FICHA TÉCNICA 2002

 

Carnavalesco     Marcello Portella
Diretor de Carnaval     Ulisses
Diretor de Harmonia     Aloisio Pagodinho
Diretor de Evolução     Aloisio Pagodinho
Diretor de Bateria     Mestre Nivaldo
Puxador de Samba Enredo     Julio Negão
Primeiro Casal de M.S. e P. B.     Fábio & Ediléia (Lea Sorriso)
Segundo Casal de M.S. e P. B.     ................................................................
Resp. Comissão de Frente     Gabriel
Resp. Ala das Baianas     Marta
Resp. Ala das Crianças     Glória

 

SINOPSE 2002

Deus ajuda a quem cedo madruga?

             A antiga enciclopédia de Moral e Civismo do MEC define O TRABALHO como: Toda aplicação de força física ou intelectual pela qual o homem transfigura a natureza para colocá-la a seu serviço ou à disposição do bem comunitário, do progresso e do desenvolvimento sócio-econômico de uma Nação.
Já para o Cristianismo, O TRABALHO é um dever essencial a todo cidadão e se funde numa dupla vocação que o homem recebe de Deus, atribuindo-lhe
             Uma apologia AO TRABALHO é a proposta de enredo do  GRES FOLIÕES DE BOTAFOGO para o carnaval 2002. Nossa intenção é, através deste tema, fazer um breve estudo dos principais aspectos da economia do nosso país, desde o seu descobrimento, e, ao mesmo tempo, questionar se há algum fundo de verdade neste antigo ditado quando diz que: “DEUS AJUDA A QUEM CEDO MADRUGA.”

