Negra Origem, Negro Pelé, Negra Bené
Argumento:
A
partir de 1982. ano de seu ingresso no seleto grupo das grandes Escolas
do Carnaval Carioca, a CAPRICHOSOS vem marcando um estilo crítico, alegre
e irreverente. E o seu jeito, seu estilo de contar, de apresentar um enredo,
e sempre faz isso assumindo posições corajosas, como, por exemplo, exigindo
DIRETAS JÁ, em 1985, enfocando autonomia CULTURAL, em 1986, criticar o
sistema político, em 1987, reafirmar a convicção de que o PETRÓLEO ÉNOSSO,
em 1992, ou apontar as diferenças sociais no enredo NÃO EXISTE PECADO...
em 1993 e daí por diante.
A CAPRICHOSOS é assim mesmo, decidida, ousada, corajosa a ponto de contar
e cantar o momento presente, o dia-a-dia. E consegue aliar critica e alegria,
assumindo compromissos descompromissadamente... sambando, o que é melhor.
Certamente, por conhecer a própria casa e a sua estrutura, a Presidência
convoca a Comissão de Carnaval da Escola e sugere uma homenagem para a
RAÇA NEGRA, pelo seu valor e importância.
E é isso que vamos fazer com a cumplicidade dos nossos irmãos negros,
da própria comunidade, montando e mostrando este enredo no Carnaval/98:
NEGRA ORIGEM, NEGRO PELÉ, NEGRA BENÉ
Desenvolvimento:
Para melhor entendimento e concepção plástica, o enredo será dividido
em 6 quadros:
-
Negra Origem
-
Contribuição Negra
-
Negro Trabalhador
-
Consciência Negra
-
Luta Negra
-
Expectativa Negra
Desde a antigüidade. o homem questiona sobre a sua origem, procurando
encontrar resposta para o seu aparecimento. Mesmo respeitando e considerando
cada versão religiosa explicando o fato, consideremos a teoria científica,
com os mais recentes tratados sobre o nosso aparecimento.
A ciência dá conta de que o primeiro homo-sapiens teria surgido há milhões,
talvez bilhões de anos, no Continente Africano, o que aumenta a probabilidade
de que esse primeiro espécime seria da RAÇA NEGRA, e essa teoria nos faz
acreditar que estaremos homenageando em nosso enredo, não apenas uma raça,
mas certamente a raça-mãe, a geratriz de toda a espécie, a RAÇA NEGRA.
Portanto, iniciaremos o nosso enredo lembrando a MÃE
ÁFRICA, incubadora
da raça, destacando seus diferentes povos e etnias, crenças, modos, modas
e costumes. E eram Quiloas, Rebolos, Congos, Angolas, Bantos, Jêjes, Nagos
e Yorubás. E eram NEGROS.
A expansão da RAÇA NEGRA, não se deu apenas a partir do descobrimento
do fogo, das técnicas para caça, mas, especialmente, pelos deslocamentos
em diversas direções e muitos séculos se passaram até acontecer o desembarque
em outros continentes.
Especificamente no Brasil, o desembarque ocorreu depois de constatada
a necessidade de braços fortes e hábeis para o trabalho, já que o índio,
natural da terra, apesar da forte complexão física demonstrava desinteresse
pelo cultivo da terra. Foi escolhido, então, para o trabalho braçal, os
negros africanos e graças ao seu ingresso no País, houve miscigenação
de raças, surgimento de novas culturas e a raça brasileira se aprimorou
em todos os sentidos, principalmente no embelezamento físico.
Mesmo sabendo da sua importância e da sua contribuição para o desenvolvimento
de uma nação, o Homem Negro sentia saudade da sua terra, da sua identidade,
cultura e tradições próprias. E sonhava com o direito de poder dispor
de seu próprio destino.
Deflagrada a luta, muitos anos depois. viu o sonho tornar-se realidade,
e hoje, a CAPRICHOSOS canta, conta, dança e se confraterniza com os negros
da sua comunidade, seus cúmplices, seus parceiros e amigos, no desfile
do Carnaval/98.
Até abrandar o espírito e se resignar com a nova situação, o negro trabalhava
em silêncio e só se manifestava para orar pedindo pela liberdade. Com
o passar do tempo, já impaciente, inicia uma luta contra o sistema e penetra
pelas florestas, procurando ficar distante do causador da sua tristeza.
A cada dia aumentava o número de fugitivos, tomando necessário o estabelecimento
de regras para sobrevivência do grupo, que deveria continuar sob a direção
de um autêntico líder, de nome Zumbi, e que mais tarde ficou conhecido
como ZUMBI DOS PALMARES, protetor de todo homem livre ou não mesmo que
não fosse da sua cor. Tornou-se símbolo de uma luta não reconhecida, mas
que ainda hoje persiste.
Grupos intelectuais do País e do exterior, exerceram forte pressão e o
Império Brasileiro, em fins do Século 19, aboliu definitivamente o trabalho
forçado no País.
Apesar de ter sido um passo de razoável tamanho, não foi suficiente para
satisfazer toda a necessidade do Homem Negro, introduzido no Brasil, ou
mesmo de seus descendentes.
Atualmente, não somente no Brasil como no resto do mundo a luta da raça
negra continua, para a conquista de oportunidades em igualdade de condições.
As portas foram abertas mas não o suficiente e o negro tem consciência
dessa realidade. Não basta ser livre para andar de um lado para outro
sem destino a lugar nenhum. É preciso saber a direção que deve tomar.
