FICHA TÉCNICA 2000

 

Carnavalesco     Alexandre Louzada
Diretor de Carnaval     Percival Pires
Diretor de Harmonia     Olivério Ferreira (Xangô da Mangueira)
Diretor de Evolução     Olivério Ferreira (Xangô da Mangueira)
Diretor de Bateria     José Luis Custódio (Mestre Russo)
Puxador de Samba Enredo     José Bispo Clementino dos Santos (Jamelão)
Primeiro Casal de M.S. e P. B.     Marco Antônio Rodrigues e Giovana da Silva Justo
Segundo Casal de M.S. e P. B.     Ubiraci Lima de Oliveira e Elaine Fernanda Bispo
Resp. Comissão de Frente     Avelino Pacheco & Carlinhos de Jesus
Resp. Ala das Baianas     Neuci da Silva Gomes
Resp. Ala das Crianças     Regina Bordalo e Helcy Gonçalves da Silva

 

SINOPSE 2000

DOM OBÁ II - REI DOS ESFARRAPADOS, PRÍNCIPE DO POVO

Introdução

            A Estação Primeira de Mangueira celebra os 500 anos do Brasil exaltando a saga da raça negra, num tributo àqueles que, oprimidos e vilipendiados, cultuaram a liberdade como um bem inerente à condição humana.
Mais que o mero culto à liberdade, ressalta a verde-e-rosa a luta cotidiana pela igualdade, temperada no sofrimento de sucessivas gerações de negros que acabaram por constituir a mais importante das matrizes étnicas do que hoje se conhece por povo brasileiro.
            Inovadora, a Mangueira não foi buscar inspiração entre os heróis da raça. Apesar da sua profunda admiração e respeito pelos mártires da Abolição, que foram milhares, quem sabe milhões, de Zumbi dos Palmares aos guerreiros de todos os quilombos, preferiu a Estação Primeira beber na fonte da gente simples e urbana do povo do Rio de Janeiro da segunda metade do século XIX.
            É desse Rio dos desvalidos, da ralé dos cortiços, que emerge a figura majestórica de Dom Obá II d´África, o rei dos esfarrapados, príncipe do povo. Baiano de Lençóis, voluntário da Pátria na guerra do Paraguai, de nascimento Cândido da Fonseca Galvão, trazia nas veias o sangue azul da realeza iorubá de seus ancestrais africanos de Oyó.
Senhoras e senhores, nobres e plebeus. O quilombo da Mangueira do qual se originam sua altivez e seu acendrado amor à liberdade, entra na avenida com garra e com alegria, com samba no pé e, este ano, com um redobrado orgulho da sua gente e da sua raça. E pede passagem.

