"Sou Rei, Sou Salgueiro,
meu Reinado é Brasileiro"
Tanto
pelos pés dos sambistas, quanto pelas mãos dos nossos artistas, toda
a história do Brasil já passou pelo Salgueiro. Neste carnaval 2000,
seguiremos nossa tradição e vamos apresentar na avenida mais um momento
importante da vida brasileira, cumprindo a missão de levar cultura
e entretenimento aos súditos da realeza carnavalesca.
Nosso
enredo vai mostrar o início do amadurecimento do Brasil, quando passou
de Colônia à Reino Unido. Curiosamente, partiu da França a influência
que favoreceu essa transformação: primeiro pela força, com Napoleão
praticamente expulsando a Corte de Portugal; e depois pela arte, com
o legado documental da Artística Missão.
Não compete a nós, salgueirenses, julgar a figura marcante de D. João.
Seria ele um estadista empreendedor, amante da cultura e da ciência
ou um soberano bufão, indeciso, que saiu corrido de seu país? Temos
que retratar a história desse monarca com alegria carnavalesca, deixando
que o público folião faça seu próprio julgamento.
Com
a força da vermelho e branco, decretamos a Abertura dos Portos da
Alegria para a Chegada da Corte de Momo, Elevando e Aclamando o Salgueiro
como o mentor da mais importante das Missões Artísticas: a perpetuação
do Carnaval.
Embarque
conosco nesta Caravela para o Futuro!
A Transmigração da Família
Real para o Brasil
O imperador Napoleão dominava com seus exércitos
o continente europeu. Praticamente o único país capaz de resistir
à supremacia francesa era a Inglaterra, dona de uma poderosa Marinha.
Percebendo que não podia dominar o adversário pela força militar,
Napoleão decide subjugá-lo pela força econômica: decretou, em 1806,
o Bloqueio Continental, determinando que todos os países do continente
europeu sob seu domínio fechassem seus portos ao comércio inglês.
Nessa
época, Portugal era governado pelo Príncipe-Regente, D. João, pois
sua mãe, a rainha D. Maria I, havia enlouquecido. A situação política
de Portugal perante a França e a Inglaterra era extremamente delicada.
Tentava o Príncipe Regente manter uma posição de neutralidade diante
do conflito. Não podia obedecer imediatamente as ordens francesas
temendo - diante do poder naval inglês - perder suas colônias, principalmente
o Brasil.
Em 1807, Napoleão assina com a Espanha o Tratado de Fontainebleau,
que dividia a nação portuguesa entre os dois aliados, e determina
a invasão de Portugal.
Não
dispondo de condições militares para deter o avanço das tropas francesas,
D. João resolveu partir para o Brasil, transferindo a sede do reino
português. A atitude de D. João contava com a ajuda e o incentivo
do governo inglês.
Sob chuvas torrenciais, o embarque da família Real de Bragança e comitiva
composta por 15 mil pessoas ocorre no dia 29 de novembro de 1807.
Num dos seus acessos mais acentuados de loucura, D. Maria I gritava
desesperadamente, protestando contra a partida. Houve lama, choros
e vaias à medida que os passageiros entravam nos navios. Os que se
retiravam levavam todas as riquezas transportáveis dando a impressão
de uma simples fuga precipitada.
Terá
sido mesmo uma fuga desesperada? Há quem defenda a tese de que a idéia
da transmigração da Corte para o Brasil já era aventada nos séculos
anteriores, para o caso de se defrontar Portugal com dificuldades
superiores às suas forças. Transferindo a Corte, d. João salvaria
a monarquia com todas as suas colônias ultramarinas.
Após
55 longos dias de tormentosa viagem, a corte e comitiva desembarcam
na Bahia, encontrando o povo em festa para recebê-los. A realeza se
surpreende com as manifestações de carinho dos súditos de terras tão
distantes e, pela primeira vez, entra em contato com... a alegria
do povo brasileiro ! ! !
A Abertura dos portos às Nações
amigas
Logo ao chegar, durante sua breve estada na
Bahia, D. João decretou a Abertura dos Portos do Brasil às Nações
Amigas, em 28 de janeiro de 1808.