O Homem da RAÇA NEGRA, por natureza, é forte espiritualmente e vem reduzindo
à menor expressão toda sorte de humilhação que lhe é imposta, para manter
vivo o seu passado, tradições e cultura. Tudo isso, naturalmente, acaba
por refletir na cultura e costume dos países em que passou a viver. notadamente
do Continente Americano.
As músicas desses países. por exemplo, com a contribuição do negro tornaram-se
mais alegres e variadas, com o nascimento do jazz, blues e o samba. E
isso! O negro é da raça que sabe dançar, batucar, balançar, requebrar
e sambar como nenhum outro faz.
O negro também influenciou, no caso brasileiro, na formação do sentimento
religioso, iniciando a prática do Candomblé, Umbanda e Quimbanda, primeiramente
na Bahia, espalhando-se depois por todo o país. A pluralidade religiosa
do negro é bem vasta. Introduziu o VUDU no Haiti e o Islamismo nos Estados
Unidos da América.
Nas Igrejas Católicas e Protestantes, as duas principais correntes do
cristianismo, contam com a participação, sem exagero, de milhões de seguidores
negros, em perfeita convivência e harmonia com todos os demais da espécie.
Entre outras coisas, ligadas a modas e costumes, a vinda do negro para
o Brasil alterou os hábitos alimentares do nosso povo, com receitas culinárias
de apurado preparo e sabor. Pratos como a feijoada, caruru, moqueca, abará,
acarajé, para citar apenas alguns, passaram a fazer parte da alimentação
e graças a essas preciosidades, com certeza, o Brasil dispõe da mais variada
e requintada culinária, que atrai milhares de turistas para saborear esses
pratos na terra onde melhor são preparados - BAHIA DE TODOS OS SANTOS.
Mas o negro não contribuiu apenas para o desenvolvimento da culinária,
da música e da religião. O negro descobriu suas aptidões para a prática
dos esportes, tendo se destacado, principalmente, nas lutas marciais,
esportes de força e velocidade, futebol, basquete e no boxe, modalidades
em que são praticamente imbatíveis.
Entretanto, o negro ainda não está satisfeito nem realizado com tudo isso.
Sabe que pode e quer muito mais. E a medida que o negro ultrapassa um
obstáculo, todo o povo brasileiro é favorecido com a sua ascensão, porque
fazemos parte dessa NEGRITUDE.
Na área política, o negro tem demonstrado excepcional desempenho. No Brasil
o desaparecimento do líder Zumbi, mostrou que a luta, ao invés de terminar,
ali começava. Assim surgiu a CONSCIÊNCIA NEGRA. A morte do pastor MARTIN
LUTER KING desencadeou outro sistema de luta, mais aberta, descoberta,
declarada, e até hoje continua sem a menor trégua. Mas essa luta é no
campo das idéias, onde os vencidos são tratados com humanidade, acentuando-se
com o exemplo dado por NELSON MANDELA, para tirar a revolta do peito do
negro e no seu lugar introduzir orgulho sem prepotência, a vaidade sem
soberba e a consciência sem arrogância que verdadeiramente a RAÇA NEGRA
é linda, sincera e amiga. E tudo isso foi ensinado por um líder com mais
de 27 anos de paciente resistência, pregador da igualdade e da fraternidade
inter-racial. Esse posicionamento conquistou os maiores intelectuais da
sua época e as manifestações favoráveis tornou-o Presidente de uma grande
nação democrática - ÁFRICA DO SUL.
Em todo o mundo existem negros de passado e comportamento invejável. Um
exemplo disso pode ser visto aqui no Brasil.
Há mais de 40 anos surgiu para o mundo um rapaz predestinado a conquistar
popularidade, encantando com a arte de jogar futebol. Continuando discretamente
a sua profissão transformouse no maior talento do esporte, chegando a
ser chamado o REI DO FUTEBOL, e soube conservar a sua coroa, com nobreza,
seriedade e modéstia.
De REI DO FUTEBOL para ATLETA DO SÉCULO Só precisou dar “dois passes”.
Para a realização final foi questão de tempo, e logo acrescentou ao seu
inigualável curriculum o cargo de Ministro, que não pertence a ele, mas
a toda a RAÇA NEGRA. a todos os esportistas.
PELÉ. não se realizou apenas como futebolista e político. E também polivalente
e eclético: Canta, toca, compõe e representa. Portanto, joga em várias
posições, e neste Carnaval também será uma das personalidades do nosso
enredo.
O Brasil também pode se orgulhar de incluir nesta seleta relação de personalidades
e lideranças políticas, uma mulher negra, de origem e família humilde:
BENEDITA DA SILVA.
A grande líder, movida pelo efeito de uma frase que ouviu na juventude,
dita por sua mãe - “NEGRO NÃO SE RENDE, NEM SE VENDE. NEGRO TEM QUE TER
BRIO” - e fez dela um exemplo de vida, foi à luta, transpondo todas as
barreiras que encontrou pela frente. Passou por todas e venceu, mostrando
também que todos podem vencer.
O fundamental é que saibam pisar sem prepotência e que nunca se envaideçam
de “Ter”, mas de “Ser”.
É uma filosofia de vida. Um caminho a ser seguido.
E a CAPRICHOSOS vai por aí, mostrando BENÉ símbolo da Mulher Negra Brasileira.