Oswaldo Martins

Sinopse do Enredo

            Salve, mãe África! De Ogum, de Oxossi e de todos os orixás! Axé, mãe África da nação ioruba, de um lugar chamado Oyó, berço do primeiro Obá! Obá, rei do seu povo, em Oyó, como em qualquer lugar. Rei a vida inteira, a que passou e a que virá, onde haja luta para lutar.
            Filho de rei, rei também é. Rei até na Bahia, em Lençóis dos Diamantes, onde nasceu Cândido da Fonseca Galvão, o Obá II, herdeiro de sangue do legado secular. Lençóis de muita riqueza, a "Corte do Sertão" de Iaiá Douradinha, coberta de jóias, de muita ostentação. De onde Galvão saiu alferes, com seu batalhão de zuavos, todos negros, todos belos, para defender a amada pátria na guerra do Paraguai.
            Voluntários da Pátria, heróis de Tuiuti e de mil e tantas batalhas no chaco, na ponta da espada, no fio do sabre que Chico diabo cravou no peito do chefe inimigo.
            Em tempo de paz para todo soldado, resta a glória que fica retida em sua memória e, na posteridade, uns parcos registros nos livros de história.
            Alferes Galvão, herói nacional, tua luta não pára. Ferido, esquecido entre teus pares não serás um pária. O sangue iorubá que vem de Oyó ferve nas veias e dita tua sina. Um rei é um rei, na pompa do trono ou na imunda esquina.
E, no Rio dos condes, viscondes do casario senhorial, da pompa sem conta da corte imperial, a vida retoma seu curso normal. Esse mesmo rio de fausto e beleza é do outro lado do Rio do Mangue, da lida de tantos, de tanta pobreza.
            Esse lado do rio, muito tempo depois, foi Heitor dos Prazeres quem um nome botou: África Pequena. África pequena era tudo, menos serena. E mesmo o "serena" só tinha sentido se comparada à verdadeira, d´além mar, lá onde Abiodun fundou o reino de Obá.
            Gamboa, Saúde, Santo Cristo, Santana... era esse o território dos desvalidos, dos deserdados da sorte, onde o alferes Galvão fincou sua bandeira. Altivo, destemido, ousado, era o rei que faltava, o líder de um povo que nada mais esperava.
            Dom Obá II d´África, o rei dos esfarrapados, príncipe do povo, imperava nas ruas como se fossem suas e desfilava seu porte majestoso de fraque e cartola, pince-nez de ouro, guarda-chuva e bengala.
            Vivendo em meio a tanta desgraça só mesmo a cachaça o fazia sonhar. "Me respeitem!", bradava e a todos lembrava a Oyó de ancestrais. Falava de um trono talhado em ouro que o brilho do Sol fazia cegar. Contava de um rei que ao pai pertenceu, onde o preto era livre e a vida do povo uma bênção dos céus.
            "Ó, África Pequena, por que não imitas o éden de Oyó"? Nos delírios de Obá, o rei da ralé, o rio "de cá" carecia festar. Do cortiço gigante, o Cabeça de Porco, Dom Obá pretendia um dia tirar os dois mil habitantes com tralha, com tudo e ali instalar um trono dourado. O rei da gentalha, dos loucos e dos desgraçados, dos famintos e dos açoitados sonhava criar um reino opulento onde todos, libertos, pudessem dançar.
            Em seus desvarios, Obá só pensava num jeito de ter, em meio a pobreza e de tanta tristeza, um reino real, com liteira e finesse, coroa e arauto e todo aparato que um rei deve ter.
            Real era a vida. E quando o porre passava, tudo voltava ao seu lugar. As tias baianas com seus tabuleiros vendiam quitutes, bolinhos, docinhos, manjares do céu. Ciata de Oxum, Carmem da Praça Onze, Bebiana das Botas e Josefa da Lapa, que subiu na vida quando abriu um bordel.
            No rio "de cá", a lama e o lixo. Ruelas com pobres, com porcos, cachorros, galinhas, fedor. No rio "de lá", a pompa e o luxo. Na corte, os nobres faziam da vida um eterno esplendor. Nas festas do Paço, nas ruas do Centro, em salões de palácios com leque e rapé, sinhá desfilava a moda importada e nem reparava que havia ralé.
            Mas havia Obá.
            Grandalhão, mas elegante, finório, falante, semana sim, semana não ele estava lá. Na sala de recepção, onde Dom Pedro recebia com enorme fidalguia os plebeus de seu império. Herói de guerra e brasileiro, Obá porém preferia usar a pompa que escolhia, de dignatário estrangeiro. Rei d´África, altivo, queixo erguido, peito inflado, beijava a mão do Imperador sem jamais perder o ar de enfado.
            O populacho exultava quando Obá exibia seus dotes superiores. E a maioria, naquele reduto, o seu rei remunerava com uma espécie de tributo. O dinheiro dos seus súditos tinha sempre a mesma destinação: botar artigos nos jornais, que Obá escrevia, deitando falação. Nada escapava `Pa sua pena delirante. E ai de quem o amolasse! Seu alvo predileto era a elite dominante. Elite decadente logo se veria. A princesa Isabel, num gesto feliz, mudou a história e libertou o país. Abolição! Liberdade! Tardia verdade...
            O povo sofrido da África Pequena saiu pelas ruas e se pôs a cantar. Em todo o Rio, mais de cá do que de lá, só havia festa no reino de Obá. A massa cismou de aclamar a princesa e à Quinta rumou sem saber da surpresa. Ao lado da Quinta há um morro, há muito habitado por gente simples e tão pobre, que só tem o Sol que a todos cobre, mas que sabe sambar.
            Obá foi quem viu e jura por Deus que a cena é real, visão verdadeira. Isabel, a princesa, de porta-bandeira sambando animada no alto do morro chamado Mangueira. E quando saiu, suada, aclamada, beijou um menino. Um menino franzino de nome Saturnino.

 

SAMBA ENREDO                                                2000
Enredo     Dom Obá II – Rei dos esfarrapados, príncipe do povo
Compositores     Marcelo D´Aguiã, Bizuca, Gilson Vermini e Valter Veneno
Axé, mãe África
Berço da nação Iorubá
De onde herdei o sangue azul da realeza
Sou guerreiro de Oyó
Filho dos orixás

Vim da corte do sertão
Pra defender nossa pátria
Mãe gentil
sou don Obá o príncipe do povo
Rei da ralé
Nos meus delírios, um mundo novo
Eu tenho fé

No rio de lá
Luxo e riqueza
No rio de cá
Lixo e pobreza

Freqüentei o palácio imperial
Critiquei a elite do jornal
Desejei liberdade
500 anos Brasil
e a raça negra não viu
O clarão da igualdade
Fazer o negro respirar felicidade

Sonho ou realidade
Uma dádiva do céu (do céu, do céu)
Vi o morro da Mangueira
Sambar de porta-bandeira
A princesa Isabel