Os dez mandamentos! O Samba da paz canta a liberdade
Para
o bem vencer o mal, trago fé no coração.
Pra
acabar com a tirania uno o povo num cordão.
Faço
paz com alegria abraçando meu irmão.
Mangueira
exalta os valores universais. E busca na História, assim mesmo de memória,
no tempo que vai longe, uma bela trajetória. Conta a saga de uma luta
contra um ódio de dar dó: o de um rei sem piedade, caricata majestade,
e que era faraó.
Ramsés! Ó grande
Ramsés!
O Egito e o mundo se curvam a teus pés!
Teu poder, temido faraó, se espalha por toda parte. As fontes da
vida e as causas da morte estão na divisa do teu estandarte.
Sem
que ordenes, nada se move - nem o mar, nem o vento ou tempestade. A
lua e o sol só brilham no céu por tua vontade.
A força
de teus exércitos subjuga qualquer resistência. Nada se opõe aos ditames
da tua prepotência.
Nunca se
viu tamanha riqueza nem tanta fartura. Mas fora da corte, na aldeia
vizinha, a lida do povo é vida sem norte, realidade dura.
Escravos
hebreus que vivem na lama com barro e com trigo preparam o tijolo que
ergue a cidade. Na alma e no peito, na mente de todos, um só sentimento
- sonhar liberdade.
Cada dia
que passa o povo lamenta a própria desgraça. São muitos, são tantos,
que um dito ecoa em tom promissor: ali vai nascer, crescer e viver,
o libertador. Ramsés não perdoa tamanha insolência! Precisa com urgência
deter o perigo de tal previsão; manda matar os recém nascidos para assim
impedir sua consumação.
Um deles
escapa, a mãe o salvou. Num cesto flutua, nas águas do Nilo, até ser
recolhido num nobre solar: ironia do destino, o lar do menino é o palácio
de quem o mandara matar.
Criado na
pompa de um mundo rico que nunca foi seu, o menino Moisés cresce ao
revés da própria origem, o berço plebeu. Mais tarde, homem feito, traz
dentro do peito o carisma dos bons. E provoca a ira do irmão por acaso
- Ramsés, ao contrário, desprovido de dons.
Um dia porém
a verdade se mostra. E o Moisés poderoso, que no luxo morava, decide
voltar para junto dos seus na aldeia escrava. E escravo se torna, na
lida da vida da gente da lama que sofre calada e nem mesmo reclama.
Que vida
é aquela? - e Moisés se rebela, afronta Ramsés. Organiza seu povo e
ensina que a fonte da vida, o amor, só pode cumprir sua sina se o homem
for livre, sem amo ou senhor. Detido e banido, nas mãos um cajado, é
jogado ao deserto. À frente apenas um futuro incerto. Ele vaga sem rumo,
perdido no mundo, só ele e sua fé. Procura justiça... uma força divina,
não sabe o que é.
Só muito
mais tarde enfim se abriga na tenda amiga de quem lhe quer bem. E forma
família, renasce pra vida não mais tão sofrida, é tudo o que tem. Pastor
de ovelhas, não esquece porém do passado um instante; nem da vida sofrida
na aldeia perdida no Egito distante.
Em busca
de alívio ele sobe a montanha e clama aos céus. E sua prece contrita
ganha a graça divina de ouvir de um clarão: tu és o eleito pra guiar
teu povo na luta bendita da libertação.
De volta
à aldeia, Moisés desafia a força do algoz. Adverte Ramsés de mil desventuras
e um martírio atroz. E exige, de novo, a libertação do seu povo. O faraó
acha graça, desdenha a ameaça - É meu o poder! - e paga pra ver. A desgraça
desaba e espalha na corte um gosto de fel: dez pragas se abatem, é a
ira divina que o chão contamina e turva o céu.
Acuado e
vencido, o faraó se curva à vontade de Deus - e ordena enfim a libertação
dos judeus. O povo da lama está livre do jugo do algoz Ramsés. E começa
a partida rumo à terra prometida, tendo à frente Moisés.
Ramsés se
arrepende e manda o exército matar toda gente à beira do mar. Mas Deus
é presente e, onipotente, separa as águas pra caravana passar. Libertos,
enfim, Moisés e seu povo retomam de novo a rota traçada do seu Canaã
- a terra sagrada, por Deus destinada a ser o abrigo, o seguro amanhã.
O tempo
que passa não muda a desgraça da ausência da sorte e um povo sem norte
se cansa de ouvir. Moisés foi em busca da voz que conforte, que mostre
aos judeus que a graça de Deus vai nos redimir. Subindo a montanha,
sua fé é tamanha que nada o desvia da crença que tem em um novo porvir.
Mas o povo
sofrido, sem leis e sem líder, se perde na sanha da degradação. A orgia
se instala, sinistra façanha das trevas que levam à total perdição.
Não falta quem leve, em tal situação, um povo à blasfêmia ou qualquer
maldição.
À falta
de um guia que conduza ao bem, o mal se espalha e a todos conquista.
O deus da cobiça é agora quem fala pregando a descrença, que é mais
"realista". E surge, então, um símbolo novo pro povo adorar:
um bezerro de ouro, de porte imponente, pra que toda a gente se sinta
contente a beber e cantar.
Mas, que
desatino, se o próprio destino começa a mudar! A força da fé, que Moisés
ensinou, está prestes a pôr tudo em ordem outra vez e no mesmo lugar.
Um clarão rasga o céu e no monte sagrado a palavra de Deus começa a
ditar: são os Dez Mandamentos e os seus fundamentos hão de a todos salvar.
Nas tábuas
gravada, é a vontade de Deus afinal revelada. A razão prevalece e salva
o povo da insânia malsã. Os Dez Mandamentos, erguidos em prece, são
um sol a brilhar no frescor da manhã.
Lei das leis, voz serena da verdade, um código de ética para toda a
humanidade. Desde então, em cada religião, os homens de bem se inspiram
nas tábuas em sua pregação. E fazem da essência do seu conteúdo o marco
supremo da libertação.
No Brasil,
desde sempre, os povos se irmanam sem ódio ou rancor. Exemplo pro mundo
de raro esplendor, tens saber profundo - és a pátria do amor.
Sabem todos
agora as lições da verdade: o homem nasceu para ter liberdade; diferença
de crença em cada cabeça não deve impedir que o amor prevaleça; e a
paz, meu irmão, se faz como aqui - no convívio fraterno e na alma sem
mágoa que cada pessoa traz dentro de si.