A
abertura dos portos favoreceu os proprietários rurais, produtores
de bens destinados à exportação (açúcar e algodão, principalmente),
os quais se livraram do monopólio comercial da Metrópole. Daí para
frente seria possível vender a quem quer que fosse, sem restrições
impostas pelo sistema colonial.
O
Rio de Janeiro se tornou porto de entrada dos produtos manufaturados
ingleses, com destino não só ao Brasil como ao Rio da Prata e à Costa
do Pacífico.
A
Inglaterra tratou de tirar o máximo de proveito econômico da proteção
que oferecia a Portugal, sendo a maior beneficiada com esse ato do
Príncipe Regente pois iria abastecer o novo mercado com seus produtos
industrializados e consumir produtos tropicais brasileiros.
A
escalada inglesa pelo controle do mercado colonial brasileiro culminou
no Tratado de Comércio e Navegação, em 1810, com a Coroa Portuguesa
se comprometendo a oferecer benefícios tarifários aos produtos ingleses.
Mesmo
sabendo que naquele momento a expressão "nações amigas"
era equivalente à Inglaterra, o ato punha fim a trezentos anos de
sistema colonial, mudando radicalmente... a vida econômica brasileira.
A Corte no Rio de Janeiro
A família real foi recebida no Rio de Janeiro
com indiscutível entusiasmo. A cidade, engalanada, e como em convulsões,
parecia uma só alma em delírio" (Rocha Pombo).
As
festas duraram nove dias e todas as noites a iluminação da cidade
teve o mesmo brilhantismo. A alegria era geral! E ainda por algum
tempo depois pode-se dizer que a cidade continuou em festas pois de
todas as capitanias, até dos pontos mais afastados do interior, vieram,
não só governadores ou seus representantes, bispos ou seus enviados,
como outras autoridades, todos a felicitar o Príncipe e a Rainha.
Não
houve trégua no trabalho das escravas costureiras: vinham encomendas
de todos os cantos, e as compras de fitas, rendas, chamalotes, veludos,
damascos, jóias, galões e outros artigos não tinham limites. As meias
de seda, os sapatos rasos de fivela de ouro e prata, as cabeleiras,
os coletes de cetim bordados e os chapéus armados, tudo subiu de preço.
O comércio português já põe à prova sua esperteza e seu tino comercial.
Foi um rega-bofe completo que durou nove dias sucessivos" (Gostão
Gruls).
A
corte é acompanhada de toda espécie de gente palaciana: mordomo e
fiéis; camareiros e estribeiros; damas de honra e guarda-jóias; guarda-roupas
e gentis-homens, além de personalidades notáveis da nobreza, do clero,
confessores, ministros, cirurgiões e funcionários.
As
diferenças de vestuários, de maneiras e modos de vida entre os lisboetas
e as boas famílias do Rio também provocaram certa estranheza e até
alguns atritos. Tudo isso, contudo, era compensado por um sentimento
de maior segurança e liberdade, propiciado especialmente pela presença
do príncipe regente que representava uma garantia contra os abusos
dos vice-reis e altos funcionários.
Um
novo interesse pela moda se manifestou na população da cidade.
A
cidade era relativamente pequena, não se tendo tomado com antecedência
as medidas necessárias para o alojamento de milhares de acompanhantes
do príncipe. Requisitaram-se inúmeras casas, o que causou transtorno
e indisfarçável revolta da população carioca. Entre outras coisas,
diz-se que as autoridades mandavam marcar as casas requisitadas com
as iniciais P.R. (Príncipe Regente), que o povo interpretava como...
Ponha-se na Rua e também Prédio Roubado.
A elevação do Brasil à categoria
de Reino Unido e a Aclamação de D. João
Após a expulsão dos franceses de Portugal,
em 1814, e portanto não se justificando a permanência do Príncipe-Regente
no Brasil, quiseram os portugueses tradicionalistas que retornasse
a Corte a Portugal. D. João, contudo, tratava o assunto com indiferença.
