito conquistador e determinado de Nassau, que fizeram dele o governante mais que perfeito, para empreender uma brilhante administração de obras grandiosas e cunho democrático, e perceber o "jeitinho brasileiro". Uma ave de rapina sobre as terras pernambucanas, capaz de prometer o impossível, o Marco Um da Galhofa Nacional.

Ala 12: "Já  Fui Flor do Campo"
Metáfora sobre o início da administração Nassau, cheia de gás, quando as obras se sucediam e ele abalava Bangu em chamas, ou melhor, Recife.

Ala 13 (Bateria): "Falcão dos Guararapes, Rei Corno"
Metáfora sobre o machão brasileiro, capaz de enfrentar os invasores em batalhas sangrentas, com um jogo de cintura invejável. O discurso de conquistar todas as mulheres  ao mesmo tempo, criou esta auto-referência, uma fama que não se sabe se ‚ verdadeira, ou se ‚ o mais legítimo dos "bois voadores": promessa ou dívida?

Ala 14 (Passistas): "As Vacas Loucas"
Metáfora sobre a fêmea brasileira, que sabe usar de seus atributos para conseguir que
"aonde a vaca vá , o boi vá  atrás..."

Ala 15: "Estrangeiros guias"
Metáfora sobre a exploração das riquezas brasileiras pelos povos de "além-mar".

Ala 16: "Brasileiros Papagaios"
Metáfora sobre a crença brasileira que não se cansa de repetir: "tudo o que é bom vem de fora!"

Ala 17: "À Meia Noite eu levarei a tua alma..."
Metáfora a vampirização dos povos "espertos" sobre o terceiro mundo. Homenagem ao mestre do "terrir" do cinema brasileiro, Zé do Caixão.

Ala 18: "Hoje sou Tiririca do Brejo"
Metáfora sobre o  final da administração Nassau, quando os cofres esvaziaram-se e a bancarrota foi decretada.

Ala 19: "O ET de Varginha visita o Arraial “
Sátira aos pagantes esquisitos do Arraial, entre eles o querido interplanetário mineiro, habitante do nosso imaginário popular, e que muito pós-moderno, nos conecta com os “contatos imediatos do terceiro grau”.

Ala 20: "Damas Holandesas Viram a Eguinha Pocotó"
Sátira ao moderno ritmo que infesta os arraiás populares: o funk. As recatadas damas de Flandres enlouquecem na festa do boi e encarnam este "animal-fêmea-fatal" tão comentado pelos brasileiros.

Ala 24 (21): "Veadinhos de Pelotas Visitam Nassau“.
Sátira ao Gay Power que abrilhanta e afrescalha as festas populares do Brasil. Mauricinho recebe a delegação das Drags em "Parada de Orgulho", todas "ouriçadas" para ver o boi voar. (Nota do Carnavalesco: Isto uma tremenda auto-homenagem!)

Ala 22: "Boi Voador Sobre o Recife"
Homenagem à fundação desta Instituição Nacional que é o 171: O vôo impossível, inacreditável e ao mesmo tempo óbvio e revelador do espírito brasileiro. Neste dia o Brasil se redescobre, pois Nassau não é linchado pela população, e sim aplaudido!

Ala 23: "Maracatu da Rã Barbalho"
Sado-Masoquismo sobre quanto custa um ranário. A Milionária Rã da Sudam marca presença, nesta singela homenagem ao Boi, arquétipo de todas as falcatruas.

Ala 25: "Reisado do Grampo Telefônico"
Sado-masoquismo sobre a sobrevivência do "coronelismo" na política brasileira. Até  aonde vai o poder de um dirigente sobre a vida dos cidadãos? Vale qualquer falcatrua para se  manter no poder? O Boi está de olho....

Ala 26: "Caboclinho dos Anões do Orçamento"
Sado-Masoquismo sobre as explicações mirabolantes que os salafrários do para justificar "bois voadores" da atualidade. Não há limites para a irrealidade da obtenção das fortunas. Raios que caem muitas vezes num mesmo lugar.

Ala 27: "Corte Chic do FMI"
Sado-Masoquismo sobre a semelhança da então  corte holandesa com a atual corte internacional. Empréstimos aviltantes, que dificilmente podem ser recusados, e a pose de "bons moços" dos que emprestam. A dívida no pára de crescer, jamais, e o Boi que no para de engordar (qualquer hora dessas ele voa com turbinas supersônicas).

Ala 28: "Palhaço da República das Bananas"
Picardia sobre a idéia que muitos têm de nossa República: de que ela  "levada da breca" e onde tudo  possível acontecer; onde as coisas mais absurdas no provocam a revolta popular.

Ala 29 (Crianças): "Palhaço Meu Ouvido Não é Pinico"
Picardia sobre o futuro das novas gerações, que está o crescendo ouvindo promessas de um país mais justo. Tudo isto convivendo com escândalos e o cansaço dos calejados por bois voadores cada vez mais cabeludos.

Ala 30: "Palhaço Ex-Mulher, Macho sim senhor!"
Picardia sobre estas Damas, abandonadas e em ponto de bala, movendo com suas vinganças a moderna história política brasileira. Elas são as "X-9" dos Bois Voadores da atualidade.

Ala 31: "Palhaço Equilibrista de Pizza"
Picardia sobre a apuração das CPIS e denúncias que acumulam-se em interminável fila. A Expressão "tudo acaba em pizza",  sintomática do descrédito na terra do Boi Voador.

 

SAMBA ENREDO                                                2004
Enredo     Boi Voador sobre o Recife: Cordel da galhofa nacional
Compositores     Jorge Melodia, Noronha, Marcos Zero e Cezar Ouro

A cobra vai fumar
De além mar ao mar de lama
Gostoso é pecar, se lambuzar no mel da cana
Índias que não estão no mapa
Na boquinha da garrafa, cheias de amor pra dar
O tal batavo começou a avacalhar
E como brasileiro gosta de uma obra
Nassau fez até de sobra
Mascarando o leão do norte, lugarejo sem saúde
Onde a maior virtude era viver de armação
Macunaíma, anti-herói idolatrado
Aqui tudo foi tramado pra virar esculhambação

Todo mundo pelado, beleza pura
Todo mundo pelado, mas que loucura
Ninguém segura a perereca da vizinha
É um barato a buzina do Chacrinha

Era a corte um rebu
Se ouvir um sururu vai pra ponte que partiu
Com o laranja endividado
O pedágio foi cobrado, o primeiro do Brasil
O boi voou, começou a roubalheira
A galhofa, a bandalheira pra chacota nacional
Mas tira o olho, ninguém tasca eu vi primelro
Tem muito boi brasileiro pra comer nesse quintal

Aonde a zorra vai parar
Eu tô sofrendo mas eu gozo no final
A São Clemente faz a gente acreditar
Que no Brasil o que é sério é carnaval