Histórico do Enredo

             Para que qualquer Nação se desenvolva, é necessário que sua população ativa seja a maior possível pois a força do trabalho representa a base para toda e qualquer economia mundial, permitindo ao homem transformar a natureza para a produção dos bens materiais necessários à sua existência.
             Entretanto, a Igreja Católica premia o trabalho com um duplo sentido celestial que justifica o conhecido dito popular “DEUS AJUDA A QUEM CEDO MADRUGA”. Para o catolicismo, o esforço físico ou mental, credita aos homens a vocação de prolongar, pela força do trabalho, a obra do criador, explorando as potencialidades da natureza e realizando assim a sua própria plenitude.
             Além disso, a tradição bíblico-cristã reconhece que todo o trabalho é penoso, e ela assume essa pena, imposta por Deus a Adão durante sua expulsão do paraíso, atribuindo ao trabalho um valor de reparação, de purificação  e de redenção: 
             “- Comerás o teu pão com o suor do teu rosto...” (gênesis, versículo3)
              A História do Brasil registra que os índios trabalhavam em comunidade, recolhendo da natureza apenas o que necessitavam para o consumo da tribo. Eles caçavam, pescavam e moldavam diversos objetos em barro. Este método rudimentar de trabalho foi o primeiro a ser observado pelos historiadores no Brasil.
              Quando os colonizadores chegaram a nossa terra, o único produto de algum valor comercial que Portugal acreditava existir por aqui era o pau-brasil. O contato com o povo indígena permitiu aos portugueses se empenhar na exploração do vegetal usando o auxílio do próprio índio como mão-de-obra. Os nativos cortavam as árvores e traziam a mercadoria até os navios; em troca, recebiam dos “homens brancos” objetos de pouco valor.
             Esta filosofia simples de vida fêz com que o indígena resistisse intensamente às exigências do trabalho servil.
              A introdução do braço escravo no Brasil foi devido ao estabelecimento da indústria açucareira. Para assegurar o inevitável progresso da cultura da cana, negros Bantos foram trazidos da África para executarem serviços pesados em lavouras, canaviais e nos engenhos de açúcar.
A febre do ouro foi outro fator que intensificou o tráfico negreiro no Brasil, desequilibrou a economia e interferiu nos aspectos sociais da colônia. A notícia de grande quantidade do metal descoberto em Minas atraiu uma população de estrangeiros e muitos “Senhores de Engenho”, seduzidos pelos altos preços que lhes ofereciam, venderam seus escravos para que acompanhassem os mineiros pelo vasto e desconhecido território durante os delírios do sonho aurífero.  Quem tivesse maior  número de escravos tinha preferência na escolha das áreas de mineração.
             Com a abolição da escravatura o sistema colonial se desestruturou. O negro, livre, passou a viver do pequeno comércio ambulante nos centros urbanos das cidades e, com sua indumentária exótica e colorida, dava um caráter alegre e despreocupado às ruas como em cenas que foram imortalizadas pelo pintor Debret.
             Outros grupos significaram abundante mão-de-obra, e barata, para os fazendeiros que viviam da cultura do algodão. A produção alcançara o seu apogeu na segunda metade do século XVIII mas encontrava-se em declínio. Mesmo assim, o produto determinaria o surgimento da indústria têxtil, uma das mais importantes para a economia do país no final do século XIX.
             A liberdade conquistada permitiu que o negro tivesse melhor condição para preservar sua cultura e religião. Do contato com os índios e com o catolicismo romano,  surgiu uma nova espécie de culto, a Umbanda.
             No sincretismo religioso, a imagem de São Jerônimo é associada ao orixá Xangô dos umbandistas. Este orixá é o patrono do trabalho na umbanda e suas oferendas são preparadas nos terreiros e colocadas, posteriormente, numa pedreira.  Aqueles que não pertencem a esta religião costumam classificar estas oferendas como “trabalhos de macumba”.
             Com a decadência da produção de ouro e das lavouras tradicionais - da cana-de-açúcar e do algodão - a agricultura ressurgiu com um gênero que, em meados do século XIX, já despontava como o principal produto agrícola do país: O café.
             A abolição, no entanto, trouxe sérios problemas para a lavoura cafeeira, mas a solução veio com o pioneirismo do Senador Nicolau de Campos Vergueiro, fazendeiro do estado de São Paulo, que num período de quase 10 anos, recebeu mais de 70 famílias para trabalharem como assalariados em sua fazenda.
             Os trabalhadores que imigraram para o Brasil eram originários de áreas rurais: Alemães, portugueses, japoneses e italianos ocuparam o lugar dos antigos escravos em troca de remuneração e moradia.
             Os imigrantes contribuíram muito para o cultivo de outros produtos. Enquanto os italianos se concentraram, basicamente, nas lavouras de café, os alemães iniciaram a viticultura – plantio da uva – sendo os primeiros a produzir vinho em terras brasileiras. Já os colonos Japoneses se especializaram no plantio do trigo, um dos principais produtos agrícolas do seu país de origem. A triticultura, abandonada pelos portugueses no século XVII, foi redescoberta para a exportação sob a forma de grão ou de farinha. 
             Tanto nos aspectos econômicos quanto nos culturais, esses homens foram de grande importância no processo de engrandecimento da nossa Nação. Os Estados brasileiros mais prósperos são, justamente, os que receberam a influência dos imigrantes que, com seu suor, contribuíram para uma nova era do trabalho no Brasil.
             Paralelo ao período de expansão do café, a borracha tornou-se um importante produto para as exportações brasileiras por ser uma das principais matérias-primas industriais. A explosão do látex motivou a ida de inúmeros nordestinos para a Amazônia e trouxe luxo e riqueza para os Barões da Borracha, mas reservou doenças e misérias para os seringueiros.  Após sua decadência e com a grande crise do café, verificou-se, no Brasil, uma marcha acelerada para a industrialização e uma forte tendência para a policultura, com merecido destaque para o plantio do cacau, cujo a produção estava ligada a indústria do chocolate na Inglaterra e nos Estados unidos.
             A policultura revelaria mais explicitamente a exploração da mão-de-obra   agrícola e a dura realidade dos “bóias-frias”, trabalhadores rurais que permaneciam nas periferias das cidades à espera de caminhões que os levassem às plantações ou colheitas de frutas no norte e nordeste do país.
             A industrialização, porém, provocaria o desenvolvimento das grandes cidades, estimulando o surgimento de uma classe constituída de trabalhadores da indústria e do comércio, dando início ao movimento operário no nosso país.
             Foi o imigrante italiano quem divulgou as idéias de organização operária que aconteciam na Europa. As reivindicações dos operários eram contra os baixos salários, o número excessivo de horas de trabalho e suas péssimas condições. Aqueles que se uniam a este movimento usavam, como forma de protesto, uma bandeira vermelha e eram chamados pelas autoridades de anarquistas.
             Com a crescente urbanização e modernização da cidade ocorrida ainda no início do século XX, vários cortiços foram demolidos deixando desabrigadas milhares de pessoas humildes. Associada a isto, a falta de oportunidade de trabalho no campo aumentou o número de migrações para as cidades, iniciando um processo de favelização nos morros do município do Rio.
             Essa situação de marginalização social, a vida da gente pobre e mestiça dos bairros pobres e das favelas, constituía um vasto material para a música, desde a mulata, até os próprios barracos. Várias canções exaltavam a vida boêmia do final dos anos 20 e a imagem do malandro que, com seu estilo de vida descompromissado e lucrativo, conseguia viver – e sobreviver – bem, sem trabalho fixo.              As letras dessas canções desagradavam demasiadamente as autoridades.
             Foi num ambiente assim que nasceu a primeira escola de samba do Rio de Janeiro, a Deixa Falar, formada por compositores do bairro do Estácio, onde havia muitos operários e artesãos. No ano seguinte, outro grupo de compositores fundaria a Estação Primeira de Mangueira.
             O governo que assumiu em 1930 percebeu que poderia utilizar a organização das escolas de samba para seus próprios interesses. O prefeito do Rio decidiu que distribuiria verbas para as agremiações, desde que elas atendessem a determinadas normas, tais como, a de escolher nomes mais a gosto das autoridades e temas que enaltecessem a pátria, o incentivo ao trabalho e não à malandragem.
             Estava surgindo assim, a partir do ano de 1932, o DESFILE OFICIAL DAS ESCOLAS DE SAMBA DO RIO DE JANEIRO, promovido, na ocasião, por uma iniciativa do jornal Mundo Sportivo.
E, baseando-se nesse fato, que foi o ponto de partida do que hoje é reconhecido como o maior espetáculo audiovisual do mundo, aproveitamos nosso enredo para lembrarmos dos 70 anos desse primeiro desfile que, apesar de sua transformação em espetáculo turístico, é expressivamente baseado na cultura popular, ganhando terreno em alguns pontos e adaptando-se a outros, mas sem nunca abrir mão de toda a sua malandragem, afinal, essa cultura resistiu a mais de três séculos de regime escravista e não seria a elitização dos últimos setenta anos que iria abatê-la.
             Na verdade, o próprio carnaval, tem sido uma tribuna livre para repassar a nossa história e questionar os problemas sociais do país, e é por isto que o    GRES FOLIÕES DE BOTAFOGO, se aproveita desta mesma tribuna para mostrar como a força da mão-de-obra de tantos homens foi a base para a construção da economia desse imenso Brasil.
             Desta forma, esperamos conscientizar a todos de que o importante é que cada vêz mais homens tenham oportunidades de emprego, e que, com sua contribuição, possam influenciar, ainda mais, no fortalecimento da nossa economia. Somente assim, pela força do trabalho e pelo enobrecimento que ele causa a alma humana, influenciando diretamente no bem estar de toda a sociedade, é que poderemos afirmar, como diz o velho ditado:
“DEUS AJUDA A QUEM CEDO MADRUGA!”

Sinopse do Enredo

             Quando a lua na imensidão escura ainda brilha e os primeiros raios de sol começam a despontar no horizonte, o manto azul do céu adquire um tom lilás, indicando o fim da madrugada e o início do alvorecer de um novo dia.
             É nessa hora que o lavrador do campo, o operário, o bóia-fria, o peão e tantos outros, de tantas classes trabalhadoras, despertam para a luta do dia-à-dia, adquirindo um caráter celestial, pois, como os anjos, sabem que podem, com a força do seu trabalho, auxiliar e completar a esplêndida obra do criador, compreendendo que, por isso, Deus os ajuda - abençoa - permitindo que a luta do trabalho os favoreça na redenção de seus pecados e a na purificação de suas almas.
             Sabendo que trabalhar é preciso os nossos índios retiravam da natureza o que necessitavam para o seu consumo. Eles viviam tranqüilamente da caça, da pesca e de suas modelagens em barro, quando o colonizador chegou e, com sua ambição, usou a mão-de-obra do índio para explorar o pau brasil.
             Não conseguindo escravizar o índio, o "homem branco" trouxe negros bantos para os engenhos de açúcar e os canaviais. Mas o negro também sofreu e muito suou com a febre e os delírios do ouro em Minas Gerais.
             Eis que surge a liberdade e o negro, livre, passou a viver do comércio na cidade, enquanto outros, padecendo com a exploração, foram trabalhar em fazendas que viviam do plantio de algodão.
             Libertos do "Sinhô", os negros, macumbeiros, puderam cultuar seus orixás e arriando seus trabalhos de macumba na pedreira, pediam proteção e carreira nos cantos em louvor ao pai Xangô. Mas os terreiros do negro foram invadidos pelo italiano, o japonês e o alemão, a mão-de-obra que veio d’além mar (de além mar).
             Os imigrantes, semearam outras culturas em nossa terra, e com seu suor, muito contribuíram para o progresso da nossa Nação e o engrandecimento da nossa economia, principalmente os italianos que substituíram os antigos escravos e representaram o braço forte das lavouras do café.
             O ciclo da borracha atraiu o cabra-da-peste do nordeste, que migrou para o norte mas por lá só encontrou, também, a exploração dos "barões da borracha", doenças e misérias.
             Após a decadência do látex e da crise do café, o Brasil entendeu que era preciso passar da monocultura para a policultura, obrigando os "bóias-frias" a saírem de sua terra em busca de trabalho, embrenhando-se pelo mato e pelas estradas do país conforme a necessidade de mão-de-obra nas colheitas de frutas tropicais, com merecido destaque para o plantio do cacau.
             A crescente industrialização fêz surgir o movimento operário contra a exploração da mão-de-obra do trabalhador. Muitos homens do campo, em busca de melhores oportunidades, vieram para as grandes cidades trabalhar nas indústrias, mas com as poucas chances de emprego e com os baixos salários, acabaram povoando morros e favelas.
             Ali eles se juntaram aos descendentes dos antigos escravos formando comunidades marginalizadas pela sociedade. A mistura dessa gente pobre e mestiça permitiu o surgimento de uma classe de malandros, artesãos e operários que encontraram na sua amarga condição, motivos para driblar as tristezas e inspirar canções. A mulata, o barraco, a boemia, a malandragem eram temas constantes dos sambas que desceram do morro e conquistaram seu espaço na cultura musical, ocasionando a criação da primeira Escola de Samba, surgida no morro do Estácio, a Deixa Falar.
             Logo outras Escolas também surgiram e as autoridades, incomodadas com a exaltação à malandragem, decidiram intervir organizando o primeiro desfile oficial ocorrido há 70 anos atrás, em 1932.
             Mesmo com a organização imposta por uma sociedade elitista, as Escolas de Samba jamais renegaram o seu passado. Elas são descendente direta de uma mistura de índios, escravos, imigrantes e nordestinos.
             Sua raiz é composta pela riqueza cultural dessa gente que tanto trabalhou para construir esse país, por isso, essa raiz resiste a qualquer manipulação e, mesmo sendo um trabalhador, o sambista, na sua essência, é o eterno malandro que, como seus antepassados, dribla as dificuldades do dia-à-dia e renasce a cada ano, nos aplausos que recebe na avenida.

Marcello Portella

Pesquisa Histórica do Enredo

Livros:

  • Evolução econômica do Brasil
    Mircea Buescu - APEC Editora
  • O trabalhador rural no Brasil
    Rusinete Dantas de Lima - Editora LTR
  • História da Indústria e do trabalhador no Brasil
    Francisco Foot & Vitor Leonardi - Global Editora
  • Estratégia social e desenvolvimento
    João Paulo dos Reis Velloso - Editora Olympio
  • A classe operária no Brasil
    Paulo Pinheiro & Michael M. Hall - Editora Brasiliense
  • Economia brasileira - Uma visão histórica
    Paulo Neuhaus - Editora Campus
  • História do carnaval carioca
    Eneida - Editora Civilização Brasileira
  • As escolas de samba do Rio de Janeiro
    Sérgio Cabral - Editora Lumiar

revistas e enciclopédias:

  • Revista Mangueira 70 anos
  • Pequena enciclopédia de moral e civismo
  • Enciclopédia Delta Larousse
  • Revista Brasil - Histórias, costumes e lendas

 

SAMBA ENREDO                                                2002
Enredo     Deus ajuda a quem cedo madruga
Compositores     Tuninho Azevedo, China, Cláudio do Cavaco e Marcella

Brilhou no horizonte a liberdade
Desperta trabalhador
Com as bençãos do criador

Agradeço pelo novo dia

ANJOS iluminai o meu caminho
Vou seguir o meu destino
Para poder trabalhar

Índios com sua miscigenação
Vivendo com a natureza
Não se deixou escravizar

É pau brasil, ouro, canaviais
Peço a benção do senhor Xangô
Não me deixa sofrer demais

Culturas para o progresso da nação
Os imigrantes de além-mar....
Cabra-da-peste, sou do Nordeste !
No ciclo da borracha e do cacau
Sou bóia-fria na colheita tropical
(na era)

Na era da industrialização
Oportunidades, foram poucas podem crer
E nos morros e favelas, surgia a malandragem
Com a pressão da autoridade
O samba pede passagem

FOLIÕES vem aí para sacudir
Com a explosão da bateria
Vamos aplaudir