Em
16 de dezembro de 1815, o Príncipe-Regente assinou uma carta-lei elevando
o Brasil à Reino Unido a Portugal e Algarve de maneira a formarem
um só corpo político. A medida legitimava a permanência de D. João
no Brasil e era apoiada pelos participantes do Congresso de Viena,
reunião dos países que derrotaram Napoleão.
Ao transformar o Rio de Janeiro em sede do Império Português, D. João
reorganizou toda a administração, criando ministérios, fundando o
Banco do Brasil, a Imprensa Régia, a Academia Militar da Marinha,
o teatro São João, a fábrica de pólvora, o Jardim Botânico, a Biblioteca
Real e outras escolas e academias voltadas para a Educação e Cultura.
Essas medidas, porém, não beneficiavam a massa dos "segregados"
escravos, negros livres e mestiços pobres que representavam
mais de 70% da população do país; e sim as elites.
Após
a morte da D. Maria I, em 1816, passou o Príncipe-Regente a usar o
título de D. João VI e foi aclamado Rei em 6 de fevereiro de 1818.
Para
os brasileiros que presenciaram esses acontecimentos, o Brasil estava
caminhando com passos largos para o processo de emancipação pois a
estada da corte portuguesa no Rio de Janeiro ratificava a postura
político-social de igualdade com Portugal.
A
coroação do imperador ocorreu no teatro São João, com honras de um
monarca europeu. Toda a corte e vários convidados vieram participar
de um dos... mais grandiosos e luxuosos eventos realizados no país.
A Missão Artística Francesa
Por sugestão de Antônio de Araújo e Azevedo,
o conde da Barca, D. João VI decide criar uma Escola de Ciências,
Artes e Ofícios na sede da Corte, com o objetivo de promover e difundir
a instrução através de um corpo docente categorizado "importado"
do exterior.
Coube
ao embaixador português em Paris, o marquês de Marialva, a organização
da Missão Artística junto ao governo da França. A comitiva contava
com artistas de renome, artífices, serralheiros, mestre-ferreiro,
gravadores, carpinteiros, curtidores.
Chefiada
pelo literato e crítico de arte Joachim Lebreton, a grandiosa missão
era formada pelo pintor histórico Jean Baptiste Debret; o pintor de
paisagens Nicolas Antoine Taunay; o arquiteto Auguste Herni Victor
Grandjean de Montigny; o escultor Auguste Marie Taunay; o gravador
Charles Simon Pradier; o engenheiro mecânico François Ovide, e o único
suíço da equipe, o compositor e organista Sigmund Neukormm.
Debret
foi o membro do grupo que melhor captou a vida brasileira. Na sua
"Viagem pitoresca e histórica ao Brasil", ele retrata, além
dos eventos palacianos, os costumes do povo, cenas cotidianas com
brancos, negros, índios, o movimento das ruas, do comércio, a fauna
e flora.
Apesar
de sofrer resistências tanto artísticas quanto políticas, a missão
francesa marcou "a ruptura, sob as influências de uma concepção
nova, da arte de tradição colonial de origem portuguesa, e o conflito
entre a arte de expressão litúrgica e o laicismo francês" (Fernando
Azevedo).
O
Brasil até hoje agradece aos artistas dessa missão... o primoroso
legado artístico e documental.
Caravela para o futuro
Ao chegar ao final do enredo, o Salgueiro,
orgulhoso, conclama toda a população para embarcar numa CARAVELA PARA
O FUTURO, com o objetivo de perpetuar, no próximo Milênio, esse momento
mágico que é o Carnaval Carioca, a maior festa popular do mundo, originária
do Entrudo, curiosamente mais uma contribuição portuguesa à cultura
brasileira.
Fundindo
o novo e o velho, convidamos reis, rainhas, aristocracia e povo, pretos,
brancos e índios, artistas e sambistas para o embarque, cabendo ao
Salgueiro de braços dados com as escolas co-irmãs - a responsabilidade
de conduzir a NAVE DA ALEGRIA E ESPERANÇA nas comemorações dos 500
ANOS DO BRASIL, rumo ao 3º MILÊNIO.
PARABÉNS BRASIL, PARABÉNS SALGUEIRO,
PARABÉNS
A TODO O POVO BRASILEIRO !